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Telescópio ALMA revela visão sem precedentes do nascimento de planetas

Os astrónomos já catalogaram quase 4000 exoplanetas em órbita de estrelas distantes. Embora já tenhamos aprendido muito sobre esses mundos recém-descobertos, ainda há muito que não sabemos. 

Resta-nos sobre os passos da formação planetária e as “receitas” cósmicas precisas que produzem a ampla gama de corpos planetários já descobertos, incluindo os chamados Júpiteres quentes, os mundos rochosos massivos, os planetas anões gelados e – esperamos algum dia em breve – análogos distantes da Terra.

Para ajudar a responder a estas e a outras questões intrigantes sobre o nascimento dos planetas, uma equipa de astrónomos recorreu ao telescópio o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) para realizar uma das mais profundas investigações sobre discos protoplanetários, as cinturas de poeira formadoras de planetas em redor de estrelas jovens.

“Este programa em específico é importante porque debruça-se sobre um dos objetivos científicos fundamentais do ALMA, que é entender o processo de formação planetária e, de estudos anteriores com amostras demasiado pequenas ou objetos individuais, salta para um contexto completamente novo, permitindo análises estatísticas,” explica Stuartt Corder, diretor adjunto do ALMA.

“Será que estes tipos de estruturas são comuns ou raros? Essa abordagem mais estatística permite que os investigadores respondam a questões muito mais fundamentais para o processo de formação planetária.”

Conhecido como DSHARP (Disk Substructures at High Angular Resolution Project), este grande programa do ALMA produziu imagens impressionantes e de alta resolução de 20 discos protoplanetários próximos e deu aos astrónomos novas informações sobre a variedade de características que contêm e sobre a velocidade com que os planetas podem emergir. Os resultados deste levantamento foram apresentados numa série de dez artigos científicos aceites para publicação na revista The Astrophysical Journal Letters.

De acordo com os cientistas, a interpretação mais convincente destas observações é que os planetas grandes, provavelmente parecidos em tamanho e composição com Neptuno ou Saturno, formam-se rapidamente, muito mais depressa do que a teoria atual indicaria. Também tendem a formar-se nos limites externos dos seus sistemas, a distâncias tremendas das suas estrelas hospedeiras.

Esta formação precoce também poderá ajudar a explicar como os mundos rochosos, do tamanho da Terra, são capazes de evoluir e crescer, sobrevivendo à sua suposta adolescência autodestrutiva.

“O objetivo desta campanha de observação era encontrar semelhanças e diferenças nos discos protoplanetários. A visão extraordinariamente nítida do ALMA revelou estruturas inéditas e padrões inesperadamente complexos,” comenta Sean Andrews, astrónomo do Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica e líder da campanha de observação do ALMA juntamente com Andrea Isella da Universidade Rice, Laura Pérez da Universidade do Chile e Cornelis Dullemond da Universidade de Heidelberg.

“Estamos a ver detalhes distintos em torno de uma grande variedade de estrelas jovens de várias massas. A interpretação mais convincente destas características altamente diversificadas e de pequena escala é que existem planetas invisíveis a interagir com o material do disco.”

Os modelos principais para a formação de planetas sustentam que estes nascem através da acumulação gradual de poeira e gás no interior de um disco protoplanetário, começando com grãos de poeira que coalescem para formar rochas cada vez maiores, até que surgem asteroides, planetesimais e planetas.

Este processo hierárquico deve levar muitos milhões de anos, sugerindo que o seu impacto nos discos protoplanetários seria mais predominante em sistemas mais antigos e maduros. A evidência crescente, no entanto, indica que nem sempre é o caso.

As primeiras observações de discos protoplanetários jovens, pelo ALMA, alguns com apenas um milhão de anos, revelam estruturas surpreendentes, incluindo anéis e lacunas proeminentes, que parecem ser as marcas dos planetas. Os astrónomos inicialmente estavam cautelosos ao atribuir estas características às ações dos planetas, já que outros processos naturais podiam também estar em jogo.

“Foi surpreendente ver possíveis assinaturas de formação planetária nas primeiras imagens de alta resolução de discos jovens. Era importante descobrir se eram anomalias ou se estas assinaturas eram comuns nos discos,” acrescenta Jane Huang, estudante no Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica e membro da equipa de investigação.

No entanto, dado que o conjunto de amostras era muito pequeno, era impossível tirar conclusões abrangentes. Os astrónomos podiam estar a observar sistemas atípicos. Foram necessárias mais observações de uma variedade de discos protoplanetários para determinar a causa mais provável das características que estavam a ver.

A campanha DSHARP foi projetada para fazer precisamente isso, estudando a distribuição a relativamente pequena escala das partículas de poeira em torno de 20 discos protoplanetários próximos. Estas partículas de poeira brilham naturalmente em comprimentos de onda milimétricos, permitindo que o ALMA mapeie com precisão a distribuição de densidade de partículas pequenas e sólidas em redor de estrelas jovens.

ALMA (ESO/NAOJ/NRAO), S. Andrews et al.; N. Lira

Imagens de alta resolução, pelo ALMA, de discos protoplanetários próximos, resultados da campanha DSHARP.

Dependendo da distância da estrela à Terra, o ALMA foi capaz de distinguir características tão pequenas quanto algumas Unidades Astronómicas (1 UA é a distância média entre a Terra e o Sol – cerca de 150 milhões de quilómetros, uma escala útil para medir distâncias à escala de sistemas estelares). Usando estas observações, os cientistas conseguiram visualizar uma população inteira de discos protoplanetários e estudar as suas características à escala de Unidades Astronómicas.

Os investigadores descobriram que muitas subestruturas – divisões concêntricas, anéis estreitos – são comuns a quase todos os discos, enquanto padrões espirais de grande escala e características semelhantes a arcos também estão presentes em alguns dos casos. Além disso, os discos e lacunas estão presentes numa ampla gama de distâncias das suas estrelas hospedeiras, desde algumas UA até mais de 100 UA, mais do que três vezes a distância de Neptuno ao Sol.

Estas características, que podem ser indícios de planetas grandes, podem explicar como os planetas rochosos semelhantes à Terra são capazes de se formar e crescer.

Durante décadas, os astrónomos depararam-se com um grande obstáculo na teoria da formação planetária: assim que os planetesimais crescem até um certo tamanho – cerca de um quilómetro em diâmetro – a dinâmica de um disco protoplanetário regular os induziria a cair para a sua estrela hospedeira, nunca obtendo a massa necessária para formar planetas como Marte, Vénus e a Terra.

Os anéis densos de poeira que vemos agora com o ALMA produziriam um refúgio seguro para os mundos rochosos amadurecerem completamente. As suas densidades mais altas e a concentração de partículas de poeira criariam perturbações no disco, formando zonas onde os planetesimais teriam mais tempo para se tornarem em planetas plenamente desenvolvidos.

“Quando o ALMA realmente revelou as suas capacidades com a sua icónica imagem de HL Tau, tivemos que nos perguntar se era um ‘outlier’, já que o disco era comparativamente massivo e jovem,” realça Laura Perez da Universidade do Chile e membro da equipa de pesquisa. “Estas últimas observações mostram que, embora impressionante, HL Tau está longe de ser invulgar e pode até representar a evolução normal de planetas em redor de estrelas jovens.”

// CCVAlg

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