Numa altura em que o risco de incêndio está mais elevado, um forte contingente teve ordens da Proteção Civil para participar nas filmagens de “Flor de sal”, uma novela da SIC.
Segundo o Jornal de Notícias, participaram todas as corporações de bombeiros de Leiria, o INEM, os militares do Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro, os “canarinhos” da Força Especial de Bombeiros e o SIRESP. O objetivo foi recriar os incêndios de outubro de 2017, em que morreram 49 pessoas e que provocaram a destruição quase total do Pinhal de Leiria.
O matutino conta que as filmagens incluíram cenários da fuga em pânico de milhares de banhistas das praias da região e a instalação de uma cópia do posto de comando no local exato onde esteve o verdadeiro há dois anos.
Carlos Guerra, responsável pelo Comando Distrital de Operações de Socorro de Leiria, descartou responsabilidade direta, garantindo que houve autorizações do comando nacional. Até ao fecho da edição, o JN não conseguiu obter esclarecimentos da ANEPC.
Em comunicado, a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil garante que a maioria das forças disponibilizadas correspondia a “meios de apoio e não de combate direto”, não tendo sido “retirados dos dispositivos de resposta operacional” pertencendo a “meios de reserva”.
“Em nenhum momento esteve em causa o socorro à população“, afirma, tendo sido acordada com a SP Televisão a desmobilização dos operacionais presentes “em caso de acionamento de algum tipo de alerta preventivo, ou em caso de ocorrência real”.
Pªara justificar a colaboração com a SP Televisão, a ANEPC sublinha o “interesse informativo, da construção de mensagens de informação pública, que, no conjunto, poderão trazer um ganho expressivo no que respeita à sensibilização do público em geral para a matéria dos incêndios florestais”.
“Uma vergonha”
Ao Observador, Jaime Marta Soares, presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, diz que “a participação está completamente fora de qualquer contexto daquilo que são as funções dos bombeiros e do INEM. É no mínimo estranho, desapropriado e desaconselhável”.
O “caminho errado” da participação da ANEPC na novela “Flor de Sal” representa para o presidente da Liga dos Bombeiros o reflexo da “anarquia” e “falta de ética” que “começa a borbulhar” dentro da organização. O responsável diz que só terá sido informado do processo pela comunicação social.
“É estragar e desaproveitar o tempo dos bombeiros que devia ser utilizado para corrigir erros, estudar o que aconteceu em 2017 cientificamente, simular o teatro de operações e melhorar o trabalho futuro”, critica. “É de uma incompetência e de uma falta de rigor permitir isto.”
Marta Soares pede ainda a responsabilização de quem decidiu a favor da participação. “A Proteção Civil que se retrate. O presidente da ANEPC que se retrate. A estrutura operacional [da ANEPC] que se retrate. Porque o que eles fizeram é uma vergonha.”