OE com novos aliados e divórcios insanáveis. PAN e Livre, os reis das alterações, abstêm-se

Mário Cruz / Lusa

As votações, em sede de Comissão de Orçamento e Finanças, terminaram esta quinta-feira. Segue-se a votação final global para o primeiro Orçamento do Estado de António Costa com maioria absoluta receber luz verde.

Em quatro dias, os deputados da Comissão de Orçamento e Finanças passaram mais de 25 horas a votar o Orçamento do Estado para 2022 na especialidade, que contou com quase 1500 propostas de alteração.

O PS não precisava de aceitar propostas vindas dos outros partidos para garantir a aprovação do documento, mas os socialistas quiseram dar prova de que estão abertos ao diálogo.

Entretanto, ao final desta manhã, o Orçamento do Estado para 2022 foi aprovado.

De acordo com a CNN Portugal, o PAN avançou com 244 propostas de alteração e, dessas, 40 receberam luz verde. Esta abertura fez com que o partido de Inês Sousa Real anunciasse que se irá abster na votação final global desta sexta-feira.

Já o Livre viu serem aprovadas, com a ajuda socialista, mais de uma dezena de propostas de alteração (13) das 84 que fez dar entrada no Parlamento. Da mesma forma que o PAN, vai manter a abstenção.

Em relação ao Bloco de Esquerda, que fez 137 propostas de alteração, o PS só cedeu em medidas sem impacto orçamental: na promoção de ações de informação sobre o ciclo e produtos menstruais e na criação de um programa de promoção do estatuto dos profissionais da cultura.

O PCP também chegou a ser parceiro privilegiado do PS na negociação dos orçamentos do passado, mas o divórcio parece agora insanável: só conseguiu uma única proposta aprovada.

A Iniciativa Liberal apresentou 127 propostas, mas serão quatro as que serão introduzidas no Orçamento. Já o Chega, que trabalhou em 309 propostas de alteração, não conseguiu ver nenhuma das medidas ser aprovada.

O PSD, que entregou 178 propostas de alteração, viu os socialistas alinhar em diversas circunstâncias num bloco central parlamentar – e muito à custa do PSD Madeira. Ora, segundo o Observador, o PSD Madeira conseguiu quatro medidas viabilizadas, mais uma do que o PSD.

Principais alterações aprovadas

Ao longo de uma maratona de votações de quatro dias na especialidade, o número de propostas de alteração aprovadas ficou aquém de 10% das cerca de 1500 submetidas.

Entre as várias medidas que o PS viu aprovadas incluem-se a criação de um regime especial do Imposto sobre Veículos (ISV) matriculados na Ucrânia, detidos por pessoas beneficiárias do regime de proteção temporária, o alargamento do IRS Jovem a doutorados até aos 30 anos e o alargamento do prazo de entrega do IRS por quem tem rendimentos de fonte estrangeira e crédito de imposto para 31 de dezembro, independentemente de se tratar de dia útil.

Os deputados aprovaram ainda que os seguros de crédito à exportação, apólices de seguros caução e garantias bancárias na ordem externa e garantias de Estado beneficiem de isenção de imposto de selo, assim como a isenção de fiscalização prévia do Tribunal de Contas na aquisição de unidades de participação em fundos de investimento imobiliário para promoção pública de habitação, como é o caso do FNRE.

Uma das propostas que atrasou mais os trabalhos e obrigou à intervenção do presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, foi o aumento da margem de endividamento das autarquias para 40% exclusivamente para assegurar o financiamento nacional de projetos cofinanciados na componente de investimento não elegível.

O PAN teve luz verde ao reforço do mecanismo financeiro de apoio à eficiência energética de edifícios, no valor anual de 40 milhões de euros para famílias em situação de pobreza energética, bem como subir para um milhão de euros a verba para concretizar a Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2020-2030.

Os deputados aprovaram também uma proposta para garantir a acessibilidade das pessoas invisuais aos transportes públicos e outra que reforça as respostas a deficientes maiores de idade e o reforço, ao longo deste ano, da rede de resposta para pessoas com deficiência maiores de idade.

Depois das alterações à proposta inicial, o deputado único do Livre, Rui Tavares, viu aprovado o “Programa 3C”, prevendo que inclua o apoio a projetos de melhoria do conforto térmico e da eficiência energética, podendo os subsídios, no caso dos edifícios para fins habitacionais, ir até ao máximo de 100% dos custos para as categorias de mais baixos rendimentos, excluindo IVA e, no caso dos edifícios de serviços, até um total de 200 mil euros.

Também uma alteração ao Código do IVA clarificando que todos os produtos de higiene menstrual têm taxa reduzida de 6% foi hoje aprovada, assim como um estudo do impacto da semana de quatro dias, após também alterações substanciais, assim como o alargamento do subsídio de desemprego a vítimas de violência doméstica e que inclui a criação de majorações no âmbito do programa «Emprego Interior +» para quem acompanhe, por razões profissionais, cônjuges ou unidos de facto que tenham celebrado contrato de trabalho em territórios de baixa densidade.

Os deputados do PSD eleitos pelo círculo da Madeira viram aprovada a aplicação do imposto especial sobre o consumo de álcool inferior à taxa normal quando está em causa rum e licores da região Autónoma da Madeira.

Foi também viabilizada a criação de uma comissão técnica para definir o modelo de imputação “adequado” das receitas fiscais às várias circunscrições territoriais, bem como uma alteração do regime jurídico do ensino português no estrangeiro e uma medida para que os rendimentos das entidades licenciadas para operar na Zona Franca da Madeira a partir de 1 de janeiro de 2015 e até 31 de dezembro de 2023 sejam tributados em IRC, até 31 de dezembro de 2027, à taxa de 5%.

A Iniciativa Liberal conseguiu aprovar que as decisões sobre as atribuições de bolsa de estudo para o ensino superior sejam conhecidas antes da data de divulgação dos resultados do concurso nacional de acesso ao ensino superior, assim como o reforço da formação dos magistrados para o combate aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual e a avaliação semestral da oferta formativa para o combate à violência doméstica e no namoro.

Foi também viabilizada a atualização do Portal “Mais Transparência” para garantir a inclusão, “de forma integral e em tempo real”, das informações relativas a cada projeto financiado ou cofinanciado por fundos europeus para identificar o grau de realização, os objetivos a atingir com grau de atingimento, as entidades promotoras dos projetos, bem como os seus detentores, beneficiários efetivos e parceiros e as entidades responsáveis pela seleção e atribuição dos apoios a cada projeto.

O PSD viu avançar a proposta que determina os limites máximos para a concessão de garantias, ficando o executivo autorizado “a conceder garantias pessoais, com caráter excecional, aos financiamentos a contrair por cada uma das regiões autónomas” até “ao limite de valor máximo equivalente a 12% da dívida total de cada uma das regiões autónomas, referente ao ano de 2020”.

Os deputados aprovaram também o impedimento da aplicação aos contratos de crédito já celebrados do agravamento da taxa do Imposto do Selo e a inclusão da menção da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária (UNCT) nas medidas de reforço do combate à corrupção, fraude e criminalidade económico-financeira.

A criação de um programa de promoção do Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura junto do tecido empresarial e das entidades não-comerciais do setor cultural e artístico foi a primeira medida que o Bloco de Esquerda conseguiu ver aprovada.

Apesar de não ter conseguido aprovar a totalidade da proposta sobre as medidas para combater a pobreza menstrual, o BE viu viabilizado o ponto para a distribuição gratuita de produtos de recolha menstrual em centros de saúde, escolas e instituições do ensino superior.

O direito de preferência aos municípios na venda de habitações penhoradas pelo fisco por dívidas fiscais foi a única proposta que o PCP viu aprovada, ainda que parcialmente, ficando consagrado que as autarquias têm direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento, graduando imediatamente acima do direito de preferência. A parte da iniciativa que previa que os imóveis adquiridos pelas autarquias no âmbito deste processo fossem canalizadas para programas de renda apoiada ou condicionada foi rejeitada.

Principais medidas rejeitadas

Entre as muitas propostas de alteração rejeitadas estão os aumentos salariais da função pública para fazer face ao aumento da inflação – reclamadas por vários partidos da oposição –, uma nova subida das pensões ou ainda as que contemplavam mexidas nos escalões do IRS, incluindo a da IL que defendia uma taxa única de 14,5% para quem recebe menos de metade do salário base de um deputado ou a do PCP sobre um novo escalão para pessoas com rendimentos anuais superiores a 250 mil euros.

Ainda na vertente fiscal, ficaram pelo caminho as propostas do PSD para isenção do IMT até aos 150 mil euros na aquisição da primeira habitação e do BE para a eliminação do regime fiscal do Residente Não Habitual (RNH), para taxar lucros extraordinários e os ganhos com as criptomoedas.

Várias medidas de descida do IVA na restauração, energia e bens alimentares essenciais foram igualmente rejeitadas pela maioria socialista e este foi também o desfecho da licença menstrual de três dias defendida pelo PAN.

Também o reforço do mínimo de existência em 400 euros e a gratuidade dos transportes públicos para os jovens até aos 18 anos e estudantes e para pessoas com mais de 65 anos defendidas pelo PCP ficaram pelo caminho, assim como a criação de um projeto-piloto sobre o Rendimento Básico Incondicional, uma das bandeiras do Livre.

ZAP // Lusa

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