“O mundo não estava preparado” para José Pinhal no seu tempo, mas, agora, o cantor romântico popular que nos anos de 1980 actuava em arraiais, é uma figura de culto e até é notícia em Inglaterra.
O jornal The Guardian destaca “o ícone português kitsch-pop” José Pinhal como uma “figura de culto” de um novo movimento que se aproxima da cultura tradicional portuguesa.
José Pinhal é desconhecido da grande maioria dos portugueses. Mas, durante os anos de 1980, tocava nos maiores clubes nocturnos do Porto, além de actuar em arraiais e festas populares pelo norte de Portugal.
Não fez muito sucesso para lá desses palcos. E, em 1993, morreu num acidente de viação quando tinha apenas 41 anos, deixando para a história três álbuns que ficaram esquecidos durante muito tempo.
O culto em torno do cantor começou já vários anos depois da sua morte quando o coleccionador de música popular portuguesa Paulo Cunha Martins descobriu músicas de José Pinhal na casa do seu antigo agente, como relata o The Guardian.
Com a publicação no YouTube, a música de José Pinhal começou a movimentar um verdadeiro culto de fãs que se juntaram para pedir o relançamento dos seus álbuns em formatos de maior qualidade. José Pinhal ainda é do tempo das cassetes!
Entretanto, foram nascendo memes e gags na Internet que amplificaram o “mito” de José Pinhal.
Em 2022, a editora Lusofonia Record Club (LRC) lançou algumas das músicas mais conhecidas de José Pinhal em formato vinil e logo esgotou. Foi já lançada uma reedição especial após terem surgido “mais de 300 pedidos” nesse sentido, como explica a LRC na sua loja online.
Neste ano, vai ser lançado um novo volume em vinil da música do cantor.
Pelo meio de todo este frenesim, nasceu a banda de tributo José Pinhal Post-Mortem Experience que tem ajudado a alimentar o culto, com a presença em diversos festivais, onde têm cantado em cima de um camião como era habitual nas festas populares onde o cantor actuava.
No Verão passado, algumas das músicas mais populares de José Pinhal ouviam-se no Festival de Paredes de Coura, entre as quais “Tu És a Que Eu Quero (Tu Não Prendas o Cabelo)”, “Magia (Bola de Cristal Mentia)” e “Porém Não Posso”.
Do seu repertório, constam músicas adaptadas de canções brasileiras e espanholas.
Em 2020, foi também lançado um documentário sobre a vida de José Pinhal (“A Vida Dura Muito Pouco”) do realizador Dinis Leal Machado.
Como explicar este culto de José Pinhal?
A “redescoberta” de José Pinhal coincide com “uma reclamação da cultura tradicional por músicos portugueses, tais como David Bruno, Sónia Trópicos, Ana Moura, Chico da Tina, Sreya, Conan Osíris e Pedro Mafama”, salienta o The Guardian, realçando que esta nova geração de músicos “combina estilos contemporâneos e tradicionais”.
Trata-se, portanto, de “uma valorização da sinceridade de Pinhal que acompanha uma geração que abraça aspectos da cultura popular e pop portuguesa anteriormente descartados como pimba”, destaca ainda o jornal.
“Eu e outros artistas estamos a explorar a cultura local e a desenterrar certos cantos da música popular que foram esquecidos, talvez porque, no seu tempo, foram vistos como não válidos”, refere ao The Guardian o músico Pedro Mafama que tem participação no mais recente álbum de Ana Moura, “Casa Guilhermina”.
Este fervor em torno de José Pinhal contrasta com o “apagamento” que experimentou quando era vivo. “O mundo do tempo dele não estava preparado para ele”, analisa a produtora de música electrónica Sónia Trópicos, também em declarações ao The Guardian.
“Por causa da adesão de Portugal à União Europeia e do êxodo rural que se seguiu no início dos anos 90, muita população sentiu necessidade de abraçar uma modernização cosmopolita” e, nesse cenário, a música popular portuguesa “simplesmente não cabia”, aponta Sónia Trópicos.
Gente medíocre que de músicos nada têm, estão a servir-se do talento e da obra/legado de José Pinhal.
Grande José Pinhal, um diamante em bruto.