Cuidado com o olfato: é enganador e pode confundir o nosso mundo visual.
Nós, humanos, somos bombardeados a todo o instante por estímulos do ambiente. Combinar informações de dois ou mais sentidos — como odores e a suavidade de texturas, tom ou cor — é um truque que o nosso cérebro põe em prática para dar sentido e organizar esta enorme quantidade de informação.
Esta integração sensorial também nos leva a associar temperaturas mais elevadas com cores mais quentes, tons mais baixos com posições menos elevadas e cores com o sabor de alimentos específicos – por exemplo, o sabor das laranjas com a cor “cor de laranja” que, obviamente, tem o mesmo nome.
Mas há dois sentidos, o nosso olfato e a visão — mais especificamente a perceção de cores — que mantêm uma relação muito complexa, segundo um novo estudo publicado esta sexta-feira na revista Frontiers in Psychology.
O fenómeno de ligação é, sugere a inovadora investigação, muito mais comum do que se pensava e está relacionado com aquilo que os cientistas conhecem como “sinestesia olfato-cor”, uma forma específica de sinestesia onde os odores estão involuntariamente associados a cores.
24 participantes adultos, com idades entre os 20 e os 57 anos, foram submetidos a um teste controlado para determinar a presença e a força das correlações olfato-cor, num ambiente cuidadosamente concebido para se manter isento de distrações sensoriais.
Um purificador de ar eliminou todos os odores existentes antes de libertar para o ar um de seis aromas escolhidos aleatoriamente — caramelo, cereja, café, limão e hortelã-pimenta — juntamente com água inodora, que controlou os diferentes cheiros. Os participantes foram então incumbidos de ajustar a cor num ecrã até que coincidisse com a cor que acreditavam estar a ver devido ao cheiro.
“Sobrerreação” influencia a perceção
Enquanto investigações anteriores tinham identificado associações de cores específicas para estes aromas — como o caramelo com castanho escuro e amarelo, ou o café com castanho escuro e vermelho —, o novo estudo descobriu que os participantes tinham uma tendência estatisticamente significativa para deslocar as cores para longe do cinzento neutro quando expostos a esses odores.
O cheiro de café, por exemplo, levou os participantes a perceberem a cor cinzenta como mais próxima de um castanho-avermelhado. Da mesma forma, quando expostos ao aroma de caramelo, os participantes confundiram uma cor rica em tons azuis com cinzento.
De acordo com o Interesting Engineering, a equipa acabou por concluir que quatro dos cinco aromas — limão, caramelo, cereja e café — causaram a perceção do cinzento. É, segundo o autor do estudo Ryan Ward, uma “sobrerreação” — as associações cruzadas são suficientemente fortes para influenciar a nossa perceção multissensorial.
O mistério ligado à sinestesia ainda fascina cientistas, artistas e o público em geral, oferecendo uma janela única para a complexidade da experiência humana. Embora seja necessária mais investigação para avaliar precisamente como o olfato influencia a perceção de cores, o estudo confirma que existe uma correlação definitiva entre os dois sentidos.