As suas raízes estão plantadas há meio século na Colômbia e o cenário não é animador perante a nova política de ataque aos “Escobares” e leviandade nas colheitas. Receitas da cocaína saltaram para 18,2 mil milhões de dólares.
Vai acontecer ainda este ano: a cocaína prepara-se para ultrapassar o petróleo e para se tornar o maior produto de exportação da Colômbia, segundo nova análise da Bloomberg.
“Estimamos que as receitas de exportação de cocaína saltaram para 18,2 mil milhões de dólares em 2022 — não muito longe das exportações de 19,1 mil milhões de dólares do ano passado”, lê-se no relatório publicado pelo Departamento de Drogas e Crime da ONU, na passada quinta-feira.
Segundo a empresa de tecnologia do mercado financeiro, o país quase duplicou as 970 toneladas exportadas no ano de 2022; ao mesmo tempo, as exportações de petróleo caíram 30% na primeira metade do ano corrente.
“O governo está a destruir laboratórios onde as folhas de coca são usadas para produzir cocaína, mas isso não travou a expansão da produção”, lê-se.
As operações de produção de cocaína aumentaram drasticamente, consequência da introdução de políticas mais brandas na regulação da produção do narcótico, alerta a análise.
Atacar os “Escobares” e deixar os produtores em paz: a última esperança da Colômbia
Abrindo espaço para diálogo com os exportadores da droga, o presidente do país, Gustavo Petro, mudou recentemente de rumo no combate à enraizada produção do pó branco ao indicar às autoridades anti-droga para perseguirem os grandes traficantes internacionais do país, em vez de os atingir onde dói mais — nas zonas de produção da folha de coca.
Ajudar as comunidades a substituir as plantações ilegais por alternativas legais é, em grande parte, o plano de Petro, que já tinha orquestrado um acordo de paz semelhante (e bastante ineficaz) que ainda se mantém de pé para a mesma substituição de colheitas ilegais, em 2016.
Desmantelar laboratórios, identificar estratégias na cadeia de tráfico e combater a lavagem de dinheiro é a tática da equipa comandada pelo ex-integrante da extinta guerrilha M-19, num esforço que obriga a Colômbia a fortalecer as suas operações com outros países como fez no passado.
As consequências desta leviandade perante as colheitas já se notam. Os terrenos dedicados ao cultivo (ilegal) da planta de coca na Colômbia aumentaram a sua área em 13%, segundo o relatório. São 230 mil hectares dedicados ao tráfico a gerar 1738 toneladas de cocaína por ano que acaba, em boa parte, na Europa.
Raízes da coca plantadas há mais de meio século
Nos últimos anos, o governo colombiano, com apoio internacional, intensificou os seus esforços para combater o narcotráfico, com algumas vitórias significativas, mas a procura global da cocaína ainda persiste, mantendo relevante a sua produção.
Os níveis de pobreza no país obrigam muitos agricultores a cultivar a planta de coca devido à falta de alternativas económicas viáveis. Apesar de lucrarem com a venda das folhas, são explorados e os seus ganhos muito pequenos em comparação com outros intervenientes na cadeia.
O problema enraizado envolve política, economia e conflitos armados desde os anos 70 e 80, décadas em que a Colômbia ganhou destaque no cenário internacional como o epicentro da produção de cocaína.
Nessa altura, os valores de exportação de cocaína colombiana atingiram, em 1976, o primeiros mil milhões de dólares norte-americanos anuais. Chegariam em meados dos anos 80 aos 3,5 mil milhões e atingiriam o pico de 4,5 mil milhões entre 1987 e 1989, de acordo com estudo publicado no Scielo.
Cartéis como o de Medellín e o de Cali tornaram-se conhecidos pela sua brutalidade e capacidade de influenciar políticas estatais. Sob a liderança do infame Pablo Escobar — que se tornaria no símbolo do tráfico da cocaína — o cartel de Medellín chegou a controlar 80% da cocaína mundial, desafiando abertamente o Governo num compêndio de conflitos violentos.
O lucro gerado pela cocaína incentivou não só os cartéis, mas também grupos guerrilheiros, como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), a entrar no negócio do narcotráfico como meio de financiar as suas atividades — uma “traição” que trouxe mais uma camada de complexidade ao conflito colombiano.