Os medicamentos para o cancro, por exemplo, pouco mais fazem do que dar às pessoas “um pouco de mais tempo” de vida. E se pudéssemos preservar pessoas com doenças terminais para serem salvas pela medicina do futuro?
No livro “The Future Loves You: How and why we should abolish death”, que vai ser publicado no dia 28 deste mês, o neurocientista Ariel Zeleznikow-Johnston propõe uma reflexão provocadora sobre o prolongamento da vida e a medicina moderna.
Nas primeiras páginas, Zeleznikow-Johnston critica os filósofos por dizerem que as pessoas devem aceitar a morte como uma inevitabilidade e diz que, por isso, não estão a ver o mundo como “verdadeiramente” é.
Zeleznikow-Johnston desafia as convenções e incentiva um debate sobre os limites da medicina e o conceito de morte.
Para mudar o paradigma, o especialista questiona se, em vez de aceitarmos a medicina moderna e o seus tratamentos paliativos temporários, não deveríamos focar em preservar as pessoas até que futuras tecnologias possam curá-las definitivamente.
No livro, Zeleznikow-Johnston explora um vasto campo de disciplinas, incluindo filosofia da mente, sociologia e economia, para sustentar a viabilidade da preservação do cérebro como um meio de cura eventual.
“Funcionalismo medicinal”
Num excerto publicado esta quarta-feira na New Scientist, o neurocientista sugere uma nova definição de morte, centrada na perda irrevogável da identidade pessoal, ao invés da cessação das funções vitais.
O especialista teoriza que, se o que nos constitui é o conectoma (conjunto de conexões neurais), preservar ou replicar as conexões neurais de cada um seria equivalente a preservar a pessoa.
Adotando o funcionalismo – perspetiva filosófica que valoriza o funcionamento em detrimento dos mecanismos subjacentes – Zeleznikow-Johnston acredita que, se algo funciona de maneira indistinguível de um ser humano, então ele é, em essência, um humano.
Esta abordagem é popular, por exemplo, entre os tecnólogos interessados em atribuir consciência às máquinas.
Zeleznikow-Johnston aborda os avanços necessários na neurociência para uma efetiva preservação do conectoma, incluindo técnicas como a vitrificação – método conhecido de criopreservação para transformar uma substância num estado semelhante ao vidro ao congelá-la rapidamente sem formação de cristais de gelo- para minimizar danos às células cerebrais durante o congelamento.
Naturalmente e por todos os dilemas éticos que este tema sempre gerou, o neurocientista não se livrou de críticas.
O autor é acusado de negligenciar as implicações sociológicas das suas teorias, especialmente a potencial intensificação das desigualdades sociais, que este método traria.