Culpado pela maldição do Rei Tut pode ser agora arma contra cancro

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A famosa máscara de Tutankhamon

De fungo mortal a promessa medicinal. Nova arma contra a leucemia pode ter estado escondida num túmulo de faraó este tempo todo.

Historicamente associado a morte e doença, um fungo “virou a casaca” e foi transformado num promissor aliado no combate ao cancro.

Em estudo publicado a 23 de junho na Nature Chemical Biology, investigadores da Universidade da Pensilvânia mostram como uma equipa de engenheiros químicos e bioengenheiros isolaram e modificaram moléculas produzidas pelo Aspergillus flavus, fungo conhecido pela sua toxicidade e que está a espalhar-se pelo mundo, para criar compostos com elevada eficácia contra células de leucemia.

O amarelado fungo tem sido historicamente associado a vários episódios misteriosos de morte em escavações arqueológicas: o famoso caso do túmulo de Tutankhamon nos anos 1920 e do túmulo de Casimiro IV na Polónia, nos anos 1970, são exemplos.

A exposição às suas esporas pode provocar infeções pulmonares graves, sobretudo em pessoas com o sistema imunitário mais debilitado. Mas agora, os cientistas conseguiram transformar o “vilão microbiológico” — como o descreve o Phys.org, —  numa nova fonte de esperança para a medicina.

A equipa de investigação concentrou-se na descoberta de um novo tipo de compostos designados por RiPPs (peptídeos sintetizados ribossomalmente e modificados pós-traducionalmente). Embora milhares destes compostos já tenham sido identificados em bactérias, são raros nos fungos, em parte devido a dificuldades em isolá-los e à escassa compreensão dos seus processos de síntese.

O trabalho dos investigadores combinou análises genéticas e metabólicas para identificar e desativar os genes responsáveis pela produção destes compostos no A. flavus, confirmando a sua origem e abrindo caminho para a descoberta de mais RiPPs em fungos.

Os compostos isolados, a que deram o nome de asperigimicinas, apresentam uma estrutura única de anéis interligados. Entre as quatro variantes estudadas, duas demonstraram efeitos potentes contra células de leucemia, mesmo sem modificações adicionais. Uma terceira variante, modificada com um lípido presente na geleia real das abelhas, revelou uma eficácia semelhante à de medicamentos aprovados pela reguladora de medicamentos norte-americana, como a citarabina e a daunorrubicina, usados no tratamento da leucemia.

Os cientistas descobriram ainda que a adição de lípidos ajudava os compostos a penetrar nas células cancerígenas, graças à ação de um gene chamado SLC46A3, responsável por permitir a saída de substâncias dos lisossomas para o interior das células.

Os resultados indicam que as asperigimicinas atuam ao interferir na formação de microtúbulos, estruturas essenciais para a divisão celular, travando assim a multiplicação descontrolada das células cancerígenas. Curiosamente, os compostos mostraram seletividade e não apresentaram efeitos significativos em células de outros tipos de cancro ou em microrganismos não alvo.

Como lembra a autora sénior do artigo,Sherry Gao, “os fungos deram-nos a penicilina”, e os novos resultados mostram que muitos outros medicamentos derivados de produtos naturais ainda têm de ser descobertos.”

Os próximos passos incluem testes em modelos animais e ensaios clínicos em humanos.

ZAP //

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