Ondas sonoras travam o crescimento da gordura. O efeito é físico, não psicológico

// DR / kazzakova / Depositphotos

O seu corpo está a ter conversas que não consegue ouvir. Em experiências de laboratório, a exposição das células a frequências sonoras comuns, numa frequência de 440 Hz, alterou significativamente a atividade genética e reduziu a formação de células adiposas em cerca de 15%. 

Num novo estudo, cientistas japoneses descobriram que algo tão simples como tocar uma nota musical perto de células numa placa de laboratório pode desencadear alterações biológicas notáveis.

As células responderam a pequenas vibrações mecânicas do som, ativando uma via celular que envolve a enzima FAK e o gene Ptgs2, que influenciou a quantidade de gordura armazenada pelas células.

Embora ainda em fase inicial e testada apenas em culturas de células, a descoberta  sugerem que o som poderá um dia ser utilizado para orientar o comportamento das células em domínios como a cicatrização de feridas ou a saúde metabólica, sem medicamentos ou cirurgia.

Os resultados do estudo, publicados esta quarta-feira na Communications Biology revelam que a exposição contínua ao som reduziu o desenvolvimento das células adiposas em 15%.

Os investigadores comparam o efeito ao facto de as células “sentirem” fisicamente as ondas sonoras, quase como se pudessem ouvir através de estímulos mecânicos.

A descoberta poderá eventualmente conduzir a novas abordagens terapêuticas para gerir o peso ou curar feridas, uma vez que começamos a compreender como os sons quotidianos que nos rodeiam — desde a música ao ruído do trânsito – podem estar a afetar silenciosamente a nossa biologia sem o sabermos.

Como as ondas sonoras comunicam com as células

Os cientistas passaram décadas a estudar a forma como as células reagem a estímulos físicos, como serem empurradas, puxadas e espremidas. Mas até agora, ninguém tinha analisado a forma como as células reagem às ondas sonoras, que criam vibrações minúsculas mas muito frequentes.

Segundo o Study Finds, a equipa de investigadores construiu uma configuração especial para reproduzir diferentes sons diretamente em placas que contêm células musculares de rato.

Utilizaram uma placa vibratória feita de plástico especial para gerar três tipos de sons: um tom de 440 Hz (a nota “A” de um piano), um tom agudo de 14 kHz (no limite superior da audição humana) e ruído branco (como estática).

A pressão sonora era de cerca de 100 pascal, semelhante à que as células mais profundas do nosso corpo podem sentir durante as atividades normais.

Após apenas duas horas de exposição ao som, as células envolvidas na experiência mostraram alterações em 42 genes. Quando o som continuou durante 24 horas, 145 genes mostraram atividade alterada.

Alguns genes responderam rapidamente e depois voltaram ao normal, enquanto outros permaneceram alterados durante horas.

Os investigadores descobriram que as ondas sonoras ativam estruturas chamadas adesões focais, que são como as “mãos” que as células usam para agarrar o que as rodeia. Quando estas aderências sentem as vibrações sonoras, ativam uma proteína chamada quinase de adesão focal (FAK), que desencadeia uma reação em cadeia no interior da célula.

Esta reação inclui a ativação de um gene chamado Ptgs2/Cox-2, que ajuda a produzir uma substância semelhante a uma hormona, chamada PGE2, que está envolvida na inflamação e noutros processos celulares.

O efeito do som nas células adiposas

Quando os investigadores expuseram as células adiposas em desenvolvimento a ondas sonoras durante os primeiros três dias de desenvolvimento, o número de células adiposas maduras foi muito menor.

As ondas sonoras pareciam inibir o processo normal de maturação das células adiposas. Este efeito ocorreu quer as células recebessem som contínuo durante três dias, quer apenas duas horas de som por dia durante três dias.

Segundo os investigadores, isto pode estar a acontecer porque as ondas sonoras criam um efeito semelhante ao de colocar as células numa superfície dura.

Estudos anteriores mostraram que as células adiposas não se desenvolvem tão bem em superfícies duras em comparação com as macias. As ondas sonoras podem induzir as células a sentirem que estão num ambiente mais firme.

A reação das células variou consoante a frequência, a intensidade e o padrão do som. Tanto os sons de baixa como de alta frequência afetaram as células, embora por vezes de forma diferente.

Mesmo a alteração do padrão da onda sonora de uma onda sinusoidal suave para ondas triangulares ou quadradas mais agitadas alterou a forma como as células reagiam.

A densidade celular também desempenhou um papel importante. As células que cresciam próximas umas das outras reagiam por vezes de forma oposta às células que cresciam mais afastadas quando expostas ao mesmo som.

Embora esta investigação ainda esteja na sua fase inicial, levanta questões fascinantes sobre a forma como os sons do dia a dia podem estar a afetar as nossas células sem nos apercebermos.

O zumbido do seu frigorífico, a música dos seus auscultadores ou o ruído dos camiões que passam podem estar a criar pequenas alterações físicas no seu corpo a nível celular.

O som é uma força que molda o comportamento das nossas células, afetando-nos a níveis demasiado pequenos para serem notados — mas demasiado importantes para serem ignorados.

ZAP //

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