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Massacre de Wiriamu foi há 50 anos (e Santos Silva pede perdão em nome de Portugal)

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António Cotrim / Lusa

Augusto Santos Silva

“Hoje é dia de pedir perdão”, diz o presidente da Assembleia da República (AR), Augusto Santos Silva, no dia em que passam 50 anos desde o massacre de Wiriamu, em Moçambique, cometido por tropas portuguesas durante a guerra colonial.

É um facto que nos envergonha, mas não deve ser esquecido“, diz Santos Silva a propósito do triste episódio que ocorreu durante a guerra colonial, quando tropas portuguesas irromperam pelas aldeias de Wiriamu, região no norte de Moçambique, disparando contra tudo o que se mexia.

“Matem-nos a todos”, seriam as ordens dos militares, segundo historiadores que reportam o massacre.

Terão morrido cerca de 400 pessoas, todas civis, neste massacre.

No dia em que passam 50 anos do trágico episódio, “devemos honrar as vítimas e também saudar os capitães de Abril que nos libertaram do regime que o cometeu”, aponta Santos Silva numa publicação no Twitter.

A 16 de Dezembro de 1972, um contingente de militares portugueses e a polícia política portuguesa, então chamada de Direcção Geral de Segurança, perpetraram um massacre num conjunto de aldeias de Wiriamu”, acrescenta o presidente da AR numa mensagem de vídeo que acompanha a sua publicação na rede social.

“Esse massacre foi denunciado meses mais tarde por sacerdotes católicos e essa denúncia contribuiu para o isolamento internacional do regime do Estado Novo português e também para o momento da consciência consciência em Portugal, da necessidade absoluta de acabar com esse regime e acabar com a guerra colonial”, sustenta ainda Santos Silva.

Já antes disso tinham ocorrido “vários massacres nessa zona”, igualmente “denunciados” por padres católicos, como nota o presidente da AR. “Mas o massacre de Wiriamu foi especialmente bárbaro“, acrescenta.

Nenhum militar foi encontrado entre as vítimas, nenhum guerrilheiro foi encontrado entre as vítimas, todas as vítimas eram civis. E estamos a falar na ordem de quase quatro centenas de vítimas mortais deste massacre”, realça também.

Perante estes dados, Santos Silva reforça que “hoje é dia de recordar o massacre, de pedir perdão às suas vítimas e de homenagear aqueles, como o padre [Adrian] Hastings, que denunciaram, e também de homenagear os capitães de Abril“.

Porque, afinal, foram os capitães de Abril que, “com o seu Movimento das Forças Armadas, puseram fim ao regime do Estado Novo, puseram fim à guerra colonial e permitiram que se abrisse um novo caminho nas relações entre Portugal e Moçambique, o caminho que hoje percorremos, o caminho de amizade, de cooperação e de profunda fraternidade entre os dois países e os dois povos”, nota Santos Silva.

Ventura critica declarações de Santos Silva

O líder do Chega, André Ventura, critica a posição de Santos Silva, frisando que “não fica bem a um presidente da AR, em nome de não se sabe bem quem, lançar um anátema sobre as Forças Armadas portuguesas, sobre a história de Portugal, sobretudo a um país que nunca pediu desculpa pelas milhares de vítimas portuguesas que lá deixou enterradas sem qualquer justiça”.

Estas suas afirmações não nos representam, não representam as Forças Armadas portuguesas”, vinca ainda Ventura, aproveitando o debate sobre política sectorial com a ministra da Presidência, que decorre nesta sexta-feira na AR, para abordar o assunto.

“Após a transição” para a independência, “os guerrilheiros moçambicanos mataram mais de três mil portugueses“, por oposição às “400 vítimas que o senhor identifica em Wiriamu”, diz ainda Ventura, salientando que “Moçambique nunca pediu desculpa, as Forças Armadas moçambicanas nunca pediram desculpa”. “Porque raio no mundo é que nós vamos pedir desculpa?”, questiona.

“Porque não devemos pactuar com massacres” e porque “somos humanistas”, aponta Santos Silva na resposta ao líder do Chega em pleno Parlamento.

“E sim, também peço desculpas em nome das Forças Armadas portuguesas que, no dia 25 de Abril de 1974, nos libertaram do regime infame que cometeu esse massacre”, acrescenta o presidente da AR.

“Não há nada na Torre do Tombo sobre Wiriamu”

O massacre de Wiriamu é desconhecido da larga maioria dos portugueses porque não integra os currículos escolares de História.

Mas o historiador, professor e investigador moçambicano Mustafah Dhada debruça-se sobre este episódio nos livros “O Massacre Português de Wiriamu: Moçambique 1972” e “The Wiriyamu Massacre: An Oral History, 1960-1974” (ainda não editado em Portugal).

“É uma tristeza que seja eu, um moçambicano que é agora um americano, e recentemente com nacionalidade portuguesa, a ensinar aos portugueses a verdadeira narrativa do império – ainda que um pedaço pequenino”, dizia o historiador, em Janeiro passado, numa entrevista ao jornal online Setenta e Quatro.

“O currículo escolar tem de ser transformado”, defendia, frisando que também os arquivos históricos de Portugal são omissos quanto a este massacre.

“Trabalho com os arquivos em Portugal e posso dizer que não há nada de fonte primária na Torre do Tombo sobre Wiriamu. Nada. Há somente um mapa que descobri inadvertidamente porque não o classificaram, não perceberam o que era aquele mapa que estava ali encerrado entre papéis”, revelava Mustafah Dhada.

“Hoje Portugal é um país de historiografia asfixiada, que não só nega o passado das mãos sujas, mas também nega que o país seja africano, em vez de europeu”, dizia também na mesma entrevista.

ZAP // Lusa

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2 Comments

  1. Não tenho que me sentir culpado desta bestialidade , entre outras cometidas por Colonialistas e Estado Salazarista que sempre odiei ! ….. Parece o Papa a pedir perdão por toda os crimes cometidos por os Sacerdotes desde a Inquisição aos Dias de hoje !

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