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A imprevisibilidade de Donald Trump é um dos seus truques para extrair concessões aos aliados, numa estratégia conhecida como a Teoria do Louco. Já com os seus inimigos, a tática não é tão eficaz.
Questionado no mês passado se estava a planear juntar-se a Israel no ataque ao Irão, o presidente dos EUA, Donald Trump, disse: “Posso fazer isso. Posso não fazer isso. Ninguém sabe o que vou fazer“.
Trump deixou o mundo acreditar que tinha concordado com um cessar-fogo de duas semanas para permitir que o Irão retomasse as negociações. E então bombardeou os iranianos mesmo assim.
Um padrão está a surgir: a coisa mais previsível sobre Trump é a sua imprevisibilidade. Ele muda de ideias. Ele contradiz-se. Ele é inconsistente.
“[Trump] montou uma operação de formulação de políticas altamente centralizada, indiscutivelmente a mais centralizada, pelo menos na área de política externa, desde Richard Nixon”, diz Peter Trubowitz, professor de relações internacionais na London School of Economics.
“E isso torna as decisões políticas mais dependentes do caráter, das preferências e do temperamento de Trump.”
Trump aprendeu a usar a sua imprevisibilidade para fins políticos, tornando-a um ativo estratégico e político fundamental
Cientistas políticos chamam-lhe Teoria do Louco, na qual um líder mundial busca persuadir o seu adversário de que é temperamentalmente capaz de qualquer coisa, para extrair concessões. Usado com sucesso, pode ser uma forma de coerção e Trump acredita que está a dar frutos, colocando os aliados dos EUA onde ele quer.
Mas será uma abordagem que pode funcionar contra inimigos?
Ataques, insultos e abraços
Trump iniciou a sua segunda presidência abraçando o presidente russo Vladimir Putin e atacando os aliados da América. Insultou o Canadá dizendo que deveria tornar-se o 51.º estado dos EUA.
Disse que estava preparado para considerar o uso de força militar para anexar a Gronelândia, um território autónomo da Dinamarca, aliada dos EUA. E disse que os EUA deveriam retomar a propriedade e o controlo do Canal do Panamá.
Isso pareceu virar a página em 80 anos de solidariedade transatlântica. “O que Trump fez foi levantar sérias dúvidas e questões sobre a credibilidade dos compromissos internacionais da América”, diz Trubowitz.
“A minha sensação é que a maioria das pessoas na órbita de Trump pensa que a imprevisibilidade é uma coisa boa, porque permite que Donald Trump alavanque a influência dos EUA para o ganho máximo”, diz. “Esta é uma das suas lições ao negociar no mundo imobiliário.”
A previsibilidade da imprevisibilidade
Julie Norman, professora de política da University College London, concorda que agora existe uma “Doutrina da Imprevisibilidade”. “É muito difícil saber o que está por vir”, argumenta. “E essa sempre foi a abordagem de Trump.”
Trump aproveitou com sucesso a sua reputação de volatilidade para mudar o relacionamento de defesa transatlântico. E, aparentemente para manter Trump do seu lado, alguns líderes europeus bajularam e curvaram-se.
A cimeira da NATO do mês passado em Haia foi um exercício de cortejo obsequioso. O secretário-geral da NATO, Mark Rutte, tinha enviado anteriormente a Trump (ou “Caro Donald”) uma mensagem de texto, que Trump vazou.
“Parabéns e obrigado por sua ação decisiva no Irão, foi realmente extraordinário”, ele escreveu. Sobre o próximo anúncio de que todos os membros da NATO concordaram em aumentar os gastos com defesa para 5% do PIB, ele continuou: “Você alcançará algo que NENHUM presidente em décadas conseguiu fazer.”
Anthony Scaramucci, que atuou anteriormente como diretor de comunicações de Trump no seu primeiro mandato, disse: “Sr. Rutte, ele está a tentar envergonhá-lo . Ele está literalmente sentado no Air Force One a rir de si.”
E isso pode ser a fraqueza no coração da Doutrina da Imprevisibilidade de Trump: suas ações podem ser baseadas na ideia de que Trump anseia por adulação. Ou que busca vitórias de curto prazo, preferindo-as a processos longos e complicados.
Adversários resistentes a charme e ameaças
Então, há a questão se uma Doutrina da Imprevisibilidade ou a Teoria do Louco pode funcionar em adversários.
O presidente ucraniano Volodymyr Zelenskyy, um aliado que recebeu um sermão de Trump e Vance no Salão Oval, mais tarde concordou em conceder aos EUA direitos lucrativos para explorar os recursos minerais ucranianos.
Vladimir Putin, por outro lado, aparentemente permanece convicto em resistir aos encantos e ameaças de Trump. Na quinta-feira, após um telefonema, Trump disse que estava “decepcionado” por Putin não estar pronto para encerrar a guerra contra a Ucrânia.
E o Irão? Trump prometeu à sua base que encerraria o envolvimento americano em “guerras eternas” no Médio Oriente. A sua decisão de atacar as instalações nucleares do Irão foi talvez a escolha política mais imprevisível do seu segundo mandato até agora. A questão é se terá o efeito desejado.
O ex-secretário de Relações Exteriores britânico, William Hague, argumentou que fará precisamente o oposto: tornará o Irã mais, e não menos propenso a buscar a aquisição de armas nucleares.
O Prof. Desch concorda. “Acho que agora é altamente provável que o Irão tome a decisão de buscar uma arma nuclear”, diz. “Então, eu não ficaria surpreso se eles se mantiverem discretos e fizerem todo o possível para completar o ciclo completo de combustível e conduzir um teste [nuclear].
“Acho que a lição de Saddam Hussein e Muammar Khadafi não é perdida para outros ditadores que enfrentam os EUA e uma potencial mudança de regime…
“Então, os iranianos sentirão desesperadamente a necessidade do impedimento final e olharão para Saddam e Khadafi como exemplos negativos e Kim Jong Un da Coreia do Norte como o exemplo positivo.”
Uma perda de confiança nas negociações?
Olhando para o futuro, a imprevisibilidade pode não funcionar contra os inimigos, mas não está claro se as recentes mudanças que produziu entre os aliados podem ser sustentadas.
Embora possível, este é um processo construído em grande parte por impulso. E pode haver uma preocupação de que os EUA possam ser vistos como um mediador não confiável.
“As pessoas não vão querer fazer negócios com os EUA se não confiarem nos EUA nas negociações, se não tiverem certeza de que os EUA os apoiarão em questões de defesa e segurança”, argumenta Norman. “Então, o isolamento que muitos no mundo MAGA [Make America Great Again, Faça a América Grande de Novo em tradução livre, nome do movimento trumpista] buscam, eu acho, vai sair pela culatra.”
O chanceler alemão Friedrich Merz, por exemplo, disse que a Europa precisa agora se tornar operacionalmente independente dos EUA.
“A importância do comentário do chanceler é que é um reconhecimento de que as prioridades estratégicas dos EUA estão a mudar”, diz Trubowitz. “Elas não vão voltar a ser como eram antes de Trump assumir o cargo. Então sim, a Europa terá que se tornar mais operacionalmente independente.”
“Mas, mais fundamentalmente, Trump desencadeou algo… A política nos Estados Unidos mudou. As prioridades mudaram. Para a coligação MAGA, a China é um problema maior do que a Rússia. Isso talvez não seja verdade para os europeus.”
E de acordo com Milani, Trump está tentando consolidar o poder americano na ordem global. “É muito improvável que ele mude a ordem que foi estabelecida após a Segunda Guerra Mundial. Ele quer consolidar a posição da América nessa ordem porque a China está a desafiar a posição da América nessa ordem.”
Mas tudo isso significa que os imperativos de defesa e segurança enfrentados pelos EUA e pela Europa estão a divergir. Os aliados europeus podem estar satisfeitos que, através de lisonjas e mudanças políticas reais, mantiveram Trump amplamente ao seu lado.
Mas a imprevisibilidade significa que isso não pode ser garantido – e parecem ter aceitado que não podem mais depender complacentemente dos EUA para honrar o seu compromisso histórico com a sua Defesa.
E nesse sentido, mesmo que a Doutrina da Imprevisibilidade venha de uma combinação de escolha consciente e dos traços de caráter muito reais de Trump, ela está a funcionar, pelo menos em algumas situações.
ZAP // BBC
Obrigado Trump por tornar o Mundo mais forte, especialmente a Europa, porque ficamos a saber que não podemos confiar nos EUA.
Por fim estamos a ficar libertos do estigma Russia/EUA com origem no fim da 2 Guerra Mundial.