A guerra da Ucrânia pode acabar exatamente onde começou

A Ucrânia está a ganhar vantagem num local crucial para a logística militar russa. Se sair vencedora onde tudo começou, pode colocar finalmente um ponto final no conflito, acreditam os especialistas.

Foi há mais de 10 anos que os “homenzinhos verdes” russos invadiram a península da Crimeia, em fevereiro de 2014, naquele que foi o primeiro grande hastear de bandeiras russas em território ucraniano.

Logo a seguir, em março, as forças russas ratificavam formalmente a anexação da península, desencadeando a guerra no Dombass, um mês mais tarde. “Aumenta risco de guerra entre Ucrânia e Rússia”, escrevia o ZAP em março de há uma década.

Agora, ironicamente, a guerra pode ter fim à vista na região que os ucranianos conhecem hoje como “Crimeia ocupada”, dizem especialistas do conflito em andamento.

Condição necessária em qualquer cenário de acordo de paz, a devolução da Crimeia a Kiev é um dos maiores objetivos do presidente Volodymyr Zelenskyy desde a invasão russa. E é precisamente no Mar Negro que a Ucrânia parece estar a vencer.

A Ucrânia intensificou a sua ofensiva na Crimeia nos últimos meses e lançou uma série de ataques bem-sucedidos na região na região de Sevastopol, com recurso a drones.

O aumento dos ataques, para os quais Zelenskyy nos tem vindo a alertar, já permitiram à Ucrânia retomar o importante transporte de cereais através do Mar Negro e forçaram a Frota Russa do Mar Negro a retirar operações da sua base naval em Sevastopol, onde também afundou o navio-almirante Moskva, da mesma frota, contam especialistas do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais ao Insider.

Fim da guerra?

A Crimeia “é a chave para o acesso e operações da Rússia no Mar Negro”, diz Maria Snegovaya, membro sénior do Programa Europa, Rússia e Eurásia do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais: “permite a projeção de poder sobre o resto do Mar Negro. Por conseguinte, a dissuasão das posições navais russas na Crimeia é fundamental para a Ucrânia”.

Kiev tem o objetivo de tentar pela terceira vez a destruição da ponte Kerch, que liga a península da Crimeia à Rússia. O plano já teve a aprovação de Zelenskyy e deve acontecer ainda em 2024.

A ponte, que liga a Rússia continental à costa oriental da Crimeia, é uma das maiores conquistas de Vladimir Putin: é vista como o “regresso” da Crimeia à Rússia pelo presidente russo.

A destruição é vista como “inevitável” pela secreta ucraniana e seria uma vitória estratégica e simbólica para Kiev.

“Os russos têm um espaço de manobra relativamente limitado na península”, diz
Frederik Mertens, analista estratégico do Centro de Estudos Estratégicos de Haia, ao Business Insider: a Ucrânia está a “preparar terreno” para futuros ataques aéreos quando chegarem os F-16 dos Estados Unidos.

“Se um número limitado de caças pode ter um impacto real, é aqui”, diz o especialista.

Face às notícias, a Rússia terá começado a reduzir a sua dependência da ponte de 12 quilómetros, com a construção anunciada em março de uma linha ferroviária de Rostov-on-Don, no sul da Rússia, até à Crimeia.

“O caminho de ferro ao longo do corredor terrestre é o reconhecimento por parte dos ocupantes russos de que a ponte da Crimeia está condenada”, disse Dmitry Pletenchuk, porta-voz do comando militar do sul da Ucrânia, ao The Economist.

Crê-se que para proteger a região dos jatos norte-americanos, os russos já transferiram o seu sistema de defesa aéreo mais avançado, o S-500, para a península.

Se a Ucrânia conseguir recuperar o controlo do Mar Negro e retomar a península, ou exercer pressão suficiente sobre estas áreas para ameaçar o Kremlin — “isso assinalará o fim da guerra“, diz ao Insider Elina Beketova, do Centro de Análise de Políticas Europeias.