Polícia “recolheu” manifestantes em Luanda durante protesto de ativistas

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Ricardo Stuckert / ABr

O Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos

O Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos

A Polícia Nacional de Angola negou esta quinta-feira que tenha feito detenções durante a manifestação de ativistas em Luanda, na quarta-feira, garantindo que apenas “recolheu” jovens, entretanto libertados, por “tentarem alterar a ordem” na cidade.

A informação foi prestada à agência Lusa pela porta-voz do Comando Provincial de Luanda, a intendente Engrácia Costa, garantindo que a presença da polícia no Largo da Independência, à hora da manifestação dos ativistas, visava assegurar a segurança de outro evento que decorria no local.

A polícia angolana carregou na quarta-feira sobre algumas dezenas de manifestantes que exigiam em Luanda a libertação de 15 ativistas detidos desde junho – mas que não estaria autorizada pelo governo provincial -, tendo-se registado alguns feridos na sequência dessa intervenção.

Uma “manifestação pacífica” de ativistas angolanos sob o lema “Chega de prisões arbitrárias e perseguições políticas em Angola” estava convocada para exigir a libertação dos jovens ativistas detidos, suspeitos de prepararem um golpe de Estado.

O protesto concretizou-se pelas 16h (mesma hora em Lisboa), no Largo da Independência, com os jovens manifestantes gritando por “Liberdade” quando entravam naquela área, que registava forte aparato policial e onde já decorria uma ação das estruturas juvenis do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, o partido no poder), envolvendo cerca de duas centenas de jovens.

A intendente Engrácia Costa reiterou, em declarações à Lusa, que a polícia agiu inicialmente “sensibilizando” os manifestantes que, na aproximação ao largo em que se verificou a intervenção, “eram aconselhados a regressar para casa”.

Os jovens ativistas que se manifestavam “foram recolhidos porque insistiam, apesar da nossa sensibilização. Depois de identificados numa unidade nossa, foram mandados embora. Não, não foram detidos, foram recolhidos só para prevenir alguma alteração da ordem que eles tentavam fazer”, afirmou a oficial da polícia, sem querer adiantar quantos estiveram nessa situação.

“Mas nós não fomos para recolher manifestantes, nós fomos para fazer o asseguramento da atividade recreativa e cultural devidamente autorizada que decorria no Largo 1.º de Maio [da Independência] e na Praça da Família, em alusão ao dia da mulher africana [que se comemora a 31 de julho]”, disse ainda a porta-voz da polícia em Luanda.

Conforme a Lusa constatou no local, os jovens estiveram ao longo de alguns minutos concentrados em frente ao mesmo largo, rodeados de elementos policiais que, segundo foi visível, não intervieram.

Aparentemente, só a aproximação entre os manifestantes, do autodesignado Movimento Revolucionário, e a juventude partidária do MPLA – que organizava o evento autorizado – levou a polícia de intervenção colocada no local a carregar sobre os mesmos, recorrendo a equipas cinotécnicas, por entre momentos de forte tensão.

Os manifestantes, algumas dezenas, ainda conseguiram entoar cânticos de protesto à volta do largo e no interior do mesmo, durante alguns minutos, até à intervenção policial.

Outros jovens, afetos ao MPLA, desfilavam em caravana motorizada, em apoio ao Governo, à volta do mesmo largo, onde decorria ainda a venda de artesanato e música.

Jornal estatal acusa eurodeputada Ana Gomes de interferência em Angola

O editorial do Jornal de Angola acusa esta quinta-feira a eurodeputada portuguesa Ana Gomes de “interferir” em assuntos do “foro único do poder judicial angolano e dos órgãos de soberania nacionais”, acusando-a de “apadrinhar” o que apelida de “planos de subversão”.

A eurodeputada socialista está em Luanda a convite da Associação Justiça Paz e Democracia angolana, enquanto membro do Parlamento Europeu e da subcomissão de Direitos Humanos, acontecendo a visita numa altura de forte tensão política no país, agravada com a realização da manifestação de ativistas esta quarta-feira.

“Não bastassem os gestos profundamente inamistosos e as demonstrações de deslealdade que tem vindo a passar a nível internacional, ao apadrinhar os novos planos de subversão contra Angola, (…) a eurodeputada socialista Ana Gomes deslocou-se mesmo a Angola e, numa atitude arrogante e provocatória, tem estado a interferir em assuntos do foro único do poder judicial angolano e dos órgãos de soberania nacionais”, lê-se no editorial de hoje do jornal estatal angolano.

Intitulado de “Regras da democracia”, o texto aborda o funcionamento das instituições democráticas em Angola e o cumprimento das liberdades e garantias.

Ana Gomes tem sido alvo, nos últimos dias, de várias referências críticas públicas por parte de políticos ligados ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), no poder desde 1975, devido às posições adotadas, nomeadamente sobre a defesa dos direitos humanos e liberdade de expressão no país.

A eurodeputada, segundo relato feito pelos órgãos de comunicação estatais angolanos, foi recebida na quarta-feira pelo ministro da Administração do Território, Bornito de Sousa.

“Mas o mais grave é que a eurodeputada portuguesa não se importou de fazer tábua rasa dos fundamentos do processo judicial, que foram apresentados publicamente pelo Ministério Público de Angola, e de solidarizar-se com indivíduos acusados de rebelião, na melhor tradição daqueles que em Portugal sempre apoiaram Jonas Savimbi [UNITA], apesar de ser considerado um criminoso de guerra”, escreve ainda o Jornal de Angola.

Recorda o editorial que “Angola é um Estado de direito democrático” e que os angolanos e processo de paz “estão reconciliados” e “consolidados”.

“Os dirigentes angolanos souberam sempre qual o seu papel na luta pela defesa da liberdade e dos direitos humanos. Milhões de angolanos foram capazes de combater o colonialismo e o fascismo português e deram as suas vidas para a libertação dos povos das ex-colónias portuguesas e dos povos da África Austral”, lê-se.

Por último, o Jornal de Angola diz que “ver hoje políticos portugueses ofenderem esse passado comum e glorioso de combate a favor da Humanidade, preferindo alinhar com quem fomenta a violência e a rebelião em Angola” representa “uma infâmia para os angolanos”.

“Aqueles que se esquecem do passado estão condenados a cometer os mesmos erros. E nós, em Angola, não queremos isso”, remata o editorial.

/Lusa

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