Em termos médicos, a IA está a ajudar-nos em quase tudo, desde a identificação de ritmos cardíacos anormais antes de acontecerem até à deteção de cancro da pele. Mas será que precisamos mesmo que ela se envolva com o nosso genoma? A empresa de design de proteínas Profluent acredita que sim.
Fundada em 2022 em Berkeley, Califórnia, a Profluent tem vindo a explorar formas de utilizar a IA para estudar e gerar novas proteínas que não se encontram na natureza.
Esta semana, a equipa anunciou um grande sucesso com o lançamento de uma proteína desenvolvida com IA, denominada OpenCRISPR-1.
A proteína destina-se a funcionar no sistema de edição de genes CRISPR, um processo em que uma proteína corta um pedaço de ADN e repara ou substitui um gene.
O CRISPR tem sido utilizado ativamente nos últimos 15 anos, tendo os seus criadores recebido o prémio Nobel da Química em 2020.
A técnica tem-se revelado promissora como ferramenta biomédica que pode fazer tudo, desde restaurar a visão ao combate a doenças raras; como ferramenta agrícola que pode melhorar o teor de vitamina D dos tomates e reduzir o tempo de floração das árvores de décadas para meses; e muito mais.
Ao longo dos anos, o CRISPR tem-se apoiado em proteínas encontradas na natureza para realizar o seu trabalho de corte de ADN. Em particular, utiliza a proteína Cas9, originalmente derivada de bactérias, para abrir cadeias de ADN e alterar sequências de genes.
Pensando que a IA poderia melhorar o sistema CRISPR da mesma forma que está a começar a melhorar em várias áreas, a equipa da Profluent criou uma base de dados de 5,1 milhões de proteínas semelhantes à Cas9 que, segundo a empresa, superou qualquer base de dados anterior em 2,7 vezes no total e em 4,1 vezes para as proteínas Cas9 especificamente.
Um modelo de linguagem de IA foi então treinado na base de dados e foi-lhe pedido que criasse potenciais proteínas que pudessem ser utilizadas em vez da Cas9 no trabalho CRISPR.
Depois de a equipa ter orientado o sistema na redução dos resultados de 4 milhões de sequências, acabou por chegar à OpenCRISPR-1, conta o New Atlas.
A nova proteína teve um desempenho tão bom como a Cas9 nos testes, mas com uma diferença notável: reduziu o impacto nos sítios fora do alvo em 95%. Isto significa que era muito mais precisa, actuando praticamente apenas onde era necessário e não causando quaisquer danos residuais na cadeia de ADN.
Can AI rewrite our human genome? ⌨️🧬
Today, we announce the successful editing of DNA in human cells with gene editors fully designed with AI. Not only that, we’ve decided to freely release the molecules under the @ProfluentBio OpenCRISPR initiative.
Lots to unpack👇 pic.twitter.com/NWowAlDLMv
— Ali Madani (@thisismadani) April 22, 2024
A descoberta foi apresentada num artigo que está disponível em pré-publicação no bioRxiv.
Numa atitude invulgar, a Profluent cedeu os direitos da sua proteína à comunidade científica — o que deu origem à expressão “aberta” no nome da OpenCRISPR-1.
“O anúncio de hoje é um momento decisivo e o início do que esperamos que seja um processo iterativo à medida que embarcamos nesta próxima geração de construção de medicamentos genéticos”, afirmou Peter Cameron, vice-presidente e diretor de edição de genes da Profluent, em comunicado da empresa publicado no Business Wire.
“Encorajamos a comunidade de edição de genes a testar o OpenCRISPR-1. Se houver características particulares que possam ser melhoradas para uma aplicação específica, gostaríamos de saber e podemos colaborar para otimizar essas propriedades.”
15 anos após ter sido apresentada ao mundo, o enorme poder e potencial da CRISPR continua a gerar controvérsia. Mas neste caso, a ideia de que usar a técnica revolucionária de edição de genes para intervir no nosso genoma pode criar monstros à moda do Doutor Frankenstein poder ser um pouco exagerada.