Arábia Saudita proibiu execuções de menores. Mas algumas sentenças permanecem

Cinco indivíduos que cometeram crimes na Arábia Saudita enquanto menores de idade ainda não tiveram as suas sentenças de morte revogadas, nove meses após a Comissão de Direitos Humanos (HRC) do reino ter anunciado o fim da pena capital para jovens infratores, informaram com dois grupos de Direitos Humanos.

Segundo noticiou esta segunda-feira o Independent, a HRC citou um decreto real de março, onde era estipulado que os indivíduos condenados à morte por crimes cometidos enquanto menores não seriam mais executados, cumprindo, ao invés disso, penas de prisão de até 10 anos em centros de detenção juvenil.

Embora o decreto não tenha sido divulgado na media estatal nem publicado no diário oficial, em resposta a um relatório da Human Rights Watch (HRW), em outubro, o reino informou que este tinha entrado em vigor imediatamente após o seu anúncio.

Em dezembro, a agência estatal de notícias SPA publicou uma lista de “eventos” significativos de 2020, no qual apontava vários decretos reais, mas este não era referido.

Organizações como a Reprieve, a HRW e a Organização Saudita-Europeia para os Direitos Humanos (ESOHR), bem como um grupo de legisladores dos Estados Unidos (EUA), levantaram preocupações sobre o facto de as lacunas na lei saudita ainda permitirem que os juízes imponham sentenças de morte a jovens.

Um dos cinco infratores apelou e outros oito enfrentam acusações que podem resultar em execução, disseram os grupos de Direitos Humanos.

O Centro de Comunicações Internacionais (CIC) do Governo indicou à Reuters que o decreto real seria aplicado retroativamente a todos os casos em que um indivíduo foi condenado à morte por crimes cometidos antes de ter 18 anos.

O país, cujo histórico sobre os Direitos Humanos ficou sob escrutínio global após o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi por agentes sauditas, em 2018, é um dos maiores carrascos do mundo, depois do Irão e da China, indicaram as organizações.

USDoD / Wikimedia

O príncipe saudita Mohammed bin Salman

Em outubro de 2020, seis legisladores norte-americanos escreveram para a embaixada saudita nos Estados Unidos (EUA), pedindo ao reino que revisse todos os casos de pena de morte em andamento para identificar indivíduos condenados por crimes cometidos quando eram menores de idades, segundo uma carta vista pela Reuters.

Um dos signatários, o deputado democrata Tom Malinowski, afirmou em dezembro à agência noticiosa que se o reino seguisse em frente com a execução de infratores juvenis, “tornaria ainda mais difícil para a Arábia Saudita retornar ao tipo de relacionamento que deseja com os EUA”.

O deputado acrescentou que o Presidente eleito Joe Biden analisará as políticas de Direitos Humanos do reino “de forma muito diferente de [Donald] Trump”, apoiante do príncipe herdeiro Mohammed bin Salman.

Em 2018, após assumir a liderança do país, o príncipe herdeiro prometeu minimizar o uso da pena de morte como parte de reformas sociais abrangentes. Mas, em 2019, um número recorde de 185 pessoas foram executadas, notaram os grupos de Direitos Humanos.

Um comunicado divulgado na segunda-feira pela HRC revelava que, em comparação com o ano anterior, a Arábia Saudita reduziu o número de execuções em 85% em 2020, tendo documentado 27 casos.

Num artigo publicado em abril de 2020, o jornal estatal Okaz confirmou a existência do decreto real, mas disse que a abolição da pena de morte se aplicava apenas a uma categoria de delitos conhecida por ‘ta’zeer’. Esses crimes não estão claramente definidos no Alcorão e, portanto, as punições são deixadas ao critério dos juízes.

A Arábia Saudita não tem um código penal civil que estabeleça regras de condenação, nem um sistema de precedentes judiciais que tornaria o resultado dos casos mais previsível, com base na prática anterior.

Os juízes ainda podem condenar jovens infratores à morte nas outras duas categorias, de acordo com a interpretação da Sharia da Arábia Saudita: “houdoud” – crimes graves, incluindo terrorismo – e “qisas” – homicídio, por exemplo.

Taísa Pagno //

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