A ONG Médicos do Mundo apresentou esta terça-feira uma oposição contra a patente do medicamento Sofosbuvir, para a Hepatite C, concedida pelo Instituto Europeu de Patentes, considerando que o laboratório pratica “preços exorbitantes” e que deve ser aberta a concorrência.
Em comunicado, a organização não governamental (ONG) anuncia que apresentou este recurso legal, através do qual a validade de uma patente pode ser contestada, que se for bem sucedido “irá incentivar a concorrência de versões genéricas do Sofosbuvir”, um anti-viral usado no tratamento da Hepatite C e que tem uma taxa de cura superior a 90%.
“A oposição a uma patente é um recurso que já foi utilizado pela sociedade civil na Índia e Brasil para conseguir a revogação de uma patente concedida de forma indevida e a disponibilização de versões genéricas”, explica Olivier Maguet, do conselho da MdM para a hepatite C, acrescentando que estes “recursos levaram a uma descida considerável no custo dos tratamentos e ao acesso dos doentes que de outra forma não teriam a oportunidade.”
Esta é a primeira vez na Europa que uma ONG recorre a esta medida para melhorar o acesso dos doentes aos medicamentos.
Há vários meses que a MdM, em conjunto com outras organizações, vem alertando para os problemas colocados pelo custo dos novos tratamentos para a hepatite C e do Sofosbuvir em particular.
“O laboratório farmacêutico Gilead detém o monopólio do Sofosbuvir e está a comercializar este tratamento de 12 semanas a um preço exorbitante – 41 mil euros em França e 44 mil euros no Reino Unido -, impedindo assim que muitas pessoas tenham acesso ao medicamento”, sublinha a MdM.
Em Portugal, o Ministério da Saúde chegou, no final da semana passado, a acordo com o laboratório para fornecer o tratamento gratuitamente aos doentes, mas os custos para o SNS não foram revelados, embora a Gilead tenha começado por pedir valores superiores a 43 mil euros por um tratamento de 12 semanas.
A MdM alega que apesar de a utilização do Sofosbuvir no tratamento da hepatite C representar um enorme avanço terapêutico, a molécula em si, que resulta do trabalho de investigadores públicos e privados, não é suficientemente inovadora para garantir uma patente.
Assim, decidiu apresentar a sua contestação, já que “existe um abuso por parte da Gilead ao impor preços que não são sustentáveis aos sistemas de saúde”.
Se for aceite, o medicamento poderá começar a ser produzido em versões genéricas a um preço de apenas 101 dólares.
“Estamos a defender o acesso universal aos cuidados de saúde: a luta contra a desigualdade na saúde envolve a salvaguarda do sistema de saúde baseado na solidariedade”, explica Jean-François Corty, Diretor de Projetos da MdM França, que acrescenta que “mesmo num país “rico” como a França, com um orçamento anual para medicamentos de 27 mil milhões de euros, é difícil suportar este custo e já estamos a assistir a um racionamento arbitrário que exclui os doentes do tratamento”.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que existam 130 a 150 milhões de doentes crónicos de hepatite C, enquanto na União Europeia poderão estar infetadas entre 7,3 a 8,8 milhões de pessoas.
Segundo a MdM, em Portugal, onde o medicamento deverá ter um custo superior a 42 mil euros – 100 mil euros contabilizando todo o tratamento necessário -, estão registados nos hospitais mais de 13 mil doentes com hepatite C, estimando-se no entanto que o número de infetados seja de cerca de cem mil.
Anualmente a infecção mata cerca de mil pessoas.
/Lusa