Mercedes decidiu não recorrer das decisões da direção de corrida nas últimas voltas do Grande Prémio do Abu Dhabi, mas são muitos os sinais de que a forma como o título de Max Verstappen foi conquistado ainda não é consensual em Brackley.
Há precisamente uma semana, os olhos dos fãs de automobilismo viraram-se para Abu Dhabi, onde, numa corrida histórica para a categoria, se decidia o campeão da época de 2021 da Fórmula 1. Max Verstappen e Lewis Hamilton chegavam empatados à última ronda, depois de o britânico, numa recuperação fulminante, ter encurtado a distância para o neerlandês que ao longo de várias liderou as tabelas.
O receio de muitos era que os dois candidatos ao título acabassem afastados da prova por se envolverem em choques e que, assim, o os fãs ficassem privados de uma luta aguerrida e de um campeão inequívoco, decidido em pista. O acidente acabou por não acontecer (pelo menos entre as duas principais estrelas), mas nem assim a decisão do título deixou de estar envolta em polémica.
Um acidente de Nicholas Latifi à volta 53 de 58 acabaria por levar a direção de corrida a decretar a entrada de Safety Car, oportunidade que Verstappen aproveitou para substituir, os seus pneus duros por macios, algo que Hamilton não podia fazer sob pena de perder posição para o rival da Red Bull.
Nas voltas que se seguiram, e através da transmissão televisiva, assistiu-se a uma notória confusão entre os membros da direção da prova – sempre com as voltas da corrida a contar – relativamente à possibilidade de os carros que já tinham uma volta de atraso poderem avançar o Safety Car. Tal acabou por acontecer, deixando Hamilton e Verstappen juntos para a última volta da corrida. O resto, é história.
No entanto, a decisão não foi bem recebida pela Mercedes, com a construtora germânica a entregar logo de seguida dois protestos, um deles a contestar o resultado final da prova – e, consequentemente, do campeonato. A noite já ia longa no emirado, com os representantes de Mercedes e Red Bull a serem ouvidos pelos stewarts para darem a sua versão dos sucedidos.
Ambos os protestos foram negados, com o título de Max Verstappen – que durante esse período esteve suspenso – a ser reconfirmado. Ainda assim, pairava no ar a ideia de que a Mercedes ainda não tinha jogado todos os seus trunfos e que poderia dar entrada com um processo no Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), uma ação que a equipa confirmou que tinha intenção de cumprir e para a qual dispunha de um prazo de 72 horas após a última decisão dos dois protestos ter sido tomada e conhecida.
Após dias de incerteza – marcados também pela divulgação das comunicações rádio entre Hamilton e o seu engenheiro, nas quais o piloto britânico afirmava que o final da corrida havia sido “manipulado –, a Mercedes acabaria por anunciar que não iria levar o caso para tribunal, remetendo a sua necessidade de respostas para uma comissão que a Federação Internacional do Automobilismo (FIA) decidiu criar para averiguar o sucedido nas últimas voltas do último Grande Prémio do ano, assim como formas de prevenir situações semelhantes no futuro.
Apesar da aparente bandeira branca, os ânimos não acalmaram, já que tanto Toto Wolff (diretor da equipa Mercedes) como Lewis Hamilton decidiram não marcar presença na gala anual da FIA, na qual são entregues os troféus aos três primeiros classificados do campeonato de pilotos e à equipa vencedora do mundial de construtores. Mais, a equipa não enviou nenhum dos seus carros (da Fórmula 1 e da Fórmula E, onde também se sagrou campeã) para Zurique, onde a celebração decorreu e onde é tradição os monolugares vencedores serem expostos.
Até ao momento ainda não se sabe quais as consequências que estes atos podem ter, mas, tal como está previsto no código da FIA, a não comparência à cerimónia pode ter sancionada, nomeadamente a nível desportivo. Ou seja, a escolha do britânico (e respetiva equipa) pode vir a ser penalizado em pista por algo que ocorreu longe dela. No regulamento é referida a possibilidade de aplicação de uma “multa” ou de uma “reprimenda”, algo que seria inconsequente não fosse Hamilton já ter duas – as reprimendas têm prazo de um ano –, pelo que a terceira (o limite) pode levar a uma penalização na grelha de partida na primeira corrida do campeonato do próximo ano, agendada para 20 de março no Bahrain.
Uma penalização destas numa fase não inicial da competição pode não ser significativa – ou sim, veja-se a época que acabou no último fim de semana. Mas nos bastidores da Fórmula 1 adensam-se os rumores de que os acontecimentos do Abu Dhabi podem ter abalado profundamente o sete vezes campeão do mundo – que certamente pensará que foi injustiçado na luta pelo inédito oitavo título mundial na categoria – ao ponto de este estar a considerar abandonar o desporto.
Para já, tudo não passa de rumores, que não foram nem confirmados nem desmentidos por Toto Wolff. Factual são, porventura, os dois anos de contrato que Hamilton ainda tem com a construtora germânica e que serão certamente duas novas oportunidades de cunhar o seu nome no olimpo do automobilismo, superando Michael Schumacher como piloto mais bem-sucedido na história da Fórmula 1.
O seu rival este ano e campeão do mundo – agora – em título não acredita que tal venha a acontecer, defendendo até que não existem motivos para a hipótese de abandono estar a ser considerada. Há ainda quem defenda que este (assim como a opção de não avançar para o TAD) será um trunfo que a Mercedes poderá usar, caso dele precise, na próxima época. Com os monolugares da próxima época ainda em fase de desenvolvimento, o tema promete continuar marcar a off-season da Fórmula 1 até que a ação regresse às pistas.
E assim se trama quem merecia o 8º título. Vergonha.
O mundo anda com as noções de ética e valores completamente ao contrário.
Foi muito, mas muito mau.