Cinco anos depois, o que aconteceu nos países que não confinaram durante a pandemia?

Fredrik Sandberg; TT / EPA

Suécia durante a pandemia

Com exemplos mais e menos bem sucedidos, há várias lições a tirar dos países que remaram contra a maré e não impuseram restrições.

Em março de 2020, um novo vírus, a Covid-19, varreu o mundo, levando à imposição de medidas drásticas em países ao redor do globo. O confinamento tornou-se a resposta emergencial para conter a disseminação da doença, alterando radicalmente a vida de bilhões de pessoas.

As ruas vazias e a imposição de restrições severas, como a proibição de circulação sem motivos essenciais, tornaram-se o quotidiano. No entanto, enquanto a maioria dos países optou por confinamentos rigorosos, outros, como Suécia, Taiwan e Uruguai, tomaram abordagens alternativas, sem a imposição de restrições rígidas. Cinco anos depois, que balanço se pode fazer desta estratégia ousada?

Suécia sem excesso de mortalidade

Na Suécia, a estratégia adotada foi de não impor um confinamento nacional. O governo confiou no comportamento voluntário da população, com medidas como restrições em grandes aglomerações e a recomendação de distanciamento social.

Enquanto isso, países vizinhos como a Noruega e Dinamarca fecharam escolas e impuseram medidas rigorosas. Estudos comparativos sobre a mortalidade excessiva entre os países nórdicos, como o realizado por Ingeborg Forthun, indicaram que, embora a Suécia tenha registado picos de mortes no início da pandemia, a mortalidade em excesso foi comparável a de países que confinaram, como a Noruega, Finlândia e Dinamarca, em 2021 e 2022. A falta de um confinamento na Suécia também foi associada a custos económicos relativamente baixos

“Os quatro países têm um número comparável de mortes em excesso quando se leva em consideração o facto de que o tamanho da população é diferente“, observa Forthun.

Apesar das críticas iniciais à abordagem sueca, com acusações de negligência, principalmente no que diz respeito às mortes em lares, alguns estudos sugerem que as estratégias sem confinamento, como o distanciamento social voluntário, conseguiram efeitos semelhantes aos dos confinamento.

Até 188 mil mortos na Tanzânia

Sob a liderança do presidente John Magufuli, que descartou medidas científicas, rejeitou as vacinas e promoveu alternativas como o uso de ervas tradicionais, o país sofreu com um número significativo de mortes não registadas oficialmente.

Os dados oficiais sugerem que cerca de 840 pessoas morreram de covid-19 na Tanzânia desde o início da pandemia. Mas Fadhili Mtani, professor de história da Universidade Muçulmana de Morogoro, afirma que o governo não disponibilizou estatísticas precisas. Uma colaboração internacional destinada a estimar o número global de mortes em excesso durante os dois primeiros anos da pandemia, estimou o número total de mortes na Tanzânia em algo entre 102 mil e 188 mil.

Mtani argumenta que a Tanzânia deveria ter decretado um confinamento, embora sem impor restrições excessivas à circulação dos trabalhadores. “A maioria das pessoas é pobre. Negar-lhes a circulação é negar a sua existência”, explica Mtani.

Nova Zelândia vs Islândia

Há comparações surpreendentes a serem feitas. Vejamos o caso da Islândia e da Nova Zelândia, por exemplo.

Ambas são nações insulares ricas com populações relativamente pequenas, mas enquanto a Nova Zelândia introduziu um confinamento rigoroso a 25 de março de 2020, a Islândia nunca impôs a medida.

“Eles [a Islândia] tinham mais a estratégia de mitigação”, diz Leah Grout, analista de dados de pesquisa especializada em saúde pública da Universidade de Ciências da Saúde do Sul da Califórnia, nos EUA.

Grout foi a principal autora de um artigo de pesquisa sobre as estratégias e os resultados contrastantes da covid-19 nestes dois países.

A Islândia introduziu um programa de teste e rastreamento, em que as infeções e os contatos entre as pessoas eram monitorizados para que os indivíduos — e não populações inteiras — fossem solicitados a cumprir quarentena por um tempo.

Esta medida também foi usada em muitos países que aplicaram confinamentos, quando estes foram suspensos. A Islândia tinha algumas restrições relacionadas a reuniões sociais, e fechou as suas fronteiras para alguns viajantes, por um breve período.

“A Nova Zelândia teve uma das taxas de mortalidade mais baixas do mundo com a sua abordagem”, afirma Grout. “A Islândia também se saiu muito bem.” Além disso, os impactos económicos em ambos os países foram limitados, acrescenta.

Japoneses confinaram sem serem obrigados

Da mesma forma, o Japão conseguiu manter a mortalidade por covid-19 num nível relativamente baixo no início da pandemia.

No verão de 2022, tinham sido registados 36 200 óbitos em decorrência da doença no país. Hoje, este número chega a 130 mil. Mas o que aconteceu nesste intervalo? A variante ômicron.

Embora não tenha adotado um confinamento obrigatório, estudos indicam que a população japonesa mudou os seus comportamentos de forma voluntária, reduzindo significativamente a circulação.

Alguns investigadores argumentam que a abordagem do Japão provou ser a correta no geral.

“Mesmo sem o confinamento, a supressão das curvas epidémicas foi amplamente bem-sucedida”, afirma Hiroshi Nishiura, professor da Escola de Pós-Graduação em Medicina da Universidade de Kyoto, no Japão.

O modelo não-tão-sustentável do Uruguai

O Uruguai foi elogiado na época por aparentemente conseguir manter a covid-19 sob controle, apesar de nunca ter decretado um confinamento rigoroso.

O governo aplicou algumas formas de distanciamento social, incluindo o fechamento de alguns ginásios, e as fronteiras do país também foram fechadas para determinados viajantes, por exemplo.

Mas os portos permaneceram abertos, e não houve nenhuma ordem para permanecer em casa que afetasse toda a população.

No entanto, estudos apontaram que, após um início promissor, o país enfrentou um aumento significativo nas mortes por covid-19 em 2021 e 2022, devido à disseminação do vírus, sugerindo que a estratégia inicial não foi suficiente para manter o controlo a longo prazo.

Controlo apertado aos contactos em Taiwan

Taiwan, por exemplo, também nunca impôs um confinamento e, em vez disso, confiou no uso quase universal de máscaras, restrições nas fronteiras e rastreamento intensivo de contatos, o que envolveu o acesso a muitos dados pessoais. Isso incluía informações de cartões inteligentes de transporte e dados de localização de telemóveis. Parte desta monitorização foi exaustiva.

“[Os Centros de Controlo de Doenças de Taiwan] também criaram um sistema de localização em tempo real baseado no smartphone para rastrear os sinais de telefone dos contatos, e alertar as autoridades locais se alguém saísse do local designado ou desligasse o telefone. As autoridades entrariam em contacto ou visitariam pessoalmente as pessoas que acionassem um alerta, dentro de 15 minutos”, observa um artigo.

No entanto, mesmo em Taiwan, os surtos de covid-19 causaram problemas. Inicialmente, no primeiro semestre de 2021, e depois novamente em 2022, os casos aumentaram à medida que algumas medidas preventivas no país, e a própria população, começaram a relaxar.

As mortes por covid-19 desceram com o passar do tempo, conforme as autoridades de saúde de Taiwan distribuíam vacinas para a população.

As lições para o futuro

Embora estes estudos de caso de vários países mostrem que foi claramente possível enfrentar a pandemia de covid-19 sem recorrer a confinamentos, os resultados finais parecem depender dos atributos de países específicos, das suas populações e dos seus sistemas de saúde.

Além dos impactos imediatos na saúde, a pandemia também deixou legados importantes em áreas como educação e economia. O fechamento de escolas afetou negativamente a aprendizagem milhões de crianças ao redor do mundo, com um declínio nas pontuações de matemática e outros indicadores de desempenho. Na economia, muitos países enfrentaram recessões profundas, com o impacto a ser mais severo em países com sistemas de saúde menos resilientes.

O aumento da violência doméstica durante os confinamentos foi uma outra consequência social dolorosa. Há ainda inúmeros relatos de como a pandemia teve um impacto a longo prazo na nossa saúde mental e capacidade de socializar.

Na economia, muitos países enfrentaram recessões profundas, com o impacto a ser mais severo em países com sistemas de saúde menos resilientes.

Especialistas sugerem que, no futuro, os governos devem ter planos claros e comunicados com antecedência, para garantir que, caso novas pandemias ocorram, as respostas sejam mais coordenadas e compreendidas pelo público

ZAP // BBC

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