Os cientistas estão a usar os seus conhecimentos sobre as propriedades eletrónicas dos materiais para resolver um mistério no interior da Terra — e descobriram a forma como um único mineral pode ajudar a conduzir o calor do núcleo para a superfície.
Uma equipa de cientistas da Florida State University descobriu que o monóxido de ferro (FeO) desempenha um papel fundamental na condução do calor do núcleo da Terra para a superfície, influenciando os movimentos tectónicos e a atividade vulcânica.
As propriedades únicas deste mineral, identificadas em condições extremas, são fundamentais para compreender a dinâmica do calor interno da Terra e os seus efeitos à superfície.
A equipa de investigadores, liderada pelo físico David Ho e pelo professor de física Vlad Dobrosavljevic, descobriu a forma como um único mineral pode ajudar a conduzir o calor do núcleo da Terra para a superfície.
“Em condições extremas, acontecem coisas que não se esperam, e este é um exemplo de condições extremas”, explica Dobrosavljevic, citado pelo Sci Tech Daily.
À medida que se desce da superfície da Terra através do manto semi-sólido em direção ao núcleo externo líquido, as condições tornam-se intensas. As temperaturas sobem para cerca de metade da temperatura do Sol à superfície e as pressões aumentam para níveis 1200 vezes superiores às profundezas dos oceanos.
Foi nestas condições que a equipa descobriu propriedades invulgares no FeO, um mineral que se pensa ser abundante em alguns pontos ao longo da fronteira entre o manto e o núcleo.
“Estas propriedades destacam-se quando comparadas com todos os outros minerais que sabemos que existem nas profundezas da Terra”, diz Ho.
Utilizando dados geológicos e modelos teóricos, os investigadores descobriram que, perto da fronteira entre o manto terrestre e o núcleo exterior, o monóxido de ferro entra no chamado estado crítico quântico, onde tem ao mesmo tempo propriedades de isolador e condutor.
“Uma zona de transição entre o manto e o núcleo é onde isto está a acontecer”, disse Ho. “Isto pode proporcionar uma via para o calor escapar do núcleo e subir através do manto em direção à superfície”, explicou.
Os investigadores acreditam que o monóxido de ferro pode servir como uma espécie de guardião entre o núcleo e o manto da Terra — uma descoberta crítica porque quando esse portão se abre e o calor escapa, pode ter impacto na vida à superfície.
“Se conseguir chegar à superfície, pode provocar movimentos tectónicos, vulcões, terramotos e também pode afetar o campo magnético da Terra“, afirma Dobrosavljevic.
“Há plumas de calor que vêm da fronteira entre o núcleo e o manto em direção à superfície, mesmo por baixo do Havai. E acreditamos que isto é causado por estas regiões de monóxido de ferro do tamanho de uma montanha que conduzem o suficiente para permitir que o calor escape e provoque um vulcão”, explicou.
Os investigadores acreditam que estas descobertas são cruciais para compreender as propriedades do manto profundo da Terra e o seu impacto no planeta.
“Ainda não sabemos muito sobre o que se passa no interior da Terra, mesmo a estas profundidades, pressões e temperaturas entre o núcleo e o manto”, explica Dobrosavljevic.
“Em algumas condições extremas, teremos grandes surpresas em que, mesmo a temperaturas muito elevadas, podem ocorrer efeitos quânticos”, diz o professor de física. “A pressão é um fator chave, pensamos nós, para tornar isso possível a temperaturas mais elevadas”.
Estas descobertas foram recentemente apresentadas num artigo na Nature Communications e destacadas na secção News and Views da revista Nature Physics.
Agora, a equipa está a debruçar-se sobre novas questões levantadas pelo estudo, para compreender melhor as propriedades exóticas do monóxido de ferro e o que elas podem significar para todos nós — aqui em cima, à superfície da Terra.