De que forma a atividade cerebral desencadeia as enxaquecas é, há muito tempo, um assunto que intriga os cientistas. Agora, um novo estudo sugere que o conteúdo do fluido espinhal é um gatilho para a dor.
Um estudo realizado em ratos revelou novas pistas sobre os eventos neurológicos que desencadeiam as enxaquecas.
Segundo a Nature, o trabalho sugere que um breve “apagão” cerebral — quando a atividade neuronal é desligada — altera temporariamente o conteúdo do fluido cerebrospinal, o líquido que envolve o cérebro e a medula espinhal.
Este fluido alterado viaja por uma lacuna previamente desconhecida na anatomia até aos nervos do crânio, e é lá que ativa recetores de dor e inflamação, causando dores de cabeça fortes.
De acordo com os cientistas, um terço das pessoas que têm enxaqueca passam por uma fase antes da dor de cabeça conhecida como aura, que causa sintomas como náuseas, vómitos, sensibilidade à luz e dormência. Nesta fase, que pode durar entre cinco minutos e uma hora, o cérebro experimenta um apagão, chamado depressão alastrante cortical (CSD), quando a atividade neuronal é desligada por um curto período.
Estudos anteriores sobre enxaquecas sugeriram que as dores de cabeça ocorrem quando as moléculas do líquido cefalorraquidiano são drenadas do cérebro e ativam nervos nas meninges, as camadas que protegem o cérebro e a medula espinhal. Neste estudo, os cientistas exploraram se existe um fenómeno semelhante a ocorrer no fluido cerebrospinal que ativa o nervo trigémeo, que atravessa o rosto e o crânio.
Descobriram então que os ramos nervosos se juntam aos gânglios trigémeos na base do crânio, um centro para retransmitir informações sensoriais entre o rosto e a mandíbula para o cérebro, que contém recetores de dor e proteínas inflamatórias.
Feixe nervoso
Os cientistas criaram ratos que passaram por depressões alastrantes corticais e analisaram o movimento e o conteúdo do fluido cerebrospinal. Durante este evento, descobriram que as concentrações de algumas proteínas no fluido caíram para menos da metade, ao mesmo tempo que os níveis de outras proteínas mais que duplicaram, nomeadamente a proteína transmissora de dor CGRP, que é um alvo no desenvolvimento de medicamentos para o tratamento de enxaquecas.
A equipa também descobriu uma lacuna nas camadas protetoras à volta do gânglio trigeminal, que permite que o fluido cerebrospinal inunde as células nervosas.
Foi então que testaram se fluidos espinhais com diferentes concentrações de proteína ativavam os nervos trigeminais em ratos e descobriram que o fluido recolhido após uma depressão alastrante cortical aumentou a atividade das células nervosas trigeminais — indicando que as dores de cabeça podem ser desencadeadas por sinais de dor enviados por essas células ativadas.
No entanto, o fluido recolhido 2,5 horas após este evento não teve o mesmo efeito.
O artigo científico foi publicado, no início do mês, na Science.