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Um “novo padel” está a ameaçar o ténis

É o desporto que mais cresce nos EUA atualmente e várias lendas do ténis já trocam a raquete pela pá inspirada na raquete de ping-pong. Empurrado pela pandemia, os seus amantes já pensam nos Jogos Olímpicos.

Começou como um simples jogo de quintal para passar o tempo, mas recentemente tornou-se um fenómeno global — e até já espreita os Jogos Olímpicos.

Depois do ‘boom’ do padel, o pickleball é o desporto que mais cresce atualmente nos Estados Unidos: há já 36,5 milhões de jogadores no país que o viu nascer — um aumento de 223,5% nos últimos três anos. Até jogadores lendários esta mistura de ténis, badminton e ping-pong já “roubou” ao ténis.

Da raquete à pá: “o ténis está em perigo”

Atual campeão do Open dos Estados Unidos, 24 vezes vencedor do Grand Slam e ícone do ténis, Novak Djokovic já disse que a moda do pickleball “colocou em perigo” o desporto que lhe deu fama.

“Agora temos o padel ou o pickleball, como lhe chamam nos Estados Unidos, que está a crescer e a emergir”, disse em julho, em Wimbledon.

“O ténis é o rei ou a rainha de todos os desportos de raquete, isso é verdade. Mas, a nível de clubes, o ténis está em perigo. Se não fizermos alguma coisa, o padel e o pickleball vão converter todos os clubes de ténis em clubes de padel e pickleball, porque é mais económico“, sublinhou. E não está sozinho.

Estrelas do ténis como John McEnroe, Maria Sharapova, Andre Agassi e Steffi Graf converteram-se ao desporto da moda. Fora do ténis, são muitas as celebridades a promovê-lo: Bill Gates, Selena Gomez, Michael Phelps ou Matthew Perry — que faleceu drasticamente duas horas depois de uma partida — são alguns exemplos.

Foi essencialmente a pandemia da covid-19 que os chamou. Ao permitir o distanciamento físico, mas mantendo o contacto social — o pickleball, tal como o padel, pode ser jogado individualmente ou em duplas — o pequeno e pouco exigente campo foi a solução perfeita para quem não queria ficar ‘colado’ ao sofá.

“Quando o comparo com o ténis, vemos que o atletismo [no ténis] é incrível no lado masculino e feminino”, disse a lenda, McEnroe, “por isso vejo-o como o rei de todos os desportos de raquete. Tudo o resto está abaixo dele, é apenas uma questão de saber até que ponto está abaixo”, começou por dizer o ex-tenista, citado pela Forbes.

E acrescentou: “Ao refletir, tenho esperança que isto ajude potencialmente ambos os desportos, porque toda a gente pensa: ‘Será que isto vai aguentar, o pickleball? O que é que se passa com esta coisa? Muitas pessoas que não tinham passado muito tempo num campo e que não são muito atléticas começam a jogar pickleball e dizem: ‘Ei, eu posso jogar!’, o que é bom, faz com que as pessoas se mexam.”

Ténis vinga-se do “desagradável” pickleball

Visivelmente irritado com a louca ascensão do “desagradável” pickleball está o presidente do organismo que rege o ténis nos EUA — tão irritado que já pensa em criar um jogo concorrente para recuperar o entusiasmo pelo ténis, anunciou em finais de agosto à agência AP.

O movimento “anti-ténis” rouba cada vez mais courts ao ténis, avisou o presidente da Associação de Ténis dos Estados Unidos (USTA) Brian Hainline, que proibiu o pickleball de participar no último Open do país, em Queens.

O desespero levou-o a anunciar, como vingança, um novo jogo, “filho” do ténis, para a próxima primavera: Red Ball Tennis, ideal para ser jogado… nos campos de pickleball.

Do quintal para o mundo (e Portugal)

Com origem em 1965 no quintal de Joel Pritchard, um congressista republicano do estado de Washington, o pickleball nasceu quando Pritchard e os seus amigos improvisaram um jogo com recurso a pás de ténis de mesa e uma bola de plástico perfurada.

Ao longo dos anos, o desporto evoluiu, com regras padronizadas e uma rede rebaixada. Mas a loucura atual já não se limita aos EUA.

Em Portugal, a Quad, conhecida pela produção de raquetes de padel em Braga, expandiu recentemente a sua atividade e tornou-se a primeira marca portuguesa a produzir raquetes de pickleball.

Já há até uma Associação Portuguesa de Pickleball (APP), criada há sensivelmente dois anos, que inaugurou o seu primeiro campeonato este verão, em julho, em Vila Real de Santo António. Atualmente há pelo menos 21 clubes registados na APP espalhados por vários pontos do país.

O calcanhar de Aquiles? Lesões… no tendão de Aquiles

Também muito popular entre os mais velhos, o pickleball tem vindo a aumentar o número de lesões preocupantes, nomeadamente ruturas no tendão de Aquiles.

É uma “epidemia” entre os cidadãos entre os 60 e 70 anos, avisam especialistas: só em 2023, estas lesões representaram mais de 350 milhões de dólares em custos médicos nos EUA.

O aumento de incidências desta lesão grave — que pode levar meses a curar — deve-se em grande parte ao regresso à atividade física após anos de inatividade. Os movimentos bruscos exigidos no pickleball, como sprints ou saltos rápidos, podem exercer uma enorme pressão sobre o tendão de Aquiles e conduzir a ruturas parciais ou totais.

Apesar de tudo, não há que ter medo: os especialistas reforçam que é sempre mais positivo arriscar e jogar do que não o fazer.

O pickleball faz oficialmente parte da categoria de exercício moderado. Um jogo de meia hora elimina mais 36% de calorias do que uma caminhada com a mesma duração, segundo um estudo da International Journal of Environmental Research and Public Health, citado pelo The New York Times.

É, segundo o mesmo estudo, uma ótima maneira de começar a fazer exercício físico: adultos inativos que começaram a jogar aumentaram em 11% a força de pernas e melhoraram consideravelmente os níveis de colesterol, pressão arterial e capacidade máxima de ingestão de oxigénio.

O desporto é, de facto, frequentemente associado a adultos mais velhos, mas na verdade tem o seu maior grupo demográfico — 28,8% dos jogadores, nos EUA — na faixa etária dos 18 aos 34 anos.

À medida que o desporto se espalha, pede-se cada vez mais a sua integração nos Jogos Olímpicos — um objetivo ainda muito longe de ser concretizado.

Para ser desporto olímpico, o pickleball tem de ser praticado em 75 países de quatro continentes, além de ter de ser regido por uma federação internacional que adira ao Código Mundial Anti-Doping. Teremos de esperar para ver.

Tomás Guimarães, ZAP //

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