Todos nós já tivemos amnésia (mas não nos lembramos)

Por que razão não nos lembramos de sermos bebés? A resposta é (ou parece) simples: é que, apesar de não nos lembrarmos, já tivemos amnésia, “amnésia infantil”.

A amnésia infantil, fenómeno definido por Sigmund Freud, no século 19, refere-se à incapacidade comum dos adultos lembrarem-se de eventos de suas vidas ocorridos antes dos 3/4 anos de idade.

Durante a infância, o hipocampo é o lugar onde acontece um grande número de novos crescimentos neuronais, cruciais para o desenvolvimento do cérebro.

No entanto, no processo de gerar novos neurónios, os antigos são “empurrados para o lado” – poder ler-se num artigo do ZAP de 2018.

Devido ao amadurecimento do hipocampo, os humanos não conseguem mesmo reter uma memória antes dos dois anos de idade. Vários estudos apontam que a idade média de uma primeira memória é de pouco mais de três anos.

Como explica a Live Science, quando somos mais pequenos, os nossos cérebros não conseguem agrupar informações nos complexos padrões neurais que conhecemos como “memórias”.

Antes dos 3/4 anos, é normal lembrarmo-nos apenas de factos no momento – como quem são os seus pais -, mas não criar memórias para a vida. Ou seja, temos “memória semântica”, mas não “episódica”.

A memória episódica é relativa aos detalhes de um evento específico e armazenadas no córtex cerebral. Por exemplo, a memória do som é processada nos córtex auditivos nas laterais do cérebro, enquanto a memória visual é gerida pelo córtex visual na parte de trás, sendo o hipocampo que faz a ligação de todas as peças dispersas.

“Se pensarmos no córtex como um canteiro de flores, há flores por toda a parte superior da tua cabeça. O hipocampo, arrumado muito cuidadosamente no meio do teu cérebro, é responsável por juntar todas essas e atá-las num ramo”, explicou, à Live Science, Patricia Bauer, professora de psicologia na Universidade Emory.

A memória é, portanto, o ramo — o padrão neural de ligações entre as partes do cérebro onde uma memória é armazenada.

O objetivo principal nos dois primeiros anos de vida é adquirir conhecimento semântico e, desse modo, a memória episódica acaba por ser ignorada.

Teoria refutável

Há também quem diga (especialistas) que as memórias do tempo da amnésia infantil podem ser recuperadas ao longo da vida adulta.

Um estudo publicado recentemente na Science Advances lançou novas luzes sobre esta questão. A equipa de investigação mostrou que, em ratos, as memórias esquecidas podem ser reativadas.

O estudo começou por examinar fatores de desenvolvimento que influenciam a amnésia infantil e observou que ratos com características de perturbação do espectro do autismo retinham memórias precoces.

Embora a pesquisa ainda não tenha sido estudada em humanos, Tomás Ryan, um dos autores, do estudo refere que “tem implicações significativas para melhorar a compreensão da memória e do esquecimento no desenvolvimento infantil, bem como a flexibilidade cognitiva geral no contexto do autismo”.

Miguel Esteves, ZAP //

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