Há muito que os cientistas supõem que as aves migram durante os Invernos para poupar energia. O raciocínio tem sido bastante óbvio: longe do frio cortante, as aves precisariam de gastar menos energia para se manterem quentes.
Segundo o Mongabay, uma nova investigação veio alterar esse pressuposto. Um estudo publicado na revista Nature Ecology & Evolution concluiu que um grupo de melros da Eurásia (Turdus merula), uma espécie parcialmente migratória, que passava algum tempo em regiões mais quentes não poupava energia quando comparado com uma população da mesma espécie que permanecia num ambiente gelado.
“Suspeitámos de um défice de energia para as aves residentes, mas não houve diferença significativa entre a energia líquida que gastaram em comparação com as migratórias”, disse Nils Linek, autor principal e investigador do Instituto Max Planck de Comportamento Animal. “Se não há benefício energético geral, deve haver outras pistas ou razões para migrar”.
Como parte do estudo, os investigadores colocaram biologgers que foram implantados cirurgicamente nas aves. Os sensores nos registadores mediram o ritmo cardíaco e a temperatura corporal de 30 em 30 minutos.
O ritmo cardíaco serve de indicador do gasto de energia, quanto mais energia for utilizada, maior será o ritmo cardíaco. “era como espreitar através de um buraco de fechadura para os seus sistemas internos, como se estivessem a usar um smartwatch“, disse Linek.
Ao longo de três anos, a partir de 2016, a equipa instalou sensores em 118 aves no sul da Alemanha. Os transmissores de rádio ligados externamente permitiram aos cientistas monitorizar se as aves estavam mortas ou vivas, bem como seguir os seus movimentos. No final, a equipa obteve mais de 890 000 medições, a partir dos registadores que retirou de 83 aves.
“Acabámos por ter uma imagem inovadora do que estas aves estão a fazer para apoiar a sua migração”, disse Scott Yanco, coautor principal e investigador da Escola de Ambiente e Sustentabilidade da Universidade de Michigan. “Elas estão a ajustar os seus batimentos cardíacos e toda a sua organização metabólica de formas realmente complicadas.
A análise de dados relativos ao ritmo cardíaco e à temperatura corporal ajudou os cientistas a calcular o gasto energético diário das aves. Descobriram que as aves migratórias começavam a baixar o ritmo cardíaco e a temperatura corporal quase um mês antes da partida para poupar energia para a viagem. Teoricamente, o seu gasto de energia deveria diminuir quando chegam ao seu destino. Mas não se verificou que isso acontecesse.
“Não aparece nos dados do ritmo cardíaco”, disse Yanco. “Há energia que está a passar pelo sistema delas que não é contabilizado”.
As descobertas deixaram a equipa com algumas questões intrigantes, nomeadamente: Para onde foi essa energia? E se não há qualquer benefício energético na migração, porque é que tantas aves o fazem?
Linek e Yanco levantam a hipótese de que a migração deve ter custos ocultos que podem incluir funções imunológicas, a energia necessária para permanecer vigilante num novo ambiente ou a concorrência de outras aves na área para onde migraram. “O benefício termorregulador é claramente compensado por outra coisa que é mais difícil lá em baixo”.
Ao mesmo tempo que procura respostas para estas questões, Linek disse que quer aproveitar a “revolução de biologgers“ para recolher mais dados e compreender melhor como o ambiente “está a viajar através da fisiologia e da organização energética das aves”.
A compreensão das respostas fisiológicas à migração também ajudará os cientistas a prever como as alterações climáticas e a degradação do habitat poderão afetar os padrões de migração no futuro.
“Prever onde e quando os animais vão estar, o que faz com que as suas populações aumentem ou diminuam, e como podemos intervir para mudar essas coisas”, disse Yanco. “São estas as perguntas a que temos de responder”.