O “apóstolo de Jesus”, predador sexual, foi condenado (mas pode sair em breve)

EPA/Francisco Guasco

Apoio ao “inocente” Naasón Joaquín García, no México

Naasón Joaquín García enfrentava 19 acusações em tribunal. Sentença foi pena de prisão de 16 anos e 8 meses. Mas os jornalistas ficaram a fazer contas…

Naasón Joaquín García diz que é um “apóstolo de Jesus Cristo”. Mas é um predador sexual, de acordo com as múltiplas acusações de que foi alvo.

Foram 19 a seguir para tribunal, num processo judicial que começou há três anos, em Junho de 2019.

Os últimos minutos do processo, e a referida sentença, foram ditas na última sessão, realizada na quarta-feira passada no Tribunal Superior da Califórnia, em Los Angeles, Estados Unidos da América.

Naasón é mexicano e líder da igreja La Luz del Mundo, igreja evangélica.

O grupo de cinco mulheres que realizaram as acusações ficou conhecido com o pseudónimo Jane Does. E depois foram aparecendo em tribunal com um número à frente.

A BBC relata que Jane Doe 5, abusada durante sete anos, contou que o abuso sexual “começou devagar” quando ela tinha 21 anos e era virgem: “Disseram-me que eu tinha sido escolhida por Naasón para uma bênção adicional”.

Começou por ter de utilizar lingerie junto ao pastor e, mais tarde, foi obrigada a deixar de ser virgem com ele. Uma “lavagem cerebral”, avisou.

Ao longo dos anos, a jovem foi uma escrava sexual de Naasón Joaquín García. Ou uma empregada pessoa, noutros momentos: “Diziam-me que limpar a casa-de-banho dele era uma bênção.”

Já no México, para onde foi enviada para se casar com um desconhecido, foi sequestrada.

Mais tarde foi internada numa instituição de saúde mental.

“Violada dia após dia, ano após ano”

Jane Doe 4 teve também que fazer sexo, amarrada no chão, com o líder da igreja: “Tu conheces-me desde que nasci, viste-me crescer. Supostamente deverias proteger-me. Mas escolheste aproveitar-me. Foi escolha tua, não minha. Apenas me rendi”.

“Naasón e esta igreja arruinaram a minha vida, todos os aspectos da minha vida. Dediquei a minha vida a servi-lo. Eu era vulnerável e ingénua, e ele aproveitou-se disso. Dizia que eu era propriedade sua. Violou-me várias vezes. Fui violada e abusada, dia após dia, ano após ano”, reforçou.

A mesma queixosa relatou que, num dos encontros, foi “convidada” a levar para junto de Naasón a sua irmã, que tinha apenas 14 anos.

Quando Jane Doe 2 falou, avisou: “Isto acontece há mais de 100 anos e tem que parar. Muitos pastores são pedófilos. É repugnante e triste. Eu achava que a igreja era um lugar seguro para mim, mas foi o meu pior pesadelo”.

Dirigindo-se directamente para o criminoso, atirou: “Destruíste-me. Destruíste a minha vida, mudaste a minha percepção da realidade. És um covarde. Queremos que o mundo saiba o monstro horrível que és.”

A “lavagem cerebral” chegou à mãe de Jane Doe 3. Quando Naasón foi preso, a mãe da vítima obrigou a filha a ir para a igreja rezar por ele. “Tinha que rezar pelo meu violador. Eu disse à minha mãe que não podia estar na igreja, que tinha de ir para a escola. Nunca vou esquecer aquele momento: ela nem olhou para mim”.

Nem houve julgamento

A acusação queria prisão perpétua, ou várias sentenças de prisão perpétua consecutivas.

Contudo, apenas cinco dias antes desta sessão, Naasón Joaquín García declarou-se culpado de três das 19 acusações de abuso sexual, posse de pornografia infantil e tráfico de pessoas. Crimes que terão sido cometidos entre 2015 e 2019.

Como admitiu culpa nessas três acusações, foi estabelecido um acordo entre os seus advogados e a procuradoria-geral da Califórnia – e não julgamento.

“Ao longo deste ano não me deixei de surpreender com o que as pessoas fazem em nome da religião. Desculpe, as minhas mãos estão atadas. Os advogados fizeram o que os advogados fazem. Jane Does, o mundo ouviu-vos. Os familiares que as abandonaram deveriam ter vergonha. Naasón Joaquín García é um predador sexual”.

Palavras do juiz Ronald S. Coen, antes de anunciar a sentença: 16 anos e 8 meses de prisão.

Silêncio na sala.

As vítimas abraçaram-se e choraram.

Longe da prisão perpétua, os jornalistas ficaram a fazer contas: “16 anos e 8 meses… Já está preso há três anos… Se acharem que ele um bom comportamento, vai sair quando?”.

“Inocente”

Entretanto, e como demonstra a imagem que ilustra este artigo, as pessoas da referida igreja, no México, continuam a dizer que o seu líder é inocente.

No dia seguinte à leitura da sentença, na sede da igreja La Luz del Mundo, em Guadalajara, houve manifestação de apoio a Naasón Joaquín García.

Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

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