A juíza conselheira Maria Clara Sottomayor renunciou na quinta-feira às suas funções no Tribunal Constitucional, refere uma nota publicada no site deste tribunal superior.
“Em 25 de julho de 2019, a juíza conselheira Maria Clara Pereira de Sousa de Santiago Sottomayor apresentou a renúncia às suas funções de juíza do Tribunal Constitucional”, lê-se na nota que não indica as razões para a renúncia.
Maria Clara Sottomayor foi eleita pela Assembleia da República, em 20 de julho de 2016, juíza do Tribunal Constitucional. O nome da juíza foi proposto pelo PS após consulta ao Bloco de Esquerda.
A decisão de sair foi tomada de quarta para quinta feira, mas já há algum tempo que a juíza Clara Sottomayor enfrentava problemas no TC, de acordo com o Expresso. O chumbo da lei dos metadados, que permite atualmente aos serviços de informações ter acesso a dados de comunicações como o tráfego e a localização celular, foi a gota de água.
Enquanto relatora, Clara Sottomayor ter-se-á recusado a fazer alterações na fundamentação do acórdão, o que causou grandes discussões com outros juízes. A juíza defendia que o texto, de onde sairão as pistas para o Governo e o legislador puderem elaborar a futura legislação, não deveria ser alterado do que tinha sido discutido e votado pelo plenário. As alterações ao documento foram comunicadas à juíza fora do plenário.
A lei dos metadados será mesmo chumbada. É também a segunda vez, depois do chumbo da lei da Procriação Medicamente Assistida, que o tribunal contraria o Presidente da República que ainda não enviou ao TC nenhum diploma. Quando promulgou a lei, Marcelo Rebelo de Sousa justificou a decisão com um “consenso jurídico”.
A Procuradoria-Geral da República e a Comissão de Fiscalização do Sistema de Informações manifestaram-se a favor da lei, porém a Comissão Nacional de Proteção de Dados e a Ordem dos Advogados consideraram que viola a Constituição. PCP, PEV e BE acabaram por enviar o diploma para o Constitucional.
Os juízes alinharam pelo memorando proposto pelo presidente do Constitucional, Manuel Costa Andrade. O plenário dividiu-se entre vencidos e vencedores, de onde foi escolhido um relator, e os juízes preparam agora as suas declarações de voto. Os partidos esperam uma decisão para o fim do mês de maio, mas a decisão tem vindo a ser adiada.
Em causa está a violação do artigo 34 da Constituição da República Portuguesa que diz respeito à inviolabilidade do domicílio e da correspondência. Já em 2015, o TC tinha chumbado uma lei semelhante do Governo de Passos Coelho, por considerar que a ingerência nas telecomunicações dos cidadãos só poderá ocorrer “no âmbito de um processo criminal”. Como as secretas não realizam investigação criminal, o acesso aos dados de tráfego das comunicações estava vedado.
Maria Clara Sottomayor nasceu em 1966, em Braga. Licenciada em Direito, mestre em Ciências Jurídico-Civilísticas e doutorada em Direito Civil, foi docente na Escola de Direito do Porto da Universidade Católica. “A partir de 26 de setembro de 2012 começou a exercer funções judiciárias no Supremo Tribunal de Justiça”, refere o site do Tribunal Constitucional
A magistrada publicou várias monografias e mais de 40 artigos em revistas jurídicas e capítulos de livros. Maria Clara Sottomayor participou, também, “em projetos de investigação sobre violência doméstica e licenças de parentalidade, e proferiu numerosas conferências em temas de direito civil e sobre responsabilidades parentais, adoção, violência doméstica e abuso sexual de crianças”.
A juíza conselheira é associada da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas desde 2002, da qual é hoje sócia honorária. Foi cofundadora da Associação Projeto Criar e tem colaborado em projetos e seminários da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), segundo a mesma fonte.
ZAP // Lusa