Era 1959. Nove viajantes russos que faziam uma caminhada pelos Urais decidiram armar as tendas e passar a noite a poucos passos da chamada Montanha da Morte, a uma curta distância do seu destino. Nunca mais foram vistos vivos.
Os corpos foram encontrados semanas depois, fora das tendas, parcialmente vestidos e distantes uns dos outros. Os investigadores concluíram que três dos nove jovens morreram por espancamento “causados por uma grande força”. Os outros, de hipotermia. Uma das duas raparigas do grupo estava sem a língua. As roupas de alguns deles tinham doses de radiação duas vezes mais altas do que o habitual, de acordo com a investigação.
O incidente da Passagem de Dyatlov — assim chamado em homenagem a Igor Dyatlov, o guia do grupo, que também morreu — é considerado um dos grandes mistérios da história recente da Rússia, conta o El País.
O evento escabroso deu origem a várias teorias durante anos: desde que foram atacados por prisioneiros fugitivos a terem sido mortos por membros da KGB ou por extraterrestres, e também que mataram uns aos outros.
A história resultou em séries, filmes e livros de todo o tipo. Agora, 60 anos depois, as autoridades decidiram tirar o pó dos arquivos do caso e voltar a investigar a morte dos nove excursionistas, todos eles esquiadores, com muitos quilómetros de experiência.
O Ministério Público da região de Sverdlovsk reabriu o caso na sexta-feira passada. Nesta terça-feira, Alexander Kurennoy, porta-voz do órgão, informou que a investigação criminal foi encerrada. “Foi excluída qualquer possibilidade de uma pista criminosa“, disse ele, segundo a agência de notícias russa Tass. Prosseguem, no entanto, as investigações para determinar o que aconteceu com os nove esquiadores.
O caso tinha sido encerrado em junho de 1959. A explicação das autoridades para arquivar a investigação da morte do grupo foi que tinham sido mortos por uma “força elementar irresistível”. Os parentes nunca ficaram satisfeitos e lutaram durante anos para que o caso fosse reaberto.
Kurennoy, o porta-voz do Ministério Público, explicou também que se decidiu reabrir a investigação para evitar algo semelhante, já que o local é um lugar de acesso público. “Se os colegas na região de Sverdlovsk com a ajuda de especialistas não estabelecerem que fenómenos naturais causaram a morte do grupo de Dyatlov, então, uma tragédia semelhante poderia voltar a acontecer“, disse o promotor.
Existem inúmeras lacunas nos arquivos do incidente. Especialmente porque os corpos foram encontrados com várias semanas de diferença e em um estado avançado de decomposição. Mas alguns factos estão claros. As câmaras dos jovens e os diários permitiram reconstrui-los.
No final de janeiro de 1959, um grupo de nove jovens na casa dos 20 anos, estudantes e graduados do Instituto Politécnico dos Urais e o seu guia começou uma excursão para praticar esqui na montanha Kholat Syakhl, conhecida pelos Mansis, os moradores locais, como a Montanha da Morte ou a Montanha dos Mortos.
No meio do caminho, um deles ficou doente e voltou. Os demais montaram acampamento para passar a noite de 1 a 2 de fevereiro a 10 quilómetros do destino.
Quando viram que os jovens não retornaram, as buscas começaram. Equipes de resgate encontraram os cadáveres de cinco deles no final de fevereiro a cerca de 500 metros de uma das barracas, num declive. Os outros quatro foram encontrados em maio.
A maior tenda estava rasgada a partir de dentro. A maioria dos jovens estava vestida parcialmente, alguns sem sapatos, outros com roupas que não eram deles – como se tivessem saído sem preparação e apressadamente no meio da noite.
Os investigadores da antiga União Soviética nunca determinaram a causa da morte. O caminho e os arredores estiveram fechados durante três anos. Além disso, os arquivos do caso só estiveram disponíveis para consulta a partir dos anos 90, quando a antiga URSS entrou em colapso – e estavam incompletos.
Alguns investigadores independentes do caso Dyatlov suspeitaram inicialmente que os excursionistas tinham sido vítimas dos Mansia, o grupo étnico que habitava essas terras, embora o lugar onde foram encontrados estivesse longe da área considerada “sagrada” por esses moradores.
Outros, que foram assassinados por prisioneiros de uma cadeia próxima, mas naqueles dias não houve nenhuma fuga. Anatoli Guschin, um jornalista local, sempre considerou tinham sido vítimas de uma experiência soviética para inventar uma nova arma – daí a radiação encontrada.
Yuri Yudin, o único sobrevivente, disse que vivia com o trauma. Mais tarde, chegou a declarar à imprensa local: “Se eu tivesse a oportunidade de fazer uma pergunta a Deus, seria: ‘O que aconteceu com os meus amigos naquela noite?’”. Yudin morreu em 2013.