O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, rejeitou, por duas vezes, indicações do Governo para a chefia da Marinha.
O Presidente da República rejeitou, em dezembro, o nome indicado pelo Governo para ocupar o lugar de vice-chefe de Estado Maior da Armada.
Dias depois da nomeação de Gouveia e Melo para chefe daquela força, foi-lhe proposto o nome do contra-almirante João Dores Aresta para número dois da Marinha, mas Marcelo Rebelo de Sousa vetou-o de forma definitiva, segundo noticiou o Público.
Foi o segundo episódio em três meses em que o chefe de Estado, a quem compete a nomeação das chefias militares por proposta do Governo, recusou a indicação dada pelo executivo para a chefia da Armada.
A primeira tinha sido em setembro, antes da dissolução do Parlamento, quando foi noticiado que o ministro da Defesa iria propor a substituição do então chefe do Estado Maior da Armada (CEMA), almirante Mendes Calado, pelo vice-almirante Gouveia e Melo, o qual acabara de deixar o cargo de coordenador da task force de vacinação.
Na altura, Marcelo Rebelo de Sousa fez saber que a forma que o Governo adotou para anunciar uma transição na Armada resulta “na perceção de um atropelamento” de Gouveia e Melo ao ainda chefe do EMA, almirante Mendes Calado, que estava a mais de um ano do fim do mandato.
“Quando for o momento, só uma pessoa tem o poder de decisão e essa pessoa é o Presidente”, sublinhou então.
Três meses depois, a nomeação de Gouveia e Melo viria a consumar-se nas vésperas de Natal, e no mesmo dia em que foi conhecida, Mendes Calado publicou um vídeo na página da Marinha no Facebook.
“Deixo a Marinha não por vontade própria, pois os que me conhecem não entenderiam que abandonasse o leme da nossa Marinha depois de tanto resistir ao temporal que nos assolou nos últimos tempos”, dizia.
Dias depois, chegou a ser noticiado pelo Diário de Notícias da Madeira que Dores Aresta, então comandante operacional daquela região autónoma, seria o número dois de Gouveia e Melo, tendo o seu nome já sido ratificado pelo Conselho de Chefes dos Ramos das Forças Armadas. No entanto, essa nomeação nunca aconteceu.
Foi travada pelo Presidente da República, também Comandante Supremo das Forças Armadas, que acabaria por nomear Coelho Cândido para o cargo, empossado em cerimónia discreta em 18 de janeiro, a 12 dias das eleições legislativas.
Na quarta-feira passada, Marcelo Rebelo de Sousa condecorou em Belém os antigos chefes do Estado-Maior da Armada, almirante Mendes Calado, e da Força Aérea, general Nunes Borrego, ambos substituídos pelo Governo antes do final do seu mandato.
Nessa cerimónia – à qual não compareceram nem o ministro da Defesa, nem o Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas, Silva Ribeiro, nem o CEMA, Gouveia e Melo – o chefe de Estado cumprimentou Coelho Cândido de forma efusiva, afirmando publicamente a paternidade da sua nomeação.
Os dois militares deixaram recentemente de desempenhar os seus cargos como chefes dos respetivos ramos: o almirante António Mendes Calado deixou em dezembro passado a liderança da Armada a meio do segundo mandato e o general Nunes Borrego terminou o seu primeiro mandato à frente da Força Aérea no dia 26 de fevereiro, não tendo sido reconduzido.
O processo de substituição terá sido motivado pela oposição manifestada pelos chefes dos ramos militares à nova Lei Orgânica de Bases das Forças Armadas (Lobofa), que coloca os chefes militares dos ramos [Exército, Marinha e Força Aérea] na dependência hierárquica do CEMGFA, em matéria de coordenação militar.
Uma iniciativa do Governo que suscitou acesa polémica entre os antigos chefes dos ramos quando foi apresentada, em fevereiro do ano passado.
Vinte e sete antigos chefes dos três ramos manifestaram-se em carta contra a iniciativa, o que foi respondido pelo Governo como “defesa de interesses corporativos”.
Gouveia e Melo é visto nalguns meios militares como tendo um perfil que se enquadra no espírito da nova Lobofa e o facto de ser muito próximo de Silva Ribeiro, que termina o mandato em fevereiro de 2023, sugere que pode estar a posicionar-se para lhe suceder como CEMGFA.
Caso não o seja, poderá ainda aspirar a candidatar-se à Presidência da República em janeiro de 2026, como chegou a admitir ao Diário de Notícias e ao Expresso.