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BES teve um misterioso banco no Congo

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José Sena Goulão / Lusa

Na comissão parlamentar de inquérito ao Novo Banco, Rui Pinto disse ter informações que podem ser úteis sobre o Banque Espírito Santo Congo, que teve entre os seus primeiros acionistas Álvaro Sobrinho, Hélder Bataglia e o BES Angola.

O Banque Espírito Santo Congo (BESCO) foi criado em 2008 e começou por ser detido em 90% pelo BES Angola. Os restantes 10% estavam divididos em partes iguais entre Álvaro Sobrinho e Hélder Bataglia, que foram administradores até, pelo menos, 2018.

A ideia de criar aquela instituição terá partido de Bataglia, segundo um depoimento do seu ex-sócio Pedro Ferreira Neto no Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) no âmbito da Operação Marquês.

Mas, de acordo com o jornal Expresso, nem o então presidente do BES Angola (BESA) percebia porque é que o grupo era dono de um pequeno banco no Congo com uma só agência em Brazzaville.

Na assembleia geral que o BESA realizou a 3 de outubro de 2013, Rui Guerra, presidente executivo da instituição financeira angolana, quis saber do lado dos acionistas o que era afinal o Banque Espírito Santo Congo, que sobreviveria mais tarde ao colapso do BES e à transformação do BESA em Banco Económico.

A ata da assembleia geral de 2013 do BESA mostrou o caráter misterioso do BESCO mas não só. Rui Guerra, pode ler-se no documento, “pediu informações e apoio aos acionistas para poder entender o processo de constituição da participação que o BESA detém numa instituição de crédito do Congo-Brazaville, denominada BES Congo, sobre a qual também existem elementos escassos de informação na sociedade”.

O BESCO estava legalmente constituído junto das autoridades congolesas mas para o BES Angola operava na clandestinidade.

Nessa assembleia geral, Álvaro Sobrinho indicou que dois colaboradores do BESA, Álvaro Monteiro e Ilídio Santos, possuíam “todas as informações relevantes sobre o processo de criação desta sociedade participada”. Ilídio Santos era, pelo menos até 2017, um dos acionistas minoritários do BESCO.

Mas na reunião do BES Angola de outubro de 2013 estava também Ricardo Salgado. Segundo a ata, o banqueiro “manifestou as dúvidas sobre a oportunidade da constituição e manutenção desta sociedade [BESCO], bem como os entraves que num momento delicado da economia portuguesa o Banco de Portugal poderá colocar ao BES, em Portugal, para a manutenção de uma filial no Congo”.

Ao longo dos anos o BESCO sofreu várias alterações à sua composição acionista: em junho de 2012 o banco congolês aprovou numa assembleia geral em Lisboa o aumento do seu capital social, o que levaria o Estado congolês a adquirir 33,3% das ações; um outro aumento de capital levou o Estado a reforçar a sua posição para 50%, que se manteve até hoje, escreve o semanário.

Assim, as posições dos fundadores diluíram-se: o BESA recuou para 47%, Bataglia ficou com 1,5% e Ilídio Santos com outros 1,5%.

Hélder Bataglia disse, em resposta a questões enviadas pelo Expresso, através do seu advogado, Rui Patrício, que, segundo se lembra, a razão pela qual parte do capital ficou em mãos públicas congolesas é que “o Estado pretendia encontrar um comprador”.

Hélder Bataglia não é acionista do BESCO desde 2018 e “não exerce desde a mesma data funções de administração e as que tinha eram não executivas”, acrescentou o advogado.

Já Álvaro Sobrinho, que se manteve na administração do banco congolês pelo menos até 2017, deixou de ter participação no capital do BESCO, segundo o relatório anual de acompanhamento do sistema bancário publicado pelo Ministério das Finanças da República do Congo.

No final de 2011, a Holdimo – empresa de Álvaro Sobrinho que é acionista da Sporting SAD, com 29,8% – chegou a aprovar um projeto de compra de 32% do BESCO, mas tal operação não terá chegado a acontecer, dado que todos os relatórios de supervisão consultados pelo Expresso sempre apontaram o BESA como maior acionista da instituição financeira congolesa.

O BESCO não constava dos relatórios e contas do BES, dos relatórios e contas do Banco Económico, a instituição angolana que tomou o controlo do BESA em 2014, quando em Portugal o BES se transformou em Novo Banco.

O advogado Rui Patrício disse ainda que Hélder Bataglia “desconhece” o motivo pelo qual o BESCO era omitido nos relatórios e contas. “Deixou de ser administrador no BESA, por renúncia, em 2012, e não foi seu fundador”, nota.

O banco congolês será um dos temas sobre os quais Rui Pinto, uma das fontes do Luanda Leaks, dispõe de informação que poderá partilhar com a comissão parlamentar de inquérito (CPI) sobre o Novo Banco, caso a sua audição seja aprovada.

ZAP //

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