Os países do Ocidente estarão a falhar na postura sobre a situação no Kosovo. Ao escolher um lado, o lado sérvio é o eleito.
A Guerra dos Balcãs pode ter acabado oficialmente mas as guerras nos Balcãs continuam.
Entre os territórios da antiga Jugoslávia, lá pelo meio está o Kosovo.
Tem fronteira com Macedónia do Norte, Albânia, Montenegro e… Sérvia. É com a Sérvia que existe o maior problema.
Há 15 anos o Governo provisório da região declarou que o Kosovo é um país independente. Uma declaração unilateral.
Não houve, e continua a não haver, consenso no reconhecimento dessa independência. Países como Portugal ou EUA reconheceram essa declaração, mas Espanha ou Rússia não.
O Governo da Sérvia continua a defender que o Kosovo faz parte da Sérvia – apesar de a grande maioria da sua população ser de origem albanesa; os sérvios representam apenas 5% da população do Kosovo.
O que mudou em Maio
A tensão é constante, a fronteira é controlada pela NATO. E as forças no local passaram a estar em alerta máximo nos últimos meses porque, em Maio, houve confrontos sérios entre sérvios e soldados da missão da NATO: os sérvios exigiam a saída imediata de três presidentes de Câmara de origem albanesa eleitos no mês anterior, no Norte do Kosovo – região onde há mais sérvios do que albaneses.
O Governo da Sérvia acusou o Governo kosovar de “limpeza étnica silenciosa”; o Governo do Kosovo disse que a Sérvia estava a alimentar a agitação.
Esses confrontos criaram um fosso “raro e surpreendente” nas relações entre o Kosovo e os seus apoiantes no Ocidente de longa data, avisa agora Muhammad Hussein, analista político.
Num texto publicado no portal Monitor do Oriente, Muhammad cita as sanções aplicadas pela União Europeia (UE) a funcionários do Governo de Kosovo, a diminuição de visitas de alto nível, de contactos e de cooperação financeira com o Governo do Kosovo – porque, alega a UE, o Governo local não acalmou a situação como deveria.
Do outro lado do oceano Atlântico, os Estados Unidos da América (EUA) retiraram o Kosovo dos seus exercícios militares conjuntos, adiaram reuniões diplomáticas e deixaram de defender a adesão do território dos Balcãs à UE e à Organização das Nações Unidas.
Refira-se que a UE tem um plano, apoiado pelos EUA, para normalizar as relações entre Kosovo e Sérvia. Mas os EUA consideram que estas decisões “autónomas” do Kosovo prejudicam esse processo (os EUA e a UE pressionaram o Governo local para realizar novas eleições no Norte, cenário rejeitado pelo primeiro-ministro Albin Kurti).
Este cenário deixa a ideia de que o Ocidente está a desvalorizar a soberania das autoridades do Kosovo e a favorecer e apaziguar a Sérvia. Para quê? Para afastar a Sérvia da Rússia.
Mas a UE assegurou, no mesmo portal, que é um “intermediário honesto e imparcial” nesta situação. Embora o acordo deva ser alcançado por Sérvia e Kosovo.
Proteger da Rússia
Políticos experientes do Reino Unido dos EUA avisam que o Ocidente não está a proteger o Kosovo das agressões da Sérvia e da… Rússia.
Numa carta partilhada com o The Telegraph, os 54 políticos sénior indicam que a postura dos países ocidentais na construção do Kosovo falhou e vai deixar o Kosovo vulnerável.
Falta imparcialidade nos países do Ocidente nesta questão do Kosovo, segundo o documento.
Os diplomatas incluem a Rússia nestes avisos, lembrando a guerra com a Ucrânia e reforçando que a Sérvia é um aliado tradicional da Rússia – condenou a invasão mas não se juntou ao pacote de sanções ocidentais.
Recorde-se que, poucos dias depois do início da guerra na Ucrânia, milhares de sérvios nacionalistas pró-Rússia marcharam no centro da capital Belgrado para apoiar a guerra. Além disso, agora há menos sérvios a apoiar a adesão do país à UE.
Esta carta foi enviada a Josep Borrell, Alto Representante da UE para os assuntos externos, James Cleverly, ministro dos negócios estrangeiros do Reino Unido, e Antony Blinken, secretário de Estado dos EUA.