A presidente da Associação Portuguesa de Medicina de Reprodução afirma que o fim do anonimato dos dadores pode ter como consequência a destruição de centenas de embriões.
Em entrevista à TSF, Ana Teresa Almeida Santos, presidente da Associação Portuguesa de Medicina de Reprodução, admite que os casais inférteis serão os mais prejudicados com as alterações impostas pelo Tribunal Constitucional (TC) em relação às barrigas de aluguer.
Além disso, a responsável assegura que o fim do anonimato dos dadores pode ter como consequência a destruição de centenas de embriões.
“Acho praticamente inexequível chamar todos os dadores para saber se vão ceder a sua identificação caso isso seja necessário. São muitos, largas centenas de pessoas. Não havendo uma resposta desses dadores, os embriões não poderão ser utilizados”, sustenta.
Depois da decisão do TC, o Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) começou a pedir aos centros de tratamento que contactem os dadores de gâmetas, óvulos e espermatozoides, mas a responsável alerta que localizar e contactar essas pessoas será muito difícil.
“Teremos de ver qual foi o destino que foi previsto quando foi feita a fecundação. não se puder aplicar o doar a outros casais ou a eles próprios, só restam dois destinos possíveis: investigação ou destruição“, explica.
Mas esta não é a única preocupação de Ana Teresa Almeida Santos. Os contratos de gestação de substituição que aguardavam resposta também a preocupam, na medida em que haverá muito mais dificuldade em encontrar dadores que prescindam do anonimato no futuro.
Tratamentos com dadores anónimos suspensos
O Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida recomendou às clínicas de fertilidade que suspendam os tratamentos com recurso a gâmetas de dadores anónimos, e o mesmo acontece com os processos para autorização de barrigas de aluguer pendentes.
Na reunião desta sexta-feira na Assembleia da República, concluíram que os problemas criados com o chumbo do Tribunal Constitucional só se resolvem por via legislativa“, pedindo aos juizes explicações sobre o que dizem ser o “início terapêutico”, casos a que o chumbo não se aplica.
Segundo o Diário de Notícias, o Conselho declarou “extintos” os processos de autorização para a gestação de substituição pendentes “por ter deixado de existir suporte legal”, informa em comunicado.
O chumbo do TC não implica apenas a gestação de substituição, mas toda a procriação medicamente assistida. Agora, as clínicas de fertilidade vão ter de se restringir à utilização de gâmetas de dadores que não pediram anonimato e perguntar a todos os outros se aceitam a quebra do sigilo.
Marcelo está preocupado
O Presidente da República está preocupado com a mudança de rumo do Tribunal Constitucional em relação à Procriação Medicamente Assistida (PMA). Segundo o Público, Marcelo Rebelo de Sousa ficou espantado e muito preocupado com a instabilidade das decisões do TC, após duas decisões contraditórias sobre o mesmo assunto.
“Recordarão que eu vetei a lei com várias observações, depois promulguei-a apesar de algumas observações, que foram depois retomadas pelo TC, mas o TC foi depois sobretudo buscar matéria anterior, reviu a sua jurisprudência para apreciar matéria que vinha do começo do século”, disse.
O que mais o preocupa é a inversão da posição sobre normas já apreciadas pelo mesmo tribunal em 2009 e então consideradas conforme a Constituição, refere o jornal.
O Tribunal Constitucional reconhece esta mudança de posição, e justifica-a com a “importância crescente que vem sendo atribuída ao conhecimento das próprias origens”.
Ainda assim, a maioria dos juízes considerou agora que o anonimato “merece censura constitucional, por impor uma restrição desnecessária aos direitos à identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade das pessoas nascidas em consequência de processos de PMA”.
Aliás, é esta mudança de rumo que preocupa Marcelo, que receia haver leituras ideologizadas da lei e que o TC não assegure a estabilidade das suas decisões.
Questionado sobre se a decisão do TC lhe agradou, Marcelo respondeu que “o Presidente da República não pode ter estados de espírito em relação a decisões dos tribunais. As decisões dos tribunais são como são, faz parte da separação de poderes não estar a pronunciar-me sobre a decisão do TC”, sublinhou.
Agora “cabe ao Parlamento, se quiser, voltar a legislar sobre a matéria e ponderar em que termos é que isso será feito”, acrescentou.