Os primeiros ventiladores made in Portugal estão a ser testados em porcos na Escola de Medicina do Minho e no Centro Clínico Académico de Braga e podem começar a ser experimentados em pessoas ainda durante este mês. O próximo passo é produzi-los em massa para as necessidades nacionais, mas também para exportar, segundo prevê António Costa.
O ventilador pulmonar Atena, criado no CEiiA – Centro de Engenharia e Desenvolvimento de Produto, em Matosinhos, numa parceria com instituições universitárias, empresas e médicos de hospitais públicos e privados, tem estado a ser testado na Escola de Medicina do Minho e no Centro Clínico Académico de Braga.
Porcos com lesões pulmonares que simulam uma pneumonia grave, como a que ocorre na covid-19, estão a ser as cobaias, fruto da sua anatomia e fisiologia semelhantes à dos humanos.
Nesta sexta-feira, será solicitada a autorização ao Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde para passar à fase dos ensaios clínicos com pessoas, como avança o Público, notando que se espera que a aprovação chegue ainda no decurso de Maio.
Para já, estão construídos 100 ventiladores, mas pretende-se chegar aos 500 ainda este ano.
“O objectivo é libertar esta tecnologia e este know how para a indústria nacional produzir em larga escala, para as necessidades nacionais mas também para as necessidades internacionais”, revela António Costa na visita desta sexta-feira ao Ceiia.
“Os ventiladores continuam a ser uma enorme carência em todo o mundo, seja na Europa, seja noutros continentes”, sustenta o primeiro-ministro, frisando que “é fundamental obter agora a certificação do respeito pelas normas comunitárias para que [os ventiladores made in Portugal] possam ser utilizados e exportados”.
Costa defende que o país não pode depender de um mercado “completamente desregulado e selvagem” e que, depois desta pandemia, tem de sair com a lição “muito bem aprendida” no sentido de reforçar as capacidades de produção. “Temos engenharia para isso, temos indústria para isso, temos competências profissionais para isso e, portanto, podemos ser autónomos”, sublinha.
O primeiro-ministro salienta que o país não pode “lutar quase de ombro a ombro fisicamente” para comprar materiais de protecção individual como as máscaras, mas também maquinaria, como os ventiladores.
“Não podemos estar tão dependentes de fornecimentos externos como temos estado até agora. Coisas tão banais como máscaras, não podem vir de países que estão a milhares de quilómetros de distância”, defende.
Para António Costa, o facto de o CEiiA ter conseguido, num prazo de 45 dias, fabricar e produzir 100 ventiladores Atena mostra, mais uma vez, que “em todos os momentos de excepção, os portugueses são completamente excepcionais“.
No entanto, falta o “passo seguinte” que é “continuar a ser excepcionais na normalidade”, diz.
“É assim que vamos conseguir dar a volta e voltar a lançar a economia, não só com base naquilo que já fazíamos bem, mas agora também naquilo que podemos fazer mais e melhor com o que aprendemos nestes duros dois meses, de luta pela sobrevivência”, mas que nos deixaram “mais fortes do que aquilo que estávamos quando tudo isto começou”, conclui.
“Nunca pensámos que teria este tipo de sofisticação”
O projecto de desenvolvimento destes ventiladores made in Portugal conseguiu angariar 1,85 milhões de euros em doações, através de uma campanha de crowdfunding lançada na RTP1 e do mecenato de EDP, REN, Fundação Calouste Gulbenkian, Fundação “La Caixa”/BPI, família Amorim e Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD). Houve outra família que contribuiu, mas que pediu o anonimato.
Estes 100 ventiladores já fabricados vão ser oferecidos ao Serviço Nacional de Saúde, logo que se comprove a sua eficácia.
Até agora, nos ensaios com porcos, “o ventilador portou-se adequadamente”, explica ao Público o médico anestesista José Miguel Pêgo, da Escola de Medicina do Minho e do Centro Clínico Académico de Braga e que tem coordenado os testes ao Atena. “Conseguiram-se regular todos os parâmetros ventilatórios”, diz.
“Há aspectos que precisam de ser afinados, mas nada que tenha posto em causa a integridade dos animais. Um dos problemas da ventilação é que a própria ventilação pode provocar lesões no pulmão”, esclarece ainda o médico.
“Quando pensámos desenvolver um ventilador, nunca pensámos que teria este tipo de sofisticação. Com este ventilador, conseguimos pegar num doente desde o início da ventilação até deixar de precisar de ventilação”, diz também José Miguel Pêgo.
“É paradigmático: em 40 dias, desde 8 de Março, conseguiu-se desenhar, desenvolver e montar 100 ventiladores. Termos alcançado esta meta neste tempo é um feito do ponto de vista de engenharia a nível nacional e sobretudo europeu“, aponta, por seu turno, o professor da Universidade do Minho António Cunha, administrador do CEiiA, também em declarações ao Público.
O dinheiro angariado vai servir para pagar os custos que o projecto implicou até agora. Depois também foi aprovado um empréstimo de 2,6 milhões de euros da Agência Nacional de Inovação (ANI).
Este investimento vai ajudar a produzir um total de 500 ventiladores até final de Junho e passar, depois disso, à fase da industrialização.
ZAP // Lusa
Boa iniciativa em direcção à autonomia tecnológica que se deseja.