Ex-CEO da TAP arrisca multa máxima de 18 mil euros (mas pode vir a receber 1,5 milhões)

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José Sena Goulão/Lusa

Christine Ourmières-Widener, CEO da TAP

Os gestores demitidos podem ter de pagar multas de até 18 mil euros num processo no Tribunal de Contas, mas podem ter de receber uma compensação caso contestem legalmente o despedimento e saiam vencedores.

As dúvidas em torno da resposta dos administradores da TAP e dos responsáveis no Governo à polémica com a indemnização de 500 mil euros paga a Alexandra Reis não param de surgir.

O Governo decidiu demitir a CEO e o chairman da transportadora aérea na segunda-feira, alegando que houve várias ilegalidades na determinação do pagamento da compensação à ex-administradora.

Fernando Medina garantiu desde logo que não seriam pagas indemnizações no âmbito do término dos contratos e o relatório da Inspecção-Geral das Finanças (IGF) prevê até a cobrança de multas por parte do Tribunal de Contas que podem chegar aos 18 000 euros.

De acordo com o Público, o relatório admite que, para além do reembolso de 450 mil euros por parte de Alexandra Reis, podem ainda ser aplicadas coimas sancionatórias a Christine Ourmières-Widener e Manuel Beja pelas violações de normais referentes ao pagamento de despesas públicas.

Regra geral, as multas podem oscilar entre os 2550 e os 18 360 euros, mas se os gestores decidirem pagar antes da entrada do requerimento que inicia o julgamento no Tribunal de Contas, o valor cobrado será o mínimo.

Se a infracção for cometida com dolo, o limite mínimo da multa passa para um terço da multa máxima (6120 euros em vez de 2550 euros). Caso fique provado que a infracção foi cometida por negligência, o limite máximo da multa é cortado para metade, ficando-se pelos 9180 euros.

Há direito a bónus?

Na reacção à demissão, a ex-CEO acusou a Inspeção-Geral de Finanças (IGF) de “comportamento discriminatório” por não a ter ouvido durante a auditoria ao processo e ameaçou retirar “consequências legais”.

Christine Ourmières-Widener disparou ainda contra o escritório de advogados SRS Legal, que mediou o processo do pagmento da indemnização. A gestora frisa que “não é jurista de formação” e que nunca interveio “sobre a forma do acordo”, tendo deixado essa responsabilidade nas mãos deste escritório de “renome”.

Desta forma, a gestora viu “com perplexidade” as dúvidas levantadas sobre o acordo, garantindo que nunca foi avisada para “qualquer específico risco”. Na sua resposta à IGF, Alexandra Reis e Manuel Beja também tecem críticas semelhantes aos advogados que assessoraram o acordo.

Estes argumentos podem levar a que Christine Ourmières-Widener conteste o despedimento por justa causa em tribunal. O jurista Pedro da Quitéria Faria antecipa que, neste cenário, o Governo invoque “a violação grave por acção ou omissão da lei ou dos estatutos da empresa”, uma das cláusulas do EGP que prevê demissão de gestor público.

Mas caso a ex-CEO saia por cima e a demissão por justa causa não seja sustentada em tribunal, pode vir a receber mais de 1,5 milhões de euros, o valor equivalente a três anos até ao fim do mandato, relata o DN.

Na sua audição no parlamento, Christine Ourmières-Widener também revelou que estava previsto receber um bónus caso cumprisse as metas da companhia aérea em 2025. No entanto, Pedro da Quitéria Faria vê com “dificuldade” que a ex-CEO tenha agora direito ao bónus.

“Não tendo cumprido o mandato também não acredito que tenha cumprido os objectivos para ter direito ao bónus. Os prémios de desempenho estão normalmente condicionados ao cumprimento adequado dos objetivos e do mandato e isso não se passa aqui”, explica o jurista.

Pedro Nuno não avaliou legalidade do pagamento

Numa altura em que se fala de responsabilidades políticas no caso, nem o ex-Ministro nem o ex-Secretário de Estado das Infraestruturas avaliaram a legalidade do acordo assinado entre a TAP e Alexandra Reis.

O relatório da auditoria da IGF refere que a chefe de gabinete de Pedro Nuno Santos esteve presente numa videoconferência onde a proposta de acordo foi discutida. No dia seguinte, chegaram emails a confirmar a sua formalização ao Ministério das Infraestruturas, relata o Observador.

Recorde-se que, inicialmente, Pedro Nuno Santos negou ter tido conhecimento do pagamento da indemnização a Alexandra Reis, mas mais tarde, já depois de se ter demitido, admitiu que foi informado e autorizou a transação através de uma mensagem no WhatsApp.

Há agora também evidências de trocas de emails entre a CEO da TAP e Hugo Mendes, ex-Secretário de Estado das Infraestruturas, e Maria Antónia Araújo, que era a chefe de gabinete de Pedro Nuno Santos. Isto vem contrariar o gabinete do actual Ministro, João Galamba, que indicou à IGF que não tinha arquivos relativos à saída de Alexandra Reis da TAP.

O Ministério das Infraestruturas responde dizendo que o relatório não tem provas do “conhecimento destes sobre o teor, em concreto, do clausulado do Acordo que viria ser outorgado” e frisa que “quer na reunião, quer no e-mail apenas foram tratadas informações relativas aos montantes que estavam em consideração para consolidar a quantia indemnizatória final”.

No relatório, o ex-Ministro assume ainda que o Ministério das Infraestruturas não fez uma avaliação legal do acordo porque esta não lhe cabia, mas sim à própria TAP.  “Não fui elucidado sobre os contornos, fundamentos legais ou fórmula de valor de cálculo da compensação atribuída”, afirma, garantindo que nunca sequer ponderou “a hipótese de não respeitar a lei, avaliação essa que não me cabia a mim fazer, mas antes à TAP e à eng. Alexandra Reis”.

O Ministério das Finanças também ficou às escuras em todo o processo, o que, de acordo com o relatório da auditoria, foi uma falha grave, já que é a este Ministério que cabe o exercício da tutela do acionista do Estado nas empresas públicas.

Pedro Nuno Santos admite ainda que não informou o Ministério que na altura era chefiado por João Leão e atira a responsabilidade para a TAP. “Quando há matérias que exigem a autorização da tutela financeira e da tutela setorial, a prática é a empresa enviar os respetivos pedidos para as duas tutelas”, refere.

Já Christine Ourmières-Widener atira as culpas de volta para o Governo, frisando que a “TAP presumiu a existência de articulação entre os membros do Governo competentes no exercício da função acionista, tendo em conta as obrigações de articulação legalmente previstas”.

Adriana Peixoto, ZAP //

3 Comments

  1. Se houve várias ilegalidades na determinação do pagamento da compensação à ex-administradora, porque o Secretário de Estado e Ministro das Infra-Estruturas e Ministro das Finanças, de então, não são referidos e penalizados pela Inspeção Geral de Finanças? Ai já sei: o mexilhão é que paga.

  2. Então o Medina despede a única gestora que pôs a TAP a dar lucro?, tinha que arranjar um “bode espiatório” ou então ia ele de vela, cheira-me que este despedimento sem justa causa vai-nos custar muitos milhares.

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