Marques Mendes: OE tem metas “irrealistas” e foi moldado pelo “fantasma da bancarrota”

António Cotrim / Lusa

O conselheiro de Estado e antigo líder do PSD, Luís Marques Mendes

O comentador refere ainda que o Orçamento marca o “regresso da austeridade” devido ao “imposto escondido” da inflação. Sobre Marcelo, acredita que não tinha a intenção de desvalorizar os abusos na Igreja e elogia a sua humildade por ter pedido desculpas.

No seu espaço de comentário televisivo, Luís Marques Mendes deu o seu veredicto sobre a proposta de Orçamento de Estado, considerando que este tem “duas partes distintas”, uma para “consumo externo” e outra “para o país”.

A primeira parte foi feita “a pensar nos mercados financeiros”.”É a parte da forte redução do défice e da dívida. Aqui, António Costa e Medina parecem Passos Coelho. Será que resolveram imitar o ex-primeiro-ministro? Não. É o fantasma da bancarrota”, atira, acrescentando que Costa e Medina têm medo dos mercados e “fogem desse risco como o diabo da cruz”. “É um OE prudente. O que é um elogio”, afirma.

“Na outra parte do OE, essa virada para o país, o Governo tenta fazer a quadratura do círculo. Tenta agradar a toda a gente, sem grande sucesso”, opina, considerando que o OE é “desigual” no plano social por abandonar os funcionários públicos e os pensionistas, já que “o dinheiro não dá para tudo”.

“Aqui há um regresso da austeridade. No tempo da troika, houve cortes nominais de salários e pensões. Agora, há cortes nos salários e pensões através do imposto escondido que é a inflação. No final, o resultado é o mesmo: perda de rendimento. Porventura não havia alternativa. Portugal não é a Alemanha. Temos limitações orçamentais sérias. Mas não vale a pena negar as evidências e usar truques ou habilidades. É preciso falar verdade aos portugueses”, considera.

A nível das previsões económicas, estas são “irrealistas“. “Quanto às políticas temos a mesma falta de ambição, a mesma ausência de causas. Não há um objetivo mobilizador. Uma esperança para o futuro. Uma certa desilusão”, lamenta.

Marques Mendes acredita ainda que esta proposta seria chumbada se o Governo ainda dependesse da geringonça. “Este é um OE mais ao centro que à esquerda. O que significa que é mais fácil de contestar pela oposição de esquerda que pela oposição à direita. É sempre assim em tempos de crise”, afirma.

O comentador considera ainda “indiscutivelmente positivas” as reduções previstas no défice e na dívida. “Primeiro, porque o nosso grande calcanhar de Aquiles é a dívida. Segundo, porque em tempo de incerteza e instabilidade internacional, o problema é ainda maior. É preciso dar sinais de confiança aos mercados“, refere.

Já o aspeto mais “irrealista e negativo” do OE é a promessa de mais investimento público: “As intenções são boas, mas a prática recente não ajuda. O histórico deste Governo é mau. Desde 2016 até hoje, apesar das promessas, o Governo executou muito menos do que orçamentou”.

“Marcelo é um combatente dos direitos sociais”

Uma das polémicas da semana foi em torno dos comentários do Presidente da República sobre o mais recente balanço da comissão que está a investigar os abusos sexuais na Igreja Católica.

“Será que o Presidente da República tinha intenção de desvalorizar os casos de abusos sexuais na Igreja? Eu, sinceramente, acho que não. Marcelo é um combatente dos direitos sociais. Mas não foi essa a imagem que passou. Temos que ser honestos na análise: a perceção pública foi a de que quis ajudar a Igreja e desvalorizar o número de casos. E essa perceção pública é má“, começa Marques Mendes.

O comentador saúda o pedido de desculpas de Marcelo: “O Presidente da República fez bem em vir publicamente pedir desculpa. Tinha de o fazer. É um gesto de humildade. A humildade não é habitual num político, mas é importante. É uma atitude de dignidade, reconhecendo uma falha. Falhar é humano”.

O chefe de Estado também esteve nas notícias por ter pedido ao Parlamento que reavaliasse a lei das incompatibilidades, depois de todos os casos que têm sido conhecidos no Governo.

“Acho bem que o Presidente da República tenha pedido à Assembleia da República que volte a debater a lei das incompatibilidades. Não se perde nada. Mas também não me parece que tenha qualquer sucesso. Achava mais eficaz que, perante casos concretos de dúvida e suspeita, se voltasse a pedir um novo parecer de interpretação ao CC da PGR. Doutra forma, este clima de suspeita mantém-se”, afirma.

“Há nestas matérias um brutal clima de hipocrisia entre os partidos. Quando estão na oposição defendem a maior transparência do mundo. Tudo tem de ser transparente, é o que dizem. Quando chegam ao Governo, acham logo absurdas todas as leis de transparência que antes aprovaram. É o cúmulo da hipocrisia“, remata.

ZAP //

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