“Era um monstro”. Al Fayed acusado de violar várias mulheres (série da Netflix atiçou a fúria)

(cv) The Independent

“Ele violou-me”. Esta é a acusação que várias mulheres fazem ao milionário Mohamed Al Fayed que morreu em 2023, com 94 anos, denunciando um alegado comportamento de “predador sexual” do dono do famoso Harrods.

“Mohamed Al Fayed era um monstro, um predador sexual sem qualquer bússola moral”, diz à BBC uma ex-funcionária dos armazéns Harrods, conhecida loja de Londres, garantindo que foi violada pelo milionário quando era adolescente.

Esta antiga trabalhadora diz ainda que todos os funcionários do Harrods eram “brinquedos” para Al Fayed.

“Tínhamos todos tanto medo. Ele cultivava activamente o medo. Se ele dissesse ‘salto’, os funcionários perguntavam ‘quão alto’”, acrescenta.

Esse medo terá levado muitas mulheres a calarem-se, mas muitas delas ganharam, finalmente, coragem depois da morte de Al Fayed em 2023.

A série da NetflixThe Crown” que conta a história da Família Real britânica, e onde a personagem de Al Fayed é retratada em alguns episódios, terá também levado algumas mulheres a quebrarem o silêncio.

Al Fayed aparece na série como um homem afável, simpático e galanteador, apesar de alguns excessos de quem pode tudo devido à imensa fortuna.

“Não era assim que ele era”, lamenta Sophia que foi assistente pessoal de Al Fayed entre 1988 e 1991, e que diz que ele a tentou violar por mais do que uma vez.

Dezenas de mulheres violadas ou abusadas por Al Fayed

Mais de 20 ex-funcionárias do milionário testemunharam numa investigação da BBC intitulada “Al-Fayed: Predador no Harrods“, assegurando que foram violadas, ou agredidas sexualmente por ele.

Estes testemunhos revelam “um padrão de comportamento predatório e de abuso sexual por parte de Al Fayed”, relata o canal britânico.

“O proprietário do Harrods visitava regularmente os vastos pisos de vendas da loja de departamentos e identificava jovens assistentes que considerava atraentes, que seriam depois promovidas para trabalhar nos seus escritórios no piso superior”, conta a BBC com base em relatos de antigos funcionários.

Os abusos sexuais ocorreriam nesses escritórios, mas também no apartamento do milionário em Londres, ou em viagens ao estrangeiro, como a Paris, a Saint Tropez e a Abu Dhabi.

Gemma que foi assistente pessoal de Al Fayed entre 2007 e 2009, diz que foi violada na Villa Windsor em Paris, antiga morada do Rei Eduardo VIII e da mulher Wallis Simpson depois de ter abdicado do trono.

Após o acto, Gemma conta que ficou a chorar e que Al Fayed lhe disse, de forma agressiva, que se lavasse com um sabonete líquido anti-séptico, como se isso a fizesse “esquecer” do que tinha acontecido.

Gemma acabou por deixar o Harrods recebendo uma quantia em dinheiro para não revelar a violação, sendo obrigada a assinar um “acordo de não divulgação”. O mesmo terá acontecido com outras mulheres.

Após a divulgação da investigação, a BBC assegura que já foi contactada por mais antigas funcionárias do Harrods a garantirem que Al Fayed também as atacou.

“Nem sequer era um segredo”

O antigo director de departamento da Harrods entre 1994 e 2004, Tony Leeming, diz à BBC que tinha “consciência” dos abusos sexuais. “Nem sequer era segredo”, aponta, embora notando que não sabia das violações.

“Estávamos cientes de que ele tinha um grande interesse por jovens raparigas“, conta ainda à BBC o antigo vice-director de segurança do Harrods, Eamon Coyle, que também revela que havia telefones sob escuta e câmaras escondidas para filmar os funcionários.

Além disso, a BBC realça que as funcionárias eram sujeitas a exames médicos de teor sexual quando começavam a trabalhar directamente com Al Fayed, “incluindo testes invasivos”. Os resultados seriam enviados para o milionário e algumas não terão sequer tido acesso aos mesmos.

Quem era, afinal, Al Fayed?

O milionário que nasceu no Egipto, mas que conseguiu a cidadania britânica, chegou a ser acusado de agressão sexual enquanto estava vivo. Mas as novas alegações são de “uma escala e seriedade sem precedentes”, aponta a BBC que acredita que ainda haverá “muitas mais” vítimas.

Nascido numa família pobre, no Egipto, Al Fayed começou por vender refrigerantes nas ruas do país do Médio Oriente. Mas o casamento da irmã com um traficante de armas sauditas abriu-lhe as portas do mundo, garantindo-lhe ligações para a construção de um império milionário.

Em 1974, mudou-se para o Reino Unido e já era conhecido quando, em 1985, tomou conta do Harrods. Durante os anos de 1990, apareceu por várias vezes em programas de televisão em horário nobre.

Mas ganhou um especial destaque quando o filho Dodi começou a namorar com a Princesa Diana, após o divórcio desta. Dodi e Diana morreram juntos num acidente de viação trágico em Paris, em 1997 – e Al Fayed sempre acreditou que a Rainha Isabel II tinha culpas na morte de Diana.

Ao longo dos anos, foram surgindo várias reportagens e notícias sobre os alegados abusos do milionário, mas nunca nada se provou. Enquanto esteve à frente do Harrods, beneficiou de total impunidade no seio da empresa de que era o dono, e os alegados abusos foram sempre escondidos.

Actuais donos do Harrods “chocados”

Mas, agora, 14 das mulheres com quem a BBC falou apresentaram acções civis contra a Harrods por danos. Algumas já chegaram a acordos de indemnização com a empresa e há muitas outras que estão também a considerar avançar com processos.

Os advogados das queixosas acusam a Harrods de ter responsabilidades, nomeadamente por não ter protegido estas mulheres.

“Houve claramente tentativas por parte dos altos funcionários da Harrods para varrer isto para debaixo do tapete“, lamenta o advogado Dean Armstrong que representa algumas das vítimas.

Os actuais proprietários da empresa demarcam-se dos comportamentos do milionário egípcio, apontando que “o Harrods de hoje é uma organização muito diferente daquela que foi detida e controlada por Al Fayed entre 1985 e 2010″, e realçando que “procura colocar o bem-estar dos colaboradores no centro de tudo”.

Sublinhando que estão “totalmente chocados” com as alegações e pedindo desculpas às vítimas, salientam que foram acções de um indivíduo “com a intenção de abusar do seu poder“.

“Embora não possamos desfazer o passado, estamos determinados a fazer a coisa certa como organização, impulsionados pelos valores que defendemos hoje, garantindo ao mesmo tempo que tal comportamento nunca poderá ser repetido no futuro”, constata ainda a actual direcção do Harrods citada pela BBC.

ZAP //

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