A mulher acusada de ter sido autora de uma queimada cujo reacendimento terá contribuído para os incêndios de outubro de 2017 no Pinhal de Leiria garantiu esta quinta-feira ao Tribunal de Alcobaça que estava a dormir quando o fogo deflagrou.
A suspeita – que faz 69 anos no dia 25 de dezembro – do crime de incêndio florestal começou hoje a ser julgada no Tribunal de Alcobaça, onde garantiu que não realizou qualquer queimada.
“Estava a dormir, quando a vizinha foi bater à janela do meu quarto a dizer para me levantar, porque o fogo já estava a chegar ao meu quintal. Como não consigo fazer força, sentei-me uns minutos na cama e liguei ao meu filho, que é bombeiro, e disse-lhe para vir depressa”, contou ao tribunal.
A mulher adiantou ainda que depois se vestiu e foi espreitar o que se passava. “O meu filho quando chegou mandou-me para dentro, porque tenho uma doença oncológica”, acrescentou, garantindo que quando a vizinha a alertou eram 6h25. “Olhei para o relógio porque estranhei estarem a bater-me à janela a esta hora”, justificou. O advogado da suspeita sugeriu ainda ao tribunal que se deslocasse ao terreno.
O inspetor da Polícia Judiciária que realizou a inspeção ao local do incêndio explicou que realizou o exame de “determinação do ponto de início e progressão do fogo” e que o mesmo deflagrou junto a um muro que circundava a propriedade da arguida.
“Como a propriedade era totalmente vedada, ficou a hipótese de ter sido uma queima que teria sido feita acedendo pelo lado do terreno da arguida. Se alguém quisesse atear fogo, fazia-lo junto à borda da estrada e não se metia pelas silvas onde se iria arranhar bastante”, informou ainda o inspetor.
Leonor, a vizinha que foi alertar a arguida, referiu que a chamou e “como ela não se levantou” de imediato bateu a ”uma janela e depois a outra”. “Demorou algum tempo a responder”, revelou, ao ser confrontada depois com as declarações prestadas em primeiro inquérito na PJ, a quem disse que a arguida era “alcoólica”.
“Nunca a vi cair, nem tive de a levantar do chão, mas algumas vezes cheirava a álcool e dizia coisas que não batiam bem”, precisou, acrescentando que a arguida reclamou – tal como ela própria – do “silveiral que estava no local”.
A mulher é a única arguida identificada no processo que averigua este incêndio e um outro reacendimento de um alegado fogo posto, que também terá contribuído para o deflagrar das chamas que consumiram 86% da Mata Nacional de Leiria, embora tenha sido impossível para a PJ descobrir qual o autor ou autores deste último acontecimento.
O incêndio na Mata Nacional de Leiria, no dia 15 de outubro de 2017, resultou de dois reacendimentos de um incêndio após uma queimada e outro de um possível fogo posto, refere o despacho de acusação, a que a agência Lusa teve acesso.
Segundo o Ministério Público (MP), das diligências realizadas pela Polícia Judiciária, ficou demonstrado que “a área ardida tem origem em dois reacendimentos“, nomeadamente na praia da Légua, concelho de Alcobaça, distrito de Leiria, que deflagrou pelas 17:49 do dia 12 de outubro, e na Burinhosa, no mesmo concelho, fogo que deflagrou pelas 06:54 do dia 15 de outubro.
“Estes dois reacendimentos começaram ao início da tarde do dia 15 de outubro, com afastamento temporal de 42 minutos e uma distância de cerca de 10 quilómetros”, refere o documento do MP.
O fogo da praia da Légua começou pelas 13h51 e o da Burinhosa a partir das 14h33, os quais “posteriormente perfizeram uma única área ardida”, tendo o fogo progredido até à Leirosa, na Figueira da Foz, distrito de Coimbra, e sido considerado extinto às 16h25 do dia 20 de outubro. A conclusão da investigação judiciária “não estabelece qualquer relação de autoria entre os dois incêndios iniciais“.
No fogo da praia da Légua é atribuída uma “causa dolosa, atendendo ao artefacto encontrado”. No entanto, “não houve qualquer elemento” que permitisse à PJ identificar o autor dos factos, pelo que o MP arquivou os autos.
Já relativamente ao incêndio na Burinhosa, a sua origem é uma queimada, iniciada pelas 6h54 num terreno baldio. No entanto, a própria acusação realça que “não pode o reacendimento ser juridicamente imputado à ação inicial da arguida”.
// Lusa