Élodie Lévêque

Uma nova pesquisa descobriu que os monges medievais em França, Bélgica e Inglaterra encadernavam os livros com peles de foca vindas de destinos tão longínquos como a Islândia ou a Gronelândia.
Numa intrigante revelação das páginas do passado europeu, os cientistas descobriram que alguns manuscritos medievais não eram encadernados em pele de vaca ou de veado, mas sim em pele de foca proveniente das águas geladas do noroeste do Atlântico e comercializada pelos descendentes nórdicos dos Vikings.
Um estudo publicado a 9 de abril na Royal Society Open Science analisou 32 livros medievais utilizando a biocodicologia, um método que revela dados biológicos incorporados em manuscritos antigos.
A investigação, liderada pela especialista em conservação de livros Élodie Lévêque da Universidade Paris 1 Panthéon-Sorbonne, combinou a espetrometria de massa com a análise de ADN antigo para descobrir as origens surpreendentes das encadernações destes livros.
A investigação começou na Abadia de Clairvaux, em França, onde foram analisados 19 livros datados de 1140 a 1275. As descobertas revelaram que as suas capas protetoras exteriores, conhecidas como “chemises”, eram feitas de pele de foca, especificamente de espécies de pinípedes como a foca do porto, a foca harpa e a foca barbuda. Outros 13 “livros peludos” com encadernações semelhantes foram identificados em França, Inglaterra e Bélgica, datados entre 1150 e 1250.
Os testes de ADN revelaram ainda que as focas provinham de uma gama geográfica diversificada, incluindo a Gronelândia, Islândia, Escócia e Escandinávia. Isto sugere que existia uma rede de comércio bem estabelecida que ligava as comunidades nórdicas à Europa continental, refere o Live Science.
Estas redes eram conhecidas pelo comércio de bens valiosos, como o marfim e as peles de morsa, e a pele de foca parece ter feito parte da carga. Os relatos históricos sugerem mesmo que as peles de foca eram utilizadas para pagar o dízimo à Igreja Católica no século XIII.
Todos os livros encadernados com pele de foca provinham de abadias situadas ao longo das rotas comerciais do século XIII, alinhadas com as rotas comerciais nórdicas conhecidas.
O estudo desafia as suposições anteriores sobre os materiais animais utilizados na encadernação medieval. Embora a razão para a escolha da pele de foca continue a ser desconhecida, as descobertas sublinham a influência de longo alcance do comércio nórdico na Idade Média.