Luto prolongado: combater ou “deixar andar”?

Cada vez mais pessoas prolongam o seu luto durante anos. É possível, e é desejável, estabelecer um limite temporal numa emoção natural?

Luto. Momento normal, fase habitual, quando alguém próximo morre.

Mas há um distúrbio generalizado, pelo menos, nos Estados Unidos da América: o luto prolongado.

Esse transtorno foi reconhecido há três meses pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais.

As pessoas incluídas nesta classificação, neste transtorno, são aquelas que continuam em luto intenso um ano depois do falecimento do amigo ou familiar.

É como se a perda tivesse acontecido ontem. Essas pessoas ainda estão em choque e em descrença… Estão presas neste estado de luto incapacitante”, explicou a professora Holly Prigerson, no jornal The Guardian.

Não será desejável prolongar o luto, para a pessoa em causa. Mas será desejável (e possível) estabelecer um limite temporal numa emoção natural nos seres humanos?

É um assunto complexo e que origina “muita controvérsia há muitos anos”, admite Lucy Selman, professora associada de cuidados paliativos na Universidade de Bristol.

Alguns especialistas consideram que este diagnóstico pode ser útil, outros alegam que esse “carimbo” pode prejudicar a pessoa em luto durante muitos anos.

Lucy acrescenta que a ideia que reina é que o luto é passageiro, inútil, e que qualquer ser humano recupera dessa fase. Mas pode ser uma experiência “realmente transformadora, que pode mudar a pessoa. Não é verdade que a pessoa fica igual ao que estava antes do luto”, avisou.

“O luto é interessante porque tem uma dimensão psicológica, mas é algo que vai acontecer com todos nós e é mais uma questão social”, acrescenta, alertando que 10% das pessoas com luto mais prolongado e complexo podem, realmente ficar “presas”. E sentem-se incapazes de seguir a sua vida.

Nesses casos, identificar o transtorno de luto prolongado pode ser útil. As pessoas estariam mais familiarizadas com o que é o luto.

O luto era mais frequente, até há algumas décadas ou séculos. As pessoas morriam cedo – incluindo muitas crianças. Mas entretanto a medicina avançou, a esperança média de vida é mais longa agora, as condições de vida são bem diferentes. Mas a fragilidade emocional/psicológica é maior, hoje em dia.

A investigadora Lucy Hone apresenta essa perspectiva: o ser humano passou a não estar habituado a “lidar e a viver com emoções negativas e, por isso, rapidamente passamos a patologizá-las. Mas todas essas emoções negativas no luto são uma parte absolutamente normal e natural”.

Não podemos colocar uma linha do tempo nisso. O que queremos é que algo funcione. É uma dor natural. Não esperemos que todas as emoções negativas e a descrença desapareçam rapidamente”, avisou.

Davina Rivers ficou viúva há sete anos. E ainda sofre imenso. Transtorno de luto prolongado? Não concorda: “Sinto-me bastante perturbada por me ter sido diagnosticado um problema médico que precisa de ser corrigido. Porque acho que não é”.

ZAP //

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