Se é do norte, já deve ter visto alguma referência a este símbolos, que são parte da cultura poveira. Mais do que decorativas, eram uma forma de organizar a vida quotidiana — principalmente para os analfabetos.
A Póvoa de Varzim, no distrito do Porto, tem como principais pontos turísticos — para além da praia, claro — a Igreja Matriz, que data do século XVIII, e a Igreja da Lapa.
Nestes lugares, ao invés de proceder como nas igrejas comuns, em que olhamos para cima para apreciar os retábulos ou as cúpulas, será mais interessante se olhar para o chão.
Aí, bem como nas paredes e portas, encontrará as siglas poveiras, um sistema de proto-escrita cuja semelhança com as runas vikings suscitou a intrigante hipótese de uma origem escandinava. E os investigadores não estavam enganados, conta a LBV.
Na verdade, a Póvoa de Varzim foi já um antigo povoado romano, Villa Euracini, que onde antes se situava um castro, o Civitate do Terroso. No século XVIII, a cidade tinha já crescido tanto que se tornou no principal porto de pesca do país.
Mas foi muito antes, a partir do século IX, quando a região ainda fazia parte do primeiro Condado de Portugal, fundado por Vimara Peres, que começaram a instalar-se pescadores vikings da Bretanha na cidade.
A lancha poveira, tipo de embarcação tradicional da zona, é um dos legados dessa ocupação. Mas outra lembrança interessante desses tempos são as siglas poveiras, também conhecidas por “sinais da Póvoa”.
O LBV faz ainda uma lista de outros pontos nortenhos do país onde é possível encontrar estas marcas: os templos da Senhora da Abadia e de São Bento da Porta Aberta (em Terras de Bouro), de São Torcato (Guimarães), da Senhora da Guia (Vila do Conde), de Nossa Senhora da Bonança (Esposende) e a Capela de Santa Cruz (Balazar),e. até mesmo em a Guarda (na Galiza, Espanha, não a Guarda portuguesa).
Mas, afinal, o que são estas inscrições?
A maioria destas marcas é encontrada em locais religiosos, uma vez que os pescadores poveiros costumavam transportá-las consigo em veneração dos santos locais.
E a sua origem está na fácil compreensão: a maioria dos portugueses nessa época era analfabeta, e os vikings criaram símbolos fáceis de reconhecer por toda a população. Os símbolos eram, portanto, pintados nos barcos, mas também nas casernas, sepulturas e até nos livros de contabilidade, para facilitar a vida aos pecadores.
Eram milhares de símbolos, e podia representar, por exemplo, uma família. Não estão, no entanto, associados a uma fonética — eram meramente um desenho, reconhecido pela comunidade como significativo de x ou y.
No caso dos símbolos familiares, ou anagramas, os sinais eram transmitidos de geração em geração, e eram acrescentados, em vários casos, traços, chamados de piques, em frente ao símbolo, que representavam uma nova geração, como ilustra a imagem abaixo.
A maior parte dos sinais foram ideograficamente inspirados em objetos do quotidiano. A título de exemplo, o cruzeiro do cemitério da Póvoa de Varzim inspirou o padrão, tal como a Ala-Arriba (expressão cantada pelas pessoas quando puxam os barcos da água para a areia) inspirou o coice (uma linha oblíqua que representa um barco nessa situação).
Atualmente, restam apenas algumas centenas de sinais poveiros, sinalizados por António de Santos Graça, que estudou estes símbolos e a cultura poveira, no seu livro Epopeia dos Humildes, publicado em 1952.
Hoje, marcam esses tempos as inscrições que ainda são visíveis nas igrejas, mas também algumas homenagens em placas de toponímia na cidade, ou até mesmo na calçada poveira.