A cerca de 3.000 quilómetros sob os nossos pés, há uma misteriosa faixa de material chamada Camada “D”, que há muito fascina os cientistas pela sua textura granulosa.
Fina em algumas partes e espessa noutras, a chamada Camada “D” pode ter-se formado a partir de um antigo oceano de magma que se pensa ter coberto a Terra primitiva há milhares de milhões de anos, sugere um novo estudo.
As reações químicas provocadas por pressões e temperaturas extremas no fundo deste antigo oceano de magma podem ter causado o desnível que hoje vemos na Camada “D”, segundo as simulações da equipa internacional de investigadores.
As suas simulações diferem de modelos anteriores num aspeto fundamental: a água, que estava presente nos antigos oceanos de magma da Terra — e cujo efeito nesses oceanos, à medida que arrefeciam e solidificavam, raramente foi considerado.
O novo estudo, recentemente apresentado num artigo publicado an National Science Review, postula que a água poderia ter-se misturado com minerais para criar peróxido de ferro-magnésio — (Fe,Mg)O2.
Este peróxido atrai o ferro, pelo que a sua presença poderia explicar a formação de camadas ricas em ferro no local onde se situa a Camada “D”, imediatamente acima da fronteira entre o núcleo externo fundido da Terra e o manto circundante.
“A nossa investigação sugere que este oceano de magma hidratado favoreceu a formação de uma fase rica em ferro chamada peróxido de ferro-magnésio“, afirma Qingyang Hu, investigador do Centro de Investigação Avançada em Ciência e Tecnologia de Alta Pressão (HPSTAR), em Pequim, e primeiro autor do artigo.
“De acordo com os nossos cálculos, a sua afinidade com o ferro pode ter levado à acumulação de peróxido de ferro dominante em camadas que vão de vários a dezenas de quilómetros de espessura”, acrescenta o investigador.
À medida que o ferro foi sendo arrastado, estas reações químicas concentraram-se em certas zonas e formou-se a Camada “D”, sugere a equipa no seu artigo. Se esta ideia estiver correta, ajudará a explicar as zonas de velocidade ultra baixa (ULVZs) nas profundezas da Terra — regiões densas de material que abrandam as ondas sísmicas.
Além disso, os investigadores pensam que estas camadas ricas em ferro teriam tido um efeito isolante, mantendo separadas entre si diferentes regiões na base do manto inferior.
“Os nossos resultados sugerem que o peróxido rico em ferro, formado a partir da água antiga do oceano magmático, desempenhou um papel crucial na formação das estruturas heterogéneas da camada D”, afirma Hu.
Este oceano de magma terá sido criado por uma colisão gigantesca com outro planeta, há cerca de 4,5 mil milhões de anos, sugerem os autores do estudo.
Alguns pedaços que sobraram desta colisão foram ejetados e formaram a Lua, enquanto uma mistura inebriante de elementos voláteis (incluindo carbono, nitrogénio, hidrogénio e enxofre) permaneceu no nosso planeta para ajudar a desencadear a vida.
Claro que olhar para trás através de tanto tempo não é fácil, e continua a haver muito debate científico sobre o que está por baixo da superfície da Terra e como lá chegou, realça o Science Alert.
À medida que vamos respondendo melhor a este tipo de questões, vamos também obtendo uma melhor imagem de como era a Terra há muitos milhares de milhões de anos.
“Este modelo está bem alinhado com os resultados de modelos numéricos recentes, sugerindo que a heterogeneidade do manto inferior pode ser uma caraterística de longa duração”, conclui o geofísico Jie Deng, investigador da Universidade de Princeton e corresponding author do estudo.