O campo magnético da Terra está num estado de “enfraquecimento dramático” que pode levar à inversão dos pólos, com consequências imprevisíveis para a humanidade. Esta é a conclusão de um novo estudo que detectou sinais deste possível cenário em cabanas queimadas em África há mil anos.
A inversão dos pólos magnéticos da Terra tem sido apontada como muito provável por vários cientistas. Ainda no passado mês de Fevereiro, investigadores da Universidade de Leeds alertaram que os pólos magnéticos da Terra podem inverter-se a qualquer momento.
A ideia é reforçada por uma nova pesquisa publicada a 15 de fevereiro no jornal científico Geophysical Review Letters, e que foi conduzida por cientistas da Universidade de Rochester, em Nova Iorque, nos EUA.
Estes investigadores detectaram uma anomalia na fronteira entre o núcleo e o manto da Terra, debaixo de África, que está a enfraquecer o campo magnético do planeta. A pesquisa fala num “enfraquecimento dramático”, segundo o Science Alert, considerando que pode ser um sinal de que o planeta está a preparar-se para virar os pólos magnéticos.
A última inversão completa dos pólos aconteceu há 780 mil anos. Há cerca de 40 mil anos, o fenómeno esteve perto de ocorrer de novo.
Os investigadores acreditam que a “culpa” para algumas das inversões já ocorridas, ao longo de milhares de anos, pode ter sido da chamada Anomalia do Atlântico Sul, situada na região que se estende do Chile até ao Zimbabué.
Uma inversão completa do planeta
A investigação focou-se precisamente nesta Anomalia, concluindo que o enfraquecimento do campo magnético se deve a um grande reservatório de rochas densas situado “logo acima da fronteira entre o líquido quente do núcleo externo e o manto mais rígido e frio” da Terra, explicam os cientistas em comunicado.
Aquele reservatório pode estar a “perturbar o fluxo do ferro e, em última análise, a afectar o campo magnético da Terra”, acrescentam.
A Terra é composta por “um núcleo interno sólido, rodeado por um núcleo externo giratório de ferro fundido” que “cria um dínamo que gera o nosso campo magnético, que actua como uma bolha protectora, envolvendo toda a Terra”, explica o The National Geographic.
Esse campo magnético determina “se a agulha de uma bússola aponta para norte ou sul, mas também protege o planeta de radiações nocivas do espaço“, destaca o comunicado.
“Tal como as rochas numa corrente podem criar redemoinhos”, esta região rochosa por baixo de África pode “fazer com que o núcleo externo circule de forma inusual, expelindo linhas do campo magnético do núcleo e diluindo o campo planetário acima dele”, realça o The National Geographic.
“Em circunstâncias raras, as linhas de campo expelidas podem ter criado um campo magnético regional que era o oposto da Terra como um todo, despoletando uma inversão completa do planeta”.
Registo congelado no tempo
As mudanças no campo magnético não são novidade, mas, até agora, não havia dados sobre se estas alterações eram habituais ou não na zona da Anomalia africana, como repara o físico Vincent Hare, um dos investigadores envolvidos na pesquisa.
A pista fundamental para concluir que estas anomalias já terão ocorrido no passado, e portanto influenciado mudanças no campo magnético, veio de minerais encontrados em argilas da Idade do Ferro, resultantes de queimadas rituais.
Há cerca de mil anos, os antigos africanos que viviam no Vale do Rio Limpopo, que banha países dentro da Anomalia, como o Zimbabué, a África do Sul e o Botswana, queimavam as suas cabanas de argila e caixas de grão em rituais para chamar a chuva, em tempos de seca.
“Quando se queima argila a temperaturas muito elevadas, está-se a estabilizar os minerais magnéticos, e quando estes arrefecem das temperaturas altas, bloqueiam um registo do campo magnético da Terra“, nota o geofísico John Tarduno, outro investigador da Universidade de Rochester que participou na investigação.
Esse registo congelado no tempo revela que este enfraquecimento do campo magnético, na região da Anomalia, não é um fenómeno isolado da história, mas que já se verificou nos anos 400-450, 700-750 e 1225-1550.
“Estamos a obter evidências mais fortes de que há algo inusual na fronteira do núcleo-manto sob África que pode vir a ter um importante impacto no campo magnético global”, aponta John Tarduno.
“Sabemos que este comportamento inusual ocorreu, pelo menos um par de vezes antes, nos últimos 160 anos, e é parte de um padrão maior de longo termo”, acrescenta Vincent Hare. O investigador alerta, contudo, que é “demasiado cedo para dizer com certeza se este comportamento vai levar mesmo a uma inversão completa dos pólos”.
Mas mesmo que isso não se verifique a médio-prazo, “a possibilidade de uma deterioração continuada da força do campo magnético é uma preocupação social que merece estudos e monitorização contínuos”, conclui John Tarduno.