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O México tem um novo aliado na busca pelas vítimas dos cartéis: os porcos

Os cientistas e as autoridades mexicanas estão a usar porcos mortos para tentar avaliar o efeito da decomposição dos corpos humanos em valas comuns e descobrir os locais onde os cartéis enterram as vítimas.

Há mais de 130 mil pessoas desaparecidas no México e os cientistas e autoridades estão a recorrer a métodos inovadores, incluindo a utilização de porcos mortos, para tentar localizar os corpos enterrados em valas comuns por cartéis de droga. Este projeto científico, centrado no estado de Jalisco, o mais afetado do país, visa responder a uma das maiores crises humanitárias da América Latina.

Os porcos, escolhidos pela sua semelhança biológica com os humanos, são usados como substitutos em experiências de decomposição. Vestidos, queimados, embrulhados em sacos ou tapetes, enterrados individualmente ou em grupo, estes cadáveres animais permitem simular os diversos métodos usados para ocultar corpos. Os cientistas monitorizam as alterações no solo e na vegetação, e utilizam drones com câmaras hiperespectrais, sensores térmicos e scanners a laser para detetar sinais químicos como fósforo ou alterações na flora local.

“O que aprendemos tem de ser aplicado de imediato, porque há urgência”, afirma José Luis Silván, coordenador do projeto e investigador do CentroGeo, um instituto federal especializado em informação geoespacial. Em colaboração com universidades mexicanas e britânicas, e com a Comissão de Busca de Jalisco, o projeto arrancou em 2023 com o objetivo de mapear possíveis locais de enterramento clandestino.

Entre 2007 e 2024, já foram encontradas cerca de 6000 valas comuns, mas dezenas de milhares de restos mortais continuam por identificar. A maioria das descobertas ainda é feita por familiares das vítimas, que, sem apoio estatal, percorrem zonas dominadas por cartéis com varas de ferro e o olfato como guia.

A investigação não se limita à tecnologia. A experiência e observações das famílias têm sido fundamentais. Muitas conseguem identificar zonas suspeitas pela vegetação ou solo alterado. “O conhecimento flui nos dois sentidos”, sublinha Silván à Associated Press.

Apesar do investimento tecnológico, os especialistas reconhecem que os avanços científicos ainda não substituem o testemunho humano. “90% das buscas resolvem-se com uma boa testemunha e uma pá”, alerta Derek Congram, antropólogo forense canadiano envolvido no projeto.

O sucesso a longo prazo dependerá da vontade política e da capacidade financeira para aplicar estes métodos em todo o país. Ainda assim, para os cientistas e familiares, cada tentativa conta. “Falhar, tentar de novo, continuar a tentar. É isso que nos resta”, conclui Congram.

ZAP //

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