Há mais de 30 anos que Netanyahu fala numa ameaça nuclear iminente do Irão. Nunca se concretizou

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Gali Tibbon / Afp Pool

Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel

Desde 1992 que Netanyahu diz que o Irão está a um prazo máximo de 5 anos de desenvolver armas nucleares. No entanto, um relatório recente da ONU continua a não ter provas de que os iranianos estão a produzir bombas.

As acusações de Benjamin Netanyahu de que o Irão está prestes a ter armas nucleares podem soar a déjà vu — e não é por acaso. O primeiro-ministro israelita já diz há mais de 30 anos que Teerão está prestes a tornar-se uma potência nuclear, apesar de esse cenário nunca se ter concretizado.

A primeira vez foi em 1992, quando ainda era só um deputado no Parlamento israelita. Na altura, Netanyahu declarou que “num prazo de três a cinco anos, podemos assumir que o Irão se tornará autónomo na sua capacidade de desenvolver e produzir uma bomba nuclear”.

Dois anos mais tarde, em 1995, Netanyahu publicou um livro intitulado Fighting Terrorism onde volta a fazer a mesma previsão: “As melhores estimativas nesta altura colocam o Irão a entre três e cinco anos de possuir os pré-requisitos necessários para a produção independente de armas nucleares”.

Em 1996, já na condição de primeiro-ministro de Israel, Netanyahu discursou no Congresso dos Estados Unidos e pediu aos seus aliados norte-americanos que travassem “a nuclearização de Estados terroristas“. “O prazo para atingir essa meta está cada vez mais próximo”, alertou.

Em 2002, em declarações a um comité do Congresso americano, Netanyahu manifestou-se a favor da guerra no Iraque, afirmando que tanto o Iraque como o Irão estavam perto de ter um arsenal nuclear. “Não há dúvida alguma de que Saddam busca, trabalha e avança rumo ao desenvolvimento de armas nucleares. Assim que Saddam tiver armas nucleares, a rede terrorista terá armas nucleares”, disse confiantemente. Recorde-se que o conflito no Iraque foi baseado na alegação de Washington de que o Governo de Saddam Hussein tinha armas de destruição massiça, mas essas armas nunca foram encontradas.

Sete anos mais tarde, como líder do partido Likud e candidato a primeiro-ministro, Netanyahu reuniu-se com uma delegação do Congresso em visita a Israel. Na conversa — cujo conteúdo foi divulgado pelo WikiLeaks — Netanyahu avisou que o Irão estava “provavelmente a apenas um ou dois anos” de ter armas nucleares. Questionado sobre a origem desta informação, atribuiu a previsão a “especialistas” israelitas, sem especificar quem eram ou dar mais explicações.

Ainda em 2009 e já depois de ser reeleito primeiro-ministro, outro telegrama obtido pelo WikiLeaks indica que Netanyahu disse a um grupo separado de membros do Congresso em visita a Israel que “o Irão tem capacidade agora para fabricar uma bomba” ou “poderia esperar e fabricar várias bombas em um ou dois anos“.

Mas a acusação mais notória aconteceu em 2012, quando discursou perante a assembleia-geral das Nações Unidas, acompanhado por um cartoon de uma bomba com o fusível aceso.

“Na próxima primavera, ou no máximo até ao próximo verão, seguindo os ritmos atuais de enriquecimento, eles vão passar para a fase final. A partir daí, é só mais alguns meses ou até possivelmente algumas semanas, até que tenham urânio enriquecido suficiente para a primeira bomba”, frisou o representante do Estado judaico, apontando para o desenho.

Agora, 13 anos depois, Netanyahu voltou a fazer um discurso semelhante para justificar os ataques israelitas contra o Irão. “Eles não pararam. O Irão pode produzir uma arma nuclear num prazo muito curto. Pode ser um ano, podem ser alguns meses”, afirmou.

O que dizem as provas?

Apesar de haver sinais de que o Irão está a aumentar a produção de urânio enriquecido, um relatório do mês passado da Agência Internacional de Energia Atómica refere que não há provas de que Teerão esteja ativamente a tentar produzir armas nucleares.

“Não temos quaisquer provas de um esforço sistemático para fazerem armas nucleares”, afirmou também recentemente o Diretor-Geral da Agência Internacional de Energia Atómica, Rafael Grossi, em entrevista à CNN.

O mesmo é dito pelas agências de inteligência norte-americanas. De acordo com o New York Times, os responsáveis americanos acreditam que o Irão ainda não decidiu se fabricará uma bomba nuclear, embora tenha grandes reservas de urânio enriquecido.

Em março, a própria Diretora de Inteligência Nacional do Governo de Trump, Tulsi Gabbard, fez declarações semelhantes perante o Congresso, afirmando que as agências de inteligência dos EUA concluíram que o Irão não estava a construir armas nucleares e não tinha retomado o programa desde a sua suspensão em 2003.

Questionado sobre estas declarações, Trump discordou. “Não quero saber do que ela disse. Acho que eles estão muito perto de ter uma bomba”, afirmou. Desde então, Gabbard voltou atrás, e diz agora que, afinal, o Irão pode ter uma arma nuclear daqui a poucas semanas e que as suas afirmações tinham sido descontextualizadas por “media desonestos”.

Algumas autoridades americanas acreditam que este recuo se baseia no material fornecido pela Mossad, a agência de inteligência israelita. Embora algumas autoridades americanas considerem a estimativa israelita confiável, outras enfatizaram que a avaliação da inteligência americana permaneceu inalterada e que é arriscado para os EUA basear-se apenas no que é dito por Israel.

Estamos perante um Iraque 2.0?

As constantes contradições têm levantado dúvidas sobre o programa nuclear do Irão é realmente a verdadeira motivação por trás da recente escalada de tensão ou se o objetivo é, afinal, derrubar o Governo do Irão e instaurar um novo regime mais favorável aos interesses ocidentais, usando o receio nuclear como pretexto.

Recentemente, Benjamin Netanyahu admitiu que a operação israelita contra o Irão “pode certamente” resultar numa mudança de regime e descreveu o Governo iraniano como “muito fraco”.

Já Donald Trump também admitiu este domingo que não descarta a possibilidade de mudar o Governo. “Não é politicamente correto usar o termo “Mudança de Regime”, mas o regime iraniano atual é incapaz de FAZER O IRÃO GRANDE OUTRA VEZ, porque é que não haveria de haver uma mudança de regime??? MIGA!!!”, escreveu na sua rede social, Truth Social.

No entanto, o Presidente norte-americano já fez marcha-atrás, dizendo antes de embarcar para a cimeira da NATO que não quer derrubar o Governo iraniano. “Quero ver tudo a acalmar-se o mais rapidamente possível. A mudança de regime causa caos e idealmente nós não queremos muito caos”, afirmou.

Mesmo assim, estas declarações estão a agitar fantasmas do passado e a suscitar comparações com a guerra no Iraque, principalmente dada a prevalência de uma teia de interesses económicos que podem influenciar as decisões do Governo dos EUA.

Se o petróleo é agora muitas vezes apontado como a verdadeira razão para a invasão do Iraque, a mesma motivação pode estar agora por trás da escalada de tensão com o Irão, que é o 8.º maior produtor petrolífero do mundo e também o 3.º maior produtor de gás natural.

Os interesses do complexo industrial militar também podem ser influentes. De acordo com os dados da organização apartidária Taxpayers for Common Sense, a indústria do armamento doou mais de 184 milhões de dólares para as campanhas de políticos norte-americanos entre 2014 e 2022. Só para o ciclo eleitoral de 2024, a indústria da Defesa contribuiu com mais 42 milhões de dólares.

Adriana Peixoto, ZAP //

1 Comment

  1. NatanDiabo é um ser que trabalha exclusivamente para propagar a guerra, a desordem e o extermínio daqueles que não lhe agradam.
    Esquece que muitos dos fariseus morreram de formas terríveis provocadas pelos nazis, mas nem isso fez com que ele tenha consciência e seja um ser melhor.
    Não honram os antepassados e sempre se fazem de pobres coitados, quando na verdade são os que atacam.

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