O exército norte-coreano é um dos maiores do mundo. Ao juntar-se à guerra da Rússia contra a Ucrânia, os seus soldados estão a pagar um preço elevado pelas manobras geopolíticas de Kim Jong-un. Mas porque estão a sofrer baixas tão pesadas? E porque se sujeitam a isso?
As tropas norte-coreanas estarão a atacar posições ucranianas na região russa de Kursk com inúteis ataques em massa e a pé, revelou esta sexta-feira o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, John Kirby.
Os soldados norte-coreanos estão “altamente doutrinados, promovendo ataques mesmo quando é evidente que esses ataques são inúteis”, diz Kirby.
Alguns destes soldados sujeitam-se a ataques suicidas, possivelmente por temerem represálias para as respetivas famílias caso sejam capturados como prisioneiros de guerra, redundando em “baixas pesadas” para as tropas norte-coreanas ao serviço de Moscovo, acrescenta.
Por que motivo estão então as tropas norte-coreanas a sofrer tão pesadas baixas na frente de batalha da guerra da Ucrânia?
Durante anos, explica o The New York Times, as forças armadas da Coreia do Norte ajudaram o seu líder, Kim Jong-un, a manter o controlo sobre o seu povo e a constituir uma barreira contra a Coreia do Sul, o seu inimigo declarado.
Com 1,3 milhões de soldados, o exército do Norte está entre as maiores forças armadas convencionais do mundo.
Agora, com mais de 11.000 soldados norte-coreanos a lutar ao lado das forças russas contra a Ucrânia, o exército norte-coreano está a desempenhar um papel mais proeminente na jogada geopolítica de Kim para obter o tão necessário dinheiro e influência diplomática.
As tropas que a Coreia do Norte enviou pertencem ao seu Corpo “Storm”, forças especiais que se encontram entre as mais bem treinadas e doutrinadas do exército. Mas estavam mal preparados para os ataques de drones e para o terreno desconhecido longe da sua pátria isolada.
Mais de 100 deles foram mortos e 1.000 outros ficaram feridos nas primeiras batalhas, adiantou a semana passada a agência de inteligência sul-coreana.
Segundo esta agência, Kim Jong-un vê o maior conflito da Europa desde a Segunda Guerra Mundial como uma oportunidade para fazer avançar as suas próprias ambições militares e diplomáticas e parece estar agora a preparar-se para enviar mais tropas para a Rússia.
Quais são os pontos fracos das tropas norte-coreanas?
As forças especiais do Norte foram treinadas principalmente para missões de atiradores furtivos, guerra urbana e infiltrações por mar, ar e através das muitas montanhas da Coreia.
Não foram treinadas o suficiente para a guerra de drones e trincheiras travada em terrenos como a linha da frente Rússia-Ucrânia, na sua maioria aberta e plana, explica Doo Jin-ho, analista sénior do Instituto Coreano de Análises de Defesa, em Seul, ao NYT.
Na altura da pandemia, em que a Coreia do Norte encerrou as suas atividades, as suas forças especiais entraram e saíram dos postos de guarda ao longo da fronteira do país com a China, perdendo parte do seu treino regular, disse Doo.
Além disso, o destacamento das tropas norte-coreanas para a Ucrânia foi tão apressado que pode levar algum tempo até que a Rússia as integre corretamente nas suas forças armadas, explicam funcionários dos serviços secretos sul-coreanos.
Os soldados norte-coreanos foram lançados para a batalha depois de terem aprendido apenas um punhado de termos militares, como “abrir fogo”, “artilharia” e “em posição” em russo, o que pode criar problemas de comunicação no campo de batalha, disseram.
“As forças armadas norte-coreanas não tiveram experiências de combate ao vivo durante décadas”, diz Ahn Chan-il antigo sargento do exército norte-coreano que vive na Coreia do Sul. “As tropas devem ter tido um curso intensivo sobre drones e guerra de infantaria, mas a questão é saber até que ponto estão familiarizadas com isso.”
Quem está no comando?
Outrora considerado por alguns observadores externos como jovem e inexperiente, o líder do país, Kim Jong-un, provou ser um forte comandante em chefe que governa com o que o governo sul-coreano chamou de “reinado de terror“.
O seu pai e antecessor na dinastia Kim que governa o país desde a sua fundação oficial, em 1948, Kim Jong-il, que conduziu o seu país com mão de ferro e uma política “militar em primeiro lugar”, confiou no Exército Popular da Coreia para manter o país unido na sequência de uma crise de fome na década de 1990.
Em contrapartida, Kim Jong-il permitiu que o Exército absorvesse recursos do Estado e realizasse operações lucrativas, como a exploração mineira, a pesca e o contrabando.
Quando Kim Jong-un assumiu o poder, após a morte do pai, em 2011, começou a subjugar as elites militares, banindo ou executando generais de topo; nos primeiros cinco anos no poder, conduziu 340 purgas na hierarquia militar e política da Coreia do Norte.
Em 2015, o general Hyon Yong-chol, então ministro da Defesa, foi executado com uma arma antiaérea depois de ter adormecido na presença de Kim, segundo os serviços secretos sul-coreanos.
Em 2017, Kim afastou o Vice-Marechal Hwang Pyong-so, o principal oficial político das forças armadas. Durante dois meses, Hwang foi obrigado a varrer o pátio da frente de um edifício do partido em Pyongyang, contou Lee Ilkyu, diplomata norte-coreano em Cuba que desertou para Seul no ano passado.
Os funcionários norte-coreanos vivem com medo constante, porque não sabem quando poderão ser vítimas da impulsividade de Kim Jong-un, acrescentou Lee.
Os analistas externos observam atentamente quem acompanha Kim nas suas visitas às unidades militares e aos locais de testes de armamento, para ver se há sinais de quem possa estar a seu favor ou não.
Em setembro, os analistas começaram a reparar em duas caras novas no círculo de altos funcionários que rodeiam Kim: o coronel-general Kim Yong-bok e o coronel-general Ri Chang-ho. A sua importância para o Kim Jong-un tornou-se clara quando mais tarde acompanharam as tropas à Rússia.
Kim Yong-bok foi identificado como comandante das forças especiais do Norte durante uma parada militar em 2017. Ri Chang-ho chefiou o Gabinete Geral de Reconhecimento das forças armadas, que está envolvido no comércio de armas, no cibercrime e noutras actividades ilícitas para engordar os cofres de Kim Jong-un.
Na segunda-feira, os Estados Unidos e os seus aliados colocaram os dois generais na lista negra pelo seu papel na guerra da Rússia. Juntam-se a outros membros importantes do governo norte-coreano já incluídos na lista negra ao abrigo das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Morrer por um estatuto mais elevado
Há outros fatores em jogo por trás do aparente voluntarismo com que as tropas norte-coreanas se sujeitam às pesadas baixas e aos “inúteis ataques em massa e a pé” referidos por Kirby.
Parte dos soldados enviados para a Rússia provêm de famílias pobres. A oportunidade de ir para o estrangeiro e a perspetiva de ganhar dinheiro podem ser fortes incentivos, diz o NYT. Talvez também poder descobrir a internet e aceder pela primeira vez a conteúdos porno, poderíamos acrescentar num tom mais leve.
Segundo a agência de informação sul-coreana, a Rússia paga até 2.000 dolares (cerca de 1.900 euros) por mês a cada soldado norte-coreano, mas é provável que o governo norte-coreano acabe por ficar com a maior parte do dinheiro.
Ainda assim, a parte do soldo que cabe aos combatentes pode ser, para um soldado comum, uma quantia enorme.
A Coreia do Norte tentou a aumentar o moral das tropas que lutam na linha da frente, prometendo-lhes uma rápida admissão como membros do Partido dos Trabalhadores, um símbolo de estatuto altamente cobiçado, diz Kim Seongmin, antigo capitão do exército norte-coreano que dirige uma estação de rádio no Sul.
“As tropas tinham poucas esperanças quanto ao seu futuro no Norte”, acrescenta Kim Kwang-Jin, outro desertor norte-coreano, que trabalha como analista sénior no Instituto de Estratégia de Segurança Nacional, dirigido pelo governo, em Seul.
“Vão para lá arriscando a vida, mas também vêem nisso uma oportunidade de ganhar dinheiro e, se forem mortos, de elevar o estatuto social da sua família ao dos mortos de guerra.”
E, mesmo que os norte-coreanos sofressem pesadas baixas, como está a acontecer, o controlo totalitário de Kim Jong-un tornaria impossível que o público se queixasse, dizem os desertores.
“A Coreia do Norte considera as baixas como um dado adquirido”, diz Sim Ju-il, antigo tenente-coronel do exército norte-coreano, que vive agora em Seul. “Irá considerá-las como um custo inevitável da aquisição de experiência na guerra moderna, caso venha a lutar contra os Estados Unidos na Coreia.”
Constou-me que podem andar distraidos com a recém descoberta da Internet e da pornografia!
É tudo mentira, não há tropas coreanas em combate na Ucrânia. É tudo para tentar diminuir a capacidade bélica da Rússia numa operação de propaganda esfarrapada.
É um bocadinho bizarro mas bastante esclarecedor que o teu campo de distorção da realidade nos queira convencer de que é mentira uma coisa que o Kremlin confirma e de que o Kim se gaba.
Há soldados coreanos na Rússia, provavelmente para se familiarizarem com o desenrolar de uma guerra moderna. Mas não há – nem seria necessário haver – um único soldado coreano a combater na Ucrânia. Mostrem-me o corpo de um único soldado coreano morto na guerra da Ucrânia, e eu darei a mão à palmatória.
O campo de distorção de realidade é forte, neste.