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OPEP vai cortar a produção de petróleo. Eis o impacto para os consumidores e para o mundo

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USDoD / Wikimedia

O príncipe saudita Mohammed bin Salman

A OPEP anunciou um corte na produção de petróleo equivalente a 2% do abastecimento mundial — e a decisão abriu fendas entre a Arábia Saudita e os Estados Unidos, com Washington a acusar Riade de proteger a Rússia.

O anúncio partiu do vice-ministro do Petróleo do Irão, Amir Hossein Zamaninia, no final da conferência da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e dos seus 10 países produtores aliados, incluindo a Rússia, o México e o Cazaquistão.

A aliança dos países ricos em petróleo decidiu reduzir a sua produção em dois milhões de barris por dia, o maior corte desde o início da pandemia e que equivale a 2% do abastecimento mundial.

Abdulaziz bin Salman, o Ministro de Energia da Arábia Saudita, que é o país que na práctica lidera a OPEP, justifica a decisão com a subida das taxas de juro no Ocidente e com o fantasma da recessão iminente.

O corte no fornecimento de petróleo decidido em Viena na quarta-feira (numa reunião onde esteve presente o vice-primeiro-ministro russo Alexander Novak) deve estimular uma recuperação nos preços do petróleo, que caíram dos 120 dólares por barril registados há três meses para cerca de 90 dólares.

Na realidade, os cortes ficarão abaixo dos valores anunciados porque a OPEP já registou uma produção de cerca de 3,6 milhões de barris por dia abaixo das suas metas para Agosto.

A subprodução deveu-se às sanções ocidentais a países como a Rússia, a Venezuela e o Irão e também a problemas de produção na Nigéria e em Angola. O Ministro saudita afirma que os cortes reais devem rondar os 1,1 milhões de barris diários.

Casa Branca furiosa com a Arábia Saudita

Uma das pessoas mais descontentes com esta decisão será certamente Joe Biden. Depois de ter quebrado a promessa de esfriar as relações entre Washington e Riade, o Presidente dos Estados Unidos vê agora os seus esforços para conter a escalada dos preços da energia a irem por água abaixo.

Durante a campanha eleitoral, Biden foi duro nas críticas ao príncipe Mohammed bin Salman e às violações aos direitos humanos levadas a cabo pelo Governo que este lidera, especialmente após o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi no consulado saudita em Istambul — que muitas organizações de direitos humanos dizem ter sido ordenado directamente pelo príncipe.

Em Julho, o chefe de Estado voltou atrás na promessa de fazer da Arábia Saudita uma “pária” no plano internacional, tendo-se encontrado com bin Salman — uma decisão que lhe valeu uma onda de críticas e acusações de estar a legitimar e lavar a imagem do regime saudita.

O objectivo do encontro terá sido pressionar o príncipe a aumentar a produção de petróleo de forma a que os preços dos combustíveis possam baixar, numa altura em que os boicotes ocidentais ao petróleo e gás russos estão a fazer os custos da energia disparar e alimentam uma espiral de inflação que está a criar um efeito de bola de neve em todos os sectores da economia.

As eleições intercalares de Novembro, onde estão em jogo todos os 435 lugares da Câmara dos Representantes e 34 lugares no Senado, também estariam na mente de Biden, já que os Democratas correm o risco de perder o controlo do Congresso e a resposta ineficaz do Governo à inflação é constantemente uma das maiores queixas e preocupações dos eleitores nas sondagens.

Mas, no final de contas, os esforços de Biden foram em vão. A porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, disse ser “óbvio” que a OPEP se estava a “aliar à Rússia“.

“O Presidente está desiludido com a decisão míope da OPEP de cortar as quotas de produção enquanto a economia global está a lidar com o impacto negativo continuado da invasão de Putin à Ucrânia”, reagiram também o conselheiro de segurança nacional, Jake Sullivan, e o director do Conselho Económico Nacional, Brian Deese, num comunicado citado pela Reuters.

Riade dá a mão a Putin

Esta decisão pode marcar o início do fim da aliança energética que os Estados Unidos e a Arábia Saudita mantém há mais de 75 anos. A decisão da OPEP pode ser vista como uma retaliação contra a criação de tectos máximos nos preços da energia, que vários países, incluindo Portugal, estão a impor para conter a inflação.

A decisão do cartel também chegou meras horas depois da União Europeia aprovar, com conjunto com os EUA, a imposição de um limite aos preços na compra de petróleo russo — uma medida que a Arábia Saudita e outros países do Golfo temem que possa ser usada contra si no futuro.

Ao decidir cortar a produção, a OPEP está a sinalizar um apoio a Putin, já que a consequente subida dos preços do petróleo vai ajudar Moscovo a continuar a financiar a investida militar na Ucrânia e vai também aumentar a pressão sobre as economias europeias que cortaram as relações com a Rússia e que já estão à beira da recessão.

“Isto é extremamente político e um sinal muito claro do descontentamento da OPEP com a imposição de limites máximos aos preços. Independentemente da eficácia dos limites aos preços, os países veem isso como um precedente perigoso”, explica Amrita Sen, analista-chefe de petróleo da Energy Aspects, ao Financial Times.

Bill Farren-Price, analista da OPEP na consultora Enverus, acusa mesmo a Arábia Saudita de colocar a “OPEP numa rota de colisão com o mundo livre“. “Eles ficaram do lado da Rússia em nome da gestão protectora do mercado de petróleo – numa fase em que os consumidores em todo o mundo estão a lutar contra o aumento do custo de vida. Isto trará consequências políticas para Riade”, declara.

E essas consequências políticas podem estar mesmo para breve. Para além da condenação ao corte na produção, a administração Biden vai avançar com uma proposta ao Congresso para a introdução de uma lei que crie mecanismos adicionais que “reduzam o controlo da OPEP sobre os preços energéticos”.

Trocado por miúdos, isto significa que Washington está a ponderar reverter a isenção de que a OPEP beneficia que lhe permite coordenar os preços e passar por cima das leis anti-cartel do mercado livre.

O representante Democrata Tom Malinowski também já anunciou que vai introduzir uma lei onde pede à Casa Branca que retire as tropas americanas e os seus sistemas de defesa contra mísseis da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos.

Subida dos preços à vista

Biden ordenou que mais 10 milhões de barris da Reserva Estratégica de Petróleo dos EUA fossem colocados no mercado no próximo mês para tentar controlar a subida dos preços, após ordens semelhantes em Março, mas o impacto do corte já se está a fazer sentir nos preços.

Esta quarta-feira o preço de um barril de Brent subiu 2%, chegando aos 93,80 dólares, o valor mais alto desde 15 de Setembro.

O grupo de monitorização britânico RAC alerta que a subida dos preços vai chegar aos bolsos dos consumidores. “Um corte tão profundo na produção de petróleo inevitavelmente fará com que os preços do petróleo aumentem, forçando uma subida nos custos dos combustíveis. A questão é quando, e em que medida, os retalhistas optam por repassar esta subida nos custos aos consumidores nos postos de abastecimento”, explica Simon Williams, porta-voz do grupo.

A próxima reunião da OPEP+ está marcada para 4 de dezembro. A OPEP passará agora a reunir-se a cada seis meses em vez de reuniões mensais.

Adriana Peixoto, ZAP //

11 Comments

  1. Acto hostil? O Bidet pensa que a Opec cortar na produção é um acto hostil?

    Eu digo-vos o que é um acto hostil:

    Enviar 80 mil milhões de dólares para a Ucrânia enquanto própria economia dele e a europeia implodem é um acto hostil.
    Dar aos ucranianos satélites, armas e informações para matar russos é um acto hostil.
    Encurralar a Rússia, não retirando a ideia de adesão da Ucrânia à NATO é um acto hostil.
    Não estar à altura dos Acordos de Minsk e ajudar a Ucrânia a matar população russófona no Donbass é um acto hostil.
    Destruir infra-estrutura energética civil utilizando o poder do exército dos EUA é um acto hostil.

    Podia continuar, mas creio que já perceberam. O pedo-Bidet deverá removido em breve. Quanto àqueles que o controlam, isso é um osso mais duro de roer.

    Olhem, vão negociar com o Maduro para ele vos dar petróleo … E entretanto o que fazem do Guaido??

    Deixo já a resposta a quem vai dizer que sou um defensor de russos quando na verdade gostaria de ver um pouco de paz para variar: estou preocupado comigo e com a minha família no meio desta m***** toda. Se vocês são suficientemente asininos para não entenderem a diferença, bem, estão para lá do limiar das possibilidade de reparação humana. Boa sorte!

  2. A Ursa Von Der Leyen e outros anormais emproados pensavam que podiam impor preços máximos aos produtos que não têm e que outros produzem e depois dá nisto, um mundo cada vez mais dividido e a Europa sem alternativas. Não será tempo de serem um bocadinho mais racionais?

  3. “que caíram dos 120 dólares por barril registados à três meses para cerca de 90 dólares” … verbo haver … é “há três meses”

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