Para ajudar os Aliados na II Guerra, um grupo de cientistas embebedava-se com azoto

Christine Love

Edwin Martin Case no laboratório de JBS Haldane

Durante a Segunda Guerra Mundial, investigadores britânicos efetuaram testes em si próprios para avaliar o funcionamento do cérebro dos tripulantes dos submarinos britânicos a profundidades extremas.

Durante a violência extrema e os bombardeamentos da Segunda Guerra Mundial, a Inglaterra apelou aos seus cidadãos para que fizessem o que pudessem e soubessem para ajudar.

Isso significava racionamento de alimentos para todos e longas horas de trabalho nas fábricas para alguns.

No entanto, para um pequeno grupo de cientistas, em Londres, isso significava pôr as suas vidas em risco enquanto faziam contas — muitas, muitas contas, e muitas vezes completamente embriagados bêbados.

Este grupo de investigadores, conta a Smithsonian, ajudou a tornar possível o desembarque dos Aliados no Dia D — o dia do desembarque na Normandia, que há 80 anos deu início ao fim da II Guerra.

O pequeno grupo de cientistas, liderado por John Burdon Sanderson Haldane, conhecido como JBS ou “o Professor”, conduziu durante meses (em si próprios) um conjunto de experiências críticas e arriscadas para ajudar o esforço de guerra dos Aliados.

A audaciosa equipa realizou os seus testes no meio do caos do Blitz em Londres, trabalhando frequentemente num laboratório da University College London a coberto de cortinas opacas, para escapar aos bombardeiros nazis e às autoridades universitárias que tentavam evacuar a cidade.

A necessidade destas experiências surgiu quando os submarinos aliados começaram a sofrer baixas a um ritmo alarmante durante acidentes de treino no verão de 1939, evidenciando uma lacuna significativa na compreensão dos impactos fisiológicos das pressões do mar profundo nos submarinistas.

John Haldane e a sua equipa, que incluía a sua companheira de vida e de trabalho Helen Spurway e o investigador Edwin Martin Case, realizaram uma série experiências  para explorar estes efeitos, concentrando-se particularmente no fenómeno da narcose por azoto — condição em que o azoto a alta pressão atua como um narcótico, prejudicando as capacidades mentais e físicas.

As experiências da equipa envolviam respirar ar com azoto, tipicamente com uma concentração de 78%, numa câmara hiperbárica, para simular as pressões sentidas nas profundezas da água.

Estes testes foram extenuantes e perigosos, tendo os investigadores atingido profundidades simuladas em que os efeitos fisiológicos eram equivalentes ao consumo de várias bebidas alcoólicas num curto espaço de tempo.

As experiências tiveram grande impacto físico nos investigadores, com sintomas que iam desde fortes dores de cabeça até à experiência bizarra de ouvir um som de “gritos” de uma cavidade no dente de Haldane, provocado pela fuga de gás pressurizado – um fenómeno que ele referiu com humor como um novo tipo de doença de descompressão.

Apesar destes desafios, a investigação levada a cabo pela equipa de Haldane forneceu dados valiosos sobre a narcose por azoto, confirmando o impacto debilitante do azoto em profundidade e influenciando a conceção e o funcionamento dos submarinos.

As suas descobertas sublinharam os perigos de subestimar as deficiências cognitivas enfrentadas pelos submarinistas que operam nestas condições, levando a alterações significativas nos protocolos militares e na conceção dos submarinos.

Estas auto-experiências faziam parte de uma tradição mais alargada de investigação científica em que os investigadores se utilizavam a si próprios como sujeitos de teste, uma prática que foi de certa forma normalizada em meados do século XX, apesar dos seus riscos.

Esta abordagem foi motivada não só pela urgência da guerra, mas também pela falta de diretrizes éticas formais na investigação científica da altura, o que fez com que a auto-experimentação fosse frequentemente o método mais imediato para obter dados cruciais.

Ao longo da guerra, o voluntariado na investigação científica registou um aumento significativo, com investigadoresda Grã-Bretanha e dos Estados Unidos a participarem em vários estudos para ajudar os esforços militares e melhorar os protocolos de segurança e saúde tanto para as tropas como para os civis.

Estes estudos iam desde o teste de tratamentos para a sarna, uma afeção comum entre as tropas, até ao estudo dos efeitos da fome e dos métodos mais seguros para reintroduzir alimentos naqueles que estavam à beira da morte.

Os esforços corajosos de Haldane, Helen Spurway e Edwin Martin Case exemplificam as medidas extremas que os cientistas estavam dispostos a tomar para contribuir para o esforço de guerra.

Esta mistura de coragem, curiosidade e rigor ajudou a preparar o caminho para as práticas modernas de investigação militar e fisiológica, realçando o papel fundamental da ciência em tempos de crise global.

E, naturalmente, ajudou os Aliados a vencer libertar a Europa do domínio da Alemanha nazi e a vencer a II Guerra Mundia.

ZAP //

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