A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) abriu um processo de inquérito a José Maria Pires, jurista do centro de estudos fiscais e antigo alto dirigente do Fisco que integra o Movimento Cultural da Terra de Miranda.
A situação foi denunciada esta quarta-feira pelo presidente do PSD, Rui Rio, no Parlamento. De acordo com o jornal Público, em causa está José Maria Pires, trabalhador da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), natural de Miranda do Douro e membro do Movimento Cultural da Terra de Miranda.
Para o líder do PSD, o processo contra um funcionário “é inadmissível e pidesco!”. Já o primeiro-ministro afirmou que desconhece o caso e que “ficaria muito surpreendido” da existência de um inquérito por delito de opinião”. “Se aconteceu é absolutamente inaceitável seja nas Finanças seja noutro Ministério”, afirmou.
O grupo, recorde-se, alertou publicamente para as possíveis implicações fiscais do processo de venda de seis barragens no Douro pela EDP ao consórcio francês Engie por 2,2 mil milhões de euros.
Este trabalhador terá elaborado uma análise jurídica-tributária sobre a transmissão das barragens, o que levou o Fisco a decidir, em janeiro, instaurar um inquérito para avaliar “a eventual verificação de quaisquer circunstâncias que o dispensassem do dever legal de exclusividade a que, por princípio, estão obrigados todos os trabalhadores da AT.”
A AT não disse explicitamente ao Público de quem partiu a iniciativa de desencadear a averiguação, mas refere que os trabalhadores “estão sujeitos a um código de conduta, adotado em 23 de julho de 2015, que clarifica os especiais deveres a que estão vinculados” e acrescenta que “os artigos 7.º do Estatuto do Pessoal Dirigente e 188.º da Lei de Trabalho em Funções Públicas preveem que a competência em matéria disciplinar seja exercida pelo dirigente máximo do serviço, neste caso a directora-geral [Helena Borges], sob pena de cessação do cargo dirigente se não cumprir o dever de agir disciplinarmente”.
Assim, segundo também confirmou o Observador, em causa pode estar o não cumprimento do dever de exclusividade aplicável aos trabalhadores do fisco, bem como dos deveres do código de conduta
Em outubro, o movimento fez chegar ao Parlamento uma nota jurídica sobre a “ponderação do interesse das populações do Douro Internacional na transmissão das barragens”, referindo que essa análise fora realizada por José Maria Pires, enquanto “integrante” do movimento e “especialista em direito fiscal”.
Contactado pelo Público, o Ministério das Finanças esclareceu ser alheio ao inquérito, garantindo que “não tinha, nem tinha de ter, conhecimento do processo” instaurado.
A EDP concluiu, em 17 de dezembro, a venda por 2,2 mil milhões de seis barragens na bacia hidrográfica do Douro a um consórcio de investidores formados pela Engie, Crédit Agricole Assurances e Mirova.
O negócio tem levado os partidos da oposição a lançar várias dúvidas, nomeadamente sobre o facto de a EDP não ter pagado o Imposto do Selo no valor de 110 milhões de euros.
O PSD e o Bloco de Esquerda acusaram o Governo de “criar um conjunto de fantasias” que levaram o processo para uma “engenharia fiscal” ou “planeamento fiscal (agressivo) para evitar os impostos nesta transação”.