O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, já apelidou de “momento da verdade” sobre o Brexit a reunião do organismo a que preside, quarta e quinta-feira na cidade de Bruxelas.
Durante o jantar agendado para a noite de quarta-feira, os líderes dos 27 países da União Europeia vão sentar-se com uma ementa difícil no seu colo, apesar de terem ouvido Michel Barnier, o principal negociador da UE dizer várias vezes que a parte substancial do acordo para a saída do Reino Unido já está fechada.
Nenhum desses chefes de Governo e de Estado acredita que seja possível colocar facilmente uma assinatura num documento sobre o Brexit, um dos temas que dominarão o Conselho Europeu de quarta e quinta-feira, a par das igualmente difíceis questões das migrações, da segurança interna e da reforma da zona euro.
O objetivo de Donald Tusk é conseguir que os líderes europeus se conciliem sobre um documento com uma versão tão próxima da final que possa ser levado em breve a uma cimeira extraordinária do Conselho Europeu, apontado para 17 e 18 de novembro.
O problema maior, neste momento, nas negociações do Brexit e a questão que dominará grande parte da discussão do jantar de quarta é o que se relaciona com a ilha da Irlanda.
Numa primeira análise, o problema até parece não existir: quer o Reino Unido, quer a União Europeia defendem que não exista uma fronteira “dura” entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte (parte integrante do Reino Unido).
Mas as divergências surgem logo a seguir e, até agora, ainda não foram ultrapassadas: a União Europeia pretende que o ‘backstop’ (uma espécie de rede de segurança, que permite a manutenção das atuais condições de relacionamento dentro da UE) se confine à Irlanda do Norte, enquanto o governo britânico considera que abrir exceções para a Irlanda do Norte deixando o resto do Reino Unido de fora dessas condições é colocar em causa a consistência do próprio Reino Unido.
Com Theresa May presente no jantar de quarta-feira, os líderes europeus poderão esclarecer melhor a alternativa do Reino Unido para esta dificuldade, mas a primeiro-ministro britânica vai sentar-se à mesa com limitações de negociação política, já que no Parlamento inglês há severas divergências sobre o tema do ‘backstop’, que a têm impedido de pormenorizar o seu plano de forma inequívoca.
Nesta segunda-feira, Tusk advertiu que o cenário de uma ausência de acordo para a concretização da saída do Reino Unido da União Europeia é “mais provável do que nunca”.
Na carta-convite dirigida aos chefes de Estado e de Governo da UE para o Conselho Europeu que decorrerá em Bruxelas, Tusk sublinha todavia que o facto de a UE se dever preparar de forma responsável para o cenário de um “não acordo” não significa que não devam ser feitos “todos os esforços” para alcançar o melhor acordo possível para todas as partes envolvidas.
Mais dificuldades para o Governo britânico
Para a editora de Política da BBC, Laura Kuenssberg, esta questão traz mais dificuldades ao governo britânico do que ao Conselho Europeu, tendo em conta as inúmeras tensões com que Theresa May se defronta semanalmente, mesmo dentro do seu gabinete.
Para Eugénia da Conceição, professora catedrática de Relações Internacionais na Universidade de Dresden e autora do livro “O futuro da União Europeia”, as dificuldades nas negociações deste “divórcio” radicam no facto de o Brexit ser, desde logo, o resultado de “um processo de crescente euroceticismo”, que não tem sido resolvido pelos líderes europeus, que continuam a falar a várias vozes, esquecendo as reais preocupações dos cidadãos.
Para esta estudiosa, todo este processo é ainda mais difícil porque, relativamente ao projeto europeu, se está “perante a escolha entre três caminhos: supranacionalismo, ou seja a transferência de mais poderes para o nível europeu; intergovernamentalismo que corresponde a uma maior preponderância de decisões tomadas pelos Estados-membros; e diferenciação integrada, com uma geometria variável em que os Estados-membros avançam a velocidades diferentes”.
“Só existe uma certeza, as tendências centrífugas dentro da UE estão para ficar e os partidos populistas reagiram euforicamente à vitória do Brexit e já se fazem mesmo ouvir pedidos para novos referendos”, explica Eugénia da Conceição.
A preocupação com a tendência populista estará igualmente em pano de fundo quando, na quinta-feira, no Conselho Europeu, se debaterem dois outros temas “quentes”: as migrações e as questões de segurança interna.
Nestas matérias, Donald irá insistir na ideia que já defendeu na reunião informal de Salzburgo: “Precisamos de encontrar soluções reais para os problemas reais dos cidadãos, que estão preocupados com a segurança, a migração ou o desemprego”.
O tema dos incêndios na Europa e a existência de mecanismos de apoio e solidariedade nesta área será um dos tópicos na agenda, com o natural interesse do Governo português sobre esta matéria.
Nas últimas horas do Conselho, os líderes europeus discutirão o aprofundamento da União Económica e Monetária, tendo em vista uma cimeira da zona Euro em dezembro.
ZAP // Lusa