Dois indivíduos foram queimados vivos no México depois de uma mensagem que os acusava de raptarem e sequestrarem crianças. Mas tudo não passou de uma mensagem falsa.
No dia 29 de agosto, Maura Cordero, dona de uma loja de artesanato na pequena cidade de Acatlán, no México, olhou para a janela e não quis acreditar no que estava a ver. Cerca de uma centena de pessoas concentrava-se em frente à esquadra da polícia, uma multidão que não via desde a última festa de Natal.
Dentro da esquadra encontravam-se Ricardo Flores, de 21 anos, e o tio Alberto, de 43 anos, detidos pela autoridades por “perturbar a paz”, depois de terem sido abordados por moradores locais em fúria que os acusavam de terem cometido um crime muito grave, depois de terem recebido uma mensagem no WhatsApp.
“Por favor, estejam atentos porque uma praga de sequestradores de crianças entrou no país. Parece que esses criminosos estão envolvidos no tráfico de órgãos… Nos últimos dias, crianças de quatro, oito e 14 anos desapareceram e algumas delas foram encontradas mortas com sinais de que os seus órgãos foram removidos. Os seus abdómenes foram cortados, abertos e estavam vazios”, lia-se na mensagem.
De acordo com a BBC, Maura Cordero ficou perplexa quando viu uma série de telemóveis levantados a filmar e a fotografar o momento em que Ricardo e Alberto foram queimados vivos devido às acusações que estavam a circular no WhatsApp.
“A multidão tinha um único objetivo. O portão de entrada da esquadra foi aberto e Ricardo e Alberto Flores foram arrastados para fora. Enquanto as pessoas mantinham os seus telefones no ar para filmar, os homens foram empurrados para o chão e depois para uns degraus, onde foram espancados violentamente. A gasolina que tinha sido levada anteriormente para ali foi derramada por cima deles“, contou a lojista.
Segundo a TVI24, Ricardo Flores cresceu nas proximidades de Acatlán, mas mudou-se para Xalapa, 250 quilómetros para nordeste, para estudar Direito. O tio, agricultor, morou vários anos numa pequena comunidade de Acatlán. Naquele dia, os dois homens foram ao centro da cidade para comprar material de construção para concluir a obra de um poço de água.
Morte do filho em livestream
No mesmo dia em que o filho foi queimado vivo, Maria, mãe de Ricardo, recebeu várias mensagens no Facebook a avisar que o filho tinha sido preso, suspeito de sequestrar crianças. Após as mensagens, Maria recebeu também um link de acesso para a transmissão ao vivo no Facebook. Quando Maria abriu o vídeo, viu uma multidão a espancar o filho e o cunhado.
Três meses passados desde a tragédia, a mãe de Ricardo Flores não consegue entender como é que uma multidão foi arrastada pela mentira. “Porque é que não confirmaram? Nenhuma criança foi sequestrada, nem ninguém apresentou uma queixa formal. Foi uma notícia falsa”, disse à BBC.
Quatro pessoas foram acusadas deste assassinato e outras cinco por incentivar ao crime. Entre elas Francisco Martinez, por ter transmitido o assassinato em livestream; Petronilo Castelan, por ter angariado dinheiro para comprar a gasolina que haveria de queimar os homens; e um homem identificado como Manuel por ter tocado os sinos no telhado da câmara municipal para alertar os moradores de que a polícia planeava libertar Ricardo e Alberto.
Os outros dois supostos instigadores e os quatro suspeitos acusados de assassinato encontram-se em fuga.
Lindo!..
Na excelente série da BBC “Black Mirror” (série que aposta em enredos ficcionais mas totalmente plausíveis de acontecer num futuro mais ou menos próximo) há um episódio que retrata uma situação algo parecida com esta. O advento das redes sociais, a “sobrecarga” de informação, seja falsa ou verdadeira, e o acesso fácil e rápido á “rede” por parte de pessoas que, infelizmente, não conseguem avaliar de forma critica essa informação e tomam tudo por verdades absolutas tem sem duvida o efeito de potenciar desgraças destas.