A associação ambientalista GEOTA afirmou esta quinta-feira que o processo de Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) a três soluções para reforço da capacidade aeroportuária em Lisboa é “um simulacro”, considerando que devem estar “em cima da mesa todas as alternativas viáveis”.
Em declarações à agência Lusa, o presidente do Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA), João Dias Coelho, afirmou que “o Governo está a tentar fazer um simulacro de uma AAE e não está a seguir aquilo que se pretende“.
“Uma AAE séria pressupõe que são avaliadas todas as soluções possíveis nas diversas variantes, sejam socioeconómicas, ambientais, condições de operação aeroportuária, navegação aérea e questões de saúde, como o ruído”, afirmou.
Em 2 de março, o Ministério das Infraestruturas, tutelado por Pedro Nuno Santos, anunciou que o Governo vai avançar com a realização de um processo de AAE a três soluções para o reforço da capacidade aeroportuária em Lisboa.
Em comunicado, o ministério explicou que vai “promover uma avaliação que compare” três soluções: a atual solução dual, em que o Aeroporto Humberto Delgado terá o estatuto de aeroporto principal e o futuro Aeroporto do Montijo o de complementar; uma solução dual alternativa, em que o Aeroporto do Montijo adquirirá, progressivamente, o estatuto de aeroporto principal e o Aeroporto Humberto Delgado o de complementar; e a construção de um novo aeroporto internacional de Lisboa no Campo de Tiro de Alcochete.
Para a GEOTA, o processo a três soluções revela que “não há planeamento estratégico”.
“O Governo tem de dizer o que é que vai estar em cima da mesa em termos de estudo e as alternativas, e aí têm de ser todas as que são viáveis. Não faz sentido limitar isto a duas soluções”, disse, considerando que a solução em que o Aeroporto do Montijo, no distrito de Setúbal, adquire o estatuto de aeroporto principal “não é viável”.
“Acho que esta solução é para esquecer”, referiu, elencando a questão da segurança e da proximidade ao estuário do Tejo.
O presidente da associação ambientalista disse existirem “outras soluções”, como o Aeroporto da Ota (em Alenquer), Alverca (em Vila Fraca de Xira) ou até Beja, e defendeu a “necessidade de a AAE começar com um procedimento público de definição do âmbito”.
“Há alternativas que podem ainda ser estudadas”, disse José Dias Coelho, acrescentando que nesta altura de pandemia é fundamental para o país “pensar que tipo de turismo quer cativar” e refletir sobre o futuro do tráfego aéreo.
“O futuro do tráfego aéreo é uma dúvida a todos os níveis, não só pela pandemia, mas face às metas que temos no Acordo de Paris e no Pacto Ecológico Europeu, que visa a redução das emissões de dióxido de carbono e o corte de voos a menos de 600 quilómetros. Isto tem de ser tido em conta”, referiu.
Para o representante, qualquer solução que venha a ser estudada tem de ter em conta dois aspetos: “o valor patrimonial da paisagem (como é o caso do estuário do Tejo) e a ligação ferroviária”.
“No século XXI, não há nenhum país desenvolvido que construa um aeroporto sem uma ligação ferroviária. É uma necessidade absoluta de qualquer aeroporto moderno estar servido por ferrovia”, salientou.
José Dias Coelho disse ainda que a proposta que o Governo enviou ao parlamento no sentido de eliminar da legislação em vigor a formulação que faz depender do parecer de autarquias locais a construção de um aeroporto nacional é “inaceitável” e “altamente discutível”, defendendo que a mesma deve ser “chumbada pela Assembleia da República”.
“Isto torna a lei abstrata e geral para qualquer circunstância e qualquer aeroporto que se queira construir no futuro. É absolutamente inaceitável porque nos termos em que é feita elimina toda a transparência do processo, bem como parte das competências da Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC)”, referiu.
A proposta, aprovada em Conselho de Ministros eletrónico na passada sexta-feira (dia 09 de março), além de retirar o poder de veto às autarquias em relação a aeroportos nacionais, prevê ainda que, daqui em diante, o parecer das autarquias seja emitido “no prazo máximo de 20 dias”.
Nesta matéria, o responsável alertou ainda que “todos os prognósticos relativamente à recuperação do tráfego aéreo não apontam para recuperações imediatas”.
“Ainda consigo perceber a urgência desta proposta quando o Aeroporto da Portela [Humberto Delgado] estava quase com 32 milhões de pessoas a circular. Neste momento, estamos numa situação diferente, em que a recuperação do tráfego aéreo vai demorar à partida dois a quatro anos. Não há uma urgência como havia”, afirmou.
// Lusa