Profissões que envolvem muito isolamento podem mesmo originar mudanças, quer laborais, quer mentais. Misturamos ficção com realidade.
Há poucos dias cruzámo-nos com um artigo proveniente da Alemanha, que tinha um motorista demissionário como protagonista.
Ingo Lümcke teria deixado o emprego de motorista de autocarros na empresa KVB (Colónia), por estar farto da solidão. Ninguém falava com ele durante as viagens.
“Simplesmente não entendo”, comentou, depois de mais de 20 anos naquele cargo, naquela empresa.
“Porque é que nunca ninguém falou comigo enquanto conduzia? Faz-nos sentir como um leproso. Uma pequena conversa teria sido suficiente para mim”, acrescentou.
Mas o artigo foi publicado no Der Postillon, que é um site alemão repleto de sátira. De gozo.
Por isso, partimos do princípio que o relato não é real.
Mas…
…o ZAP cruzou-se recentemente com dois casos semelhantes. Um originou mesmo demissão (antecipada).
Um candidato a motorista de uma grande empresa nacional de transportes de passageiros passou todas as fases prévias, chegou mesmo a conduzir na habitual formação inicial.
Mas quando chegou precisamente a essa fase, da prática, percebeu que aquilo não era para ele. Porquê? Porque iria estar sempre sozinho; ele e o volante e os botões. Sem pessoas.
Nem sequer assinou contrato, saiu antes de começar.
Outro caso reporta a uma motorista que pediu à empresa para se manter como motorista mas para mudar de carreira, de número. Porque no percurso anterior não ia quase ninguém, e nenhum passageiro falava com ela.
Pediu e conseguiu. Agora num percurso mais movimentado, está mais feliz: “Agora sim. Conversar é muito bom!”.
Até mata
A solidão pode mesmo matar. Ou, no mínimo, contribuir para a morte.
A própria Organização Mundial da Saúde estima que a solidão é capaz de aumentar em 25% o risco de morte, em 50% o de demência e 30% o de doença cardiovascular.
A mesma entidade avisa que o isolamento social é agora uma epidemia e afecta 25% dos adultos e entre 5 e 15% dos jovens no mundo, cita a CNN.
Um estudo que juntou dados de mais de 1 milhão de pessoas reparou que houve um aumento de 33% de mortalidade por todas as causas em pessoas sozinhas.
Números reforçados por outro estudo, que aponta que quem não costuma estar com amigos ou familiares tem 77% mais probabilidade de morrer por qualquer causa. Os autores da análise sugerem que – no mínimo – uma visita mensal previne a solidão e o risco de morrer mais cedo.
“Acho que a solidão, hoje em dia, pode ser considerada uma doença mental. A solidão mata. A pessoa sente-se rejeitada, fica com baixa auto-estima, acha que toda a gente a esqueceu”, disse Francisco Paulino, presidente da SOS Voz Amiga, na SIC Notícias.